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Empecilhos que emperram

No Brasil já foram duas as tentativas de implementar o modelo de administração pública gerencial, modelo esse que tem como premissa a busca de meios capazes de enfrentar a crise fiscal do Estado;

10/02/2015 07:59

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Empecilhos que emperram

No Brasil já foram duas as tentativas de implementar o modelo de administração pública gerencial, modelo esse que tem como premissa a busca de meios capazes de enfrentar a crise fiscal do Estado; como estratégia para reduzir os custos e tornar mais eficiente – olha a palavra, e-f-i-c-i-e-n-t-e, dá até calafrios!!! – a administração dos serviços que cabem ao Estado, além é claro de derrubar o modelo burocrático que teima em rondar a administração pública.
 
Atualmente a Grã-Bretanha é o modelo gerencial a ser seguido pelos países que adotaram este modelo de administração pública. Lá o gerencialismo consiste na administração voltada para resultados, orientada para os anseios do cidadão; exemplo que aqui pelos lados tupiniquins não está sendo nada fácil de ser seguido.
 
Em 1967, por meio do Decreto Lei nº 200, o Brasil faz a primeira tentativa de implementar a administração pública gerencial. Esse Decreto Lei é bastante conhecido daqueles que militam na área pública, bem como dos estudantes para concurso público, onde trata basicamente da transferência das atividades de produção de bens e serviço para autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, bem como a instituição da racionalidade administrativa, planejamento, orçamento, descentralização e controle de resultados como princípios.
 
No entanto, essa primeira tentativa não surtiu os efeitos desejados, prova disso é que essa tentativa se arrastou por quase três décadas. Onde em 1995 deu-se início a nova reforma do Estado que promoveu a transformação do modelo burocrático weberiano, que mesmo com a vigência do Decreto Lei nº 200 ainda teimava em reinar em nosso país. Naquela ocasião, ou seja, em 1995 o recém empossado Presidente da República no intuito de promover as mudanças do modelo burocrático para o gerencial, criou o Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado que seria o responsável pela reformulação do Estado brasileiro.
 
Porém passados todo esse tempo, podemos observar que o gerencialismo ainda não emplacou em sua totalidade na administração pública. Dessa forma porque não dizer que o modelo weberiano continua impregnado nas instituições até os dias atuais?
 
Pois eu mesmo sou testemunha dessa burocratização, senão vejamos; a alguns dias atrás me dirigi a um cartório para autenticar alguns documentos, para minha surpresa e também irritação o atendente disse que não poderia autenticar o danado do documento porque a assinatura não tinha sido feita à mão (de próprio punho), e por ser digital precisaria que estivesse com o carimbo da instituição para poder autenticá-lo. Pensei! Ué, um simples carimbo, as vezes até de madeira, é mais importante que a Lei nº 11.419/2006, que dentre outros dispõe sobre a assinatura digital? Enfim, como precisava do documento autenticado, fui até a referida instituição e solicitei para fixarem naquele papel o maior carimbo que eles tinham.
 
Não estamos aqui defendendo um ou outro modelo, porém é claro e notório que o modelo idealizado por Maximilian Karl Emil Weber, ou simplesmente Max Weber, se aplicado nos dias atuais só emperra ainda mais a máquina pública. Basta ver a mentalidade, pois mesmo estando nós na era digital muitas e muitas repartições públicas lidam diariamente com montanhas de papel dando a impressão de que quanto mais papel empilhado em cima das mesas e nos arquivos mais trabalho se tem. Todos sabemos que não é bem assim. A burocracia demasiada só atrasa o país, além é claro de ir na contra mão do pensamento gerencial, onde os resultados visam sempre os anseios do cidadão.
 
Sobre esse assunto, a revista Veja em sua edição nº 2.375, teceu vários comentários sobre o excesso de burocracia existente em nosso país. Há burocracia para todos os gostos e também desgostos, que vão desde a exigência de carimbo para autenticar documento em cartório até a implantação de cartilha com normas de “saúde” e “qualificação do trabalhador” para a Copa do Mundo.
 
