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Embargos à execução fiscal devem continuar a ter efeito suspensivo

Nova discussão surgiu entre os intérpretes e aplicadores do direito tributário após a entrada em vigor das alterações promovidas pela Lei n.º 11.382, de 06 de dezembro de 2006. Como é sabido, dentre as inúmeras modificações efetivadas pela nova ...

24/03/2014 13:43:53

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Embargos à execução fiscal devem continuar a ter efeito suspensivo

Nova discussão surgiu entre os intérpretes e aplicadores do direito tributário após a entrada em vigor das alterações promovidas pela Lei n.º 11.382, de 06 de dezembro de 2006.

Como é sabido, dentre as inúmeras modificações efetivadas pela nova legislação ocorreu significativa alteração no Título III (“Dos embargos do Devedor”), do Livro II (“Do Processo de Execução), do Código de Processo Civil, destacando-se nesse ponto: i) a possibilidade de o executado opor embargos independentemente de penhora, depósito ou caução; ii) o prazo para apresentação de referida medida incidental de conhecimento alargou-se de 10 (dez) para 15 (quinze) dias, contados da data da juntada aos autos do mandado de citação; iii) como regra, os embargos não terão efeito suspensivo; ressalvam-se os casos em que o embargante demonstre risco de dano grave de difícil ou incerta reparação, em que o juiz poderá atribuir efeito suspensivo aos embargos após suficiente penhora, depósito ou garantia.

Pois bem. A partir dessas modificações no Código de Processo Civil, surgiram vozes a defender que os embargos à execução fiscal deixaram de atribuir efeito suspensivo ao processo executivo em matéria tributária, dado que o artigo 1.º da Lei n.º 6.830, de 1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF)[1], estipula a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil à execução judicial para cobrança dos débitos tributários em geral, sendo ainda que a LEF não prevê expressamente a atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução.

Baseada nesse entendimento, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) emitiu recentemente orientação para que seus Procuradores apliquem – no que for favorável à Fazenda Nacional – as alterações recentes do Código de Processo Civil, sugerindo que se requeira o prosseguimento das ações de execução fiscal mesmo quando garantido o juízo e apresentados embargos. Também a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) dá sinais de simpatia a esse nefasto entendimento.

Com a devida vênia, ousa-se discordar desse posicionamento, sendo que os embargos à execução fiscal seguem procedimento específico que é lógica e sistematicamente diverso daquele que restou consagrado pelas recentes reformas do Código de Processo Civil.

Em primeiro lugar, há de se atentar que apesar de a Lei n.º 6.830, de 1980 não prever expressamente a atribuição de efeito suspensivo aos embargos, essa conclusão é decorrência lógica da Lei de Execuções Fiscais. Basta uma simples leitura dos artigos 18 e 19 da LEF para que melhor visualização da questão:

Art. 18 - Caso não sejam oferecidos os embargos, a Fazenda Pública manifestar-se-á sobre a garantia da execução.

Art. 19 - Não sendo embargada a execução ou sendo rejeitados os embargos, no caso de garantia prestada por terceiro, será este intimado, sob pena de contra ele prosseguir a execução nos próprios autos, para, no prazo de 15 (quinze) dias:

I - remir o bem, se a garantia for real; ou

II - pagar o valor da dívida, juros e multa de mora e demais encargos, indicados na Certidão de Divida Ativa pelos quais se obrigou se a garantia for fidejussória.

Note-se do artigo 18, LEF, que se não houver a oposição de embargos à execução fiscal no prazo legal, a Fazenda Pública tem o direito de se manifestar sobre a garantia da execução, ou seja, de decidir pelo seguimento da execução visando satisfazer seu crédito. De uma leitura às avessas do mesmo dispositivo, se houver oferecimento de embargos a Fazenda Pública não poderá dar seguimento à execução enquanto não resolvidos a medida incidental de conhecimento.

Por outro lado, se houver garantia prestada por terceiro, se não forem opostos embargos à execução fiscal ou se os mesmos forem rejeitados, será o terceiro titular dos bens intimado para – no prazo de 15 (quinze) dias – remir os bens ou pagar a dívida tributária, sob pena de a execução fiscal ter seguimento contra ele. Observa-se nas entrelinhas de referida norma que a execução fiscal fica paralisada até a apreciação e rejeição dos embargos.