Vamos ao pomar da fruta negra apresentado pela revista. Iniciaremos pelo carimbo na qual fui vítima; esse simples apetrecho apesar da importância que a burocracia brasileira lhes dá, os carimbos podem ser feitos ou comprados em qualquer loja do ramo, vejam só o exemplo do atraso: Um médico ou algum outro profissional pode ter seus formulários personalizados, timbrados etc., mas se não tiver o tal do carimbo não possui valor algum. Outra bizarrice, nossa carteira de identidade; como não há um sistema unificado a nível nacional, qualquer pessoa pode tirar uma carteira de identidade nas 27 unidades da Federação. Outra, o Brasil é uma das 31 nações onde o voto é obrigatório, no entanto, criou o título de eleitor que não tem nenhuma serventia, serve apenas para aumentar o volume de nossas carteiras, pois para votarmos é necessário que apresentemos um documento oficial com foto.
 
Vejam só essa: Em abril de 2014 um cidadão de Santo André foi até a delegacia registrar uma ocorrência e acabou morrendo com um tiro na cabeça. Parece piada, mas não é, a matéria foi veiculada em diversos meios de comunicação, inclusive no Estadão (http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,medico-morre-em-tiroteio-dentro-de-delegacia-em-santo-andre,1159397).
 
Não só a administração pública possui casos sui generis, senão, vejamos o caso da maior companhia aérea brasileira, a TAM, de suas vinte rotas mais movimentadas ela só foi pontual em apenas 90% nos voos de uma única rota, nas outras dezenove ouve mais de 10% de atraso. Dessa forma a companhia brasileira foi pior do que uma das piores companhias do mundo a bareinita Gulf Air.
 
O Brasil possui uma das maiores costas marítimas do mundo, no entanto, possui poucos portos e os que existem são muito caros. Segundo estudos para exportar um contêiner pelos portos brasileiros pagam-se em média 2.200 dólares, ao passo que nos países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, na qual o nosso vizinho Chile faz parte, pagam-se em média 1.070 dólares, ou seja, menos da metade do valor pago em nosso país.
 
A retrogradação do comprovante de residência. A Caixa Econômica Federal, nada mais nada menos que o segundo maior banco público do país, exige a apresentação do comprovante de residência em alguns procedimentos. Mas se o cliente apresentar uma correspondência enviada pela própria CEF, o banco não aceita. Segundo o banco, a correspondência tem que ser enviada ao cliente por um terceiro. Isso leva a crer que a Caixa não confia nela mesma.
 
Estamos chegando ao final da plantação de myrciaria cauliflora, fruta saborosíssima que só dá aqui pelos lados tupiniquis e que se tornou adjetivo para os casos sui generis da nação verde amarela. Como não poderia deixar de ser trata-se de um dos pontos nevrálgicos de nossa sociedade; a saúde.
 
Observem o retrocesso, na década de 60, o Brasil foi homenageado internacionalmente por ter erradicado a dengue, mas nessa mesma década foi detectado novos focos da doença, agora segundo pesquisas entre os anos de 2000 a 2013, foram registrados mais de 7 milhões de casos de dengue. Vale lembrar que em 2014 ocorreram óbitos em vários estados do país. Estamos perdendo até para o Aedes aegypti. E por último como havíamos falado em Copa do Mundo no início deste artigo, naquela época, ou seja, no ano da copa, foi lançada uma cartilha faltando menos de duas semanas para o início do mundial onde pretendia entre outros objetivos, promover a saúde. Seria muito mais benéfico para todos se a tal cartilha fosse lançada dois anos antes do mundial e não faltando duas semanas para o pontapé inicial.
 
Por todo esse antagonismo, ou seja, o gerencialismo e a burocracia, nota-se que o modelo weberiano retarda o desenvolvimento do país pois há um excesso de formalismo para se obter coisas ou resultados relativamente simples. Por outro lado, para que o modelo gerencial realmente possa engrenar deve haver a iminente necessidade de definir os programas de governo contidos nos Planos Plurianuais, bem como mecanismos claros de responsabilização e punição dos gestores públicos além de transparência em todo o processo. Falando em transparência, temos até Lei para isso. Dessa maneira a administração pública estará voltada para a e-f-i-c-i-ê-n-c-i-a. Não obstante, é preciso que ocorra mudança de mentalidade não só da administração pública, mas da sociedade. Senão, voltaremos para o nosso pomar de myrciaria cauliflora e com isso teremos muito Ananas comosus para descascar.
 
Claiton Cavalcante
Contador, Pós Graduado em Contabilidade Pública e Controladoria Governamental

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