Então, apesar de inexistir regra expressa, os embargos à execução fiscal são dotados de efeito suspensivo, por uma interpretação sistemática da Lei n.º 6.830, de 1980. Uma vez verificado que o conjunto de normas que regulam referido procedimento prevêem implicitamente a suspensão da execução fiscal enquanto não resolvidos os embargos, não há que se falar em aplicação subsidiária das alterações recentemente promovidas no Código de Processo Civil, porque nesse ponto específico há incompatibilidade dos sistemas, devendo prevalecer a norma específica, ainda que seja anterior.

Não bastasse isso, deve ser levado em consideração que os embargos à execução fiscal somente podem ser oferecidos após integral garantia da dívida tributária, conforme preceitua o artigo 16, §1.º,  da  Lei n.º 6.830, de 1980[2]. Ora, os embargos à execução nos moldes do Código de Processo Civil  independem de penhora, depósito ou caução, sendo ainda que a garantia do juízo somente é exigida para a excepcional atribuição de efeitos suspensivos à medida. No caso específico dos embargos à execução fiscal, como a garantia da dívida executada é pressuposto para a oposição de embargos, a atribuição de efeito suspensivo é decorrência natural do sistema.

Aliás, admitindo-se hipoteticamente que o artigo 739-A do Código de Processo Civil (incluído pela Lei n.º 11.382, de 06 de dezembro de 2006)[3] tivesse aplicação nos feitos de natureza tributária, ainda assim os contribuintes teriam argumentos suficientes para requerer a atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução fiscal. Explica-se: de acordo com o regime geral, a atribuição de efeito suspensivo depende de garantia da dívida (1) e de risco de grave dano de difícil ou incerta reparação (2). Nas execuções fiscais, a garantia da dívida tributária é requisito para a admissão dos embargos (1), e, por outro prisma, o risco de grave dano de difícil reparação estará sempre presente, dado que se a execução fiscal prosseguir e tiver final (com alienação dos bens dados em garantia) antes da apreciação dos embargos, se estes forem favoráveis ao contribuinte, o pagamento do injusto prejuízo experimentado pelo executado/embargante se dará por precatório, sendo que o crédito do contribuinte perante a Fazenda Pública ingressará numa das infindáveis listas de pagamento das dívidas estatais. Evidente, pois, o risco de dano de difícil reparação (2).

Por fim, há que se criticar a estratégia adotada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, de aplicação nas execuções fiscais de apenas as alterações do Código de Processo Civil favoráveis à Fazenda Pública. No ponto específico da atribuição de efeito suspensivo ou não aos embargos do devedor (aqui discutida), a admissão da necessidade de prévia garantia da execução e, de outro lado, a não atribuição de efeito suspensivo aos embargos, criaria situação de desigualdade dos executados quanto a dívidas tributárias em relação aos demais executados, eis que no regime geral (CPC), a oposição de embargos independe de penhora, depósito ou caução[4]. E isso é inadmissível, ainda mais tendo em vista que a Fazenda Pública constitui os créditos tributários utilizando-se de Poder de Império, sendo a vontade do contribuinte irrelevante para a constituição do título executivo e os procedimentos administrativos que antecedem a cobrança judicial são julgados pelo próprio credor,  sendo que os Tribunais Administrativos muitas vezes se negam a enfrentar inconstitucionalidades e/ou ilegalidades do tributo sob a (fraca) alegação de que estão vinculados a uma legalidade estrita (como se esse princípio que rege a administração não buscasse sustentação em normas constitucionais e ou leis em sentido estrito).

Em suma, a atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução fiscal é decorrência lógica do procedimento estipulado pela Lei de Execuções Fiscais, e tal sistema não foi alterado pela entrada em vigor da Lei n.º 11.382, de 06 de dezembro de 2006, mesmo porque a admissão do fim de referido efeito nas execuções tributárias implicaria em tratamento mais severo aos contribuintes devedores, por serem obrigados a garantir o juízo (o que não ocorre com os demais devedores) e mesmo assim correrem o risco de um dano de difícil reparação, por não estarem amparados pelo efeito suspensivo dos embargos.



[1]   Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

[2]   Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

     (...)

       § 1º - Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.

[3]   Art. 739-A. Os embargos do executado não terão efeito suspensivo.

       § 1º O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes.

[4]   Art. 736 - O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá opor-se à execução por meio de embargos.

 

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