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Bodas de Cristal para a Lei de Responsabilidade Fiscal

A administração pública comemora as bodas de cristal da Lei Complementar nº 101/2000, referência para as finanças públicas do País voltada para a responsabilidade na gestão fiscal, bem como um marco para o Direito Financeiro...

01/05/2015 13:15:01

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Bodas de Cristal para a Lei de Responsabilidade Fiscal

Segunda-feira, 04 de maio de 2015 a administração pública comemora as bodas de cristal da Lei Complementar nº 101/2000, que se popularizou como a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), referência para as finanças públicas do País voltada para a responsabilidade na gestão fiscal, bem como um marco para o Direito Financeiro, tendo em vista a regulamentação do artigo 163 da Constituição Federal (CF), onde prevê que lei complementar estabelecerá normas gerais de finanças públicas.

Não obstante, a debutante atende também a outros artigos da CF, entre eles o artigo 165, § 9º, II, o artigo 169 que estabelece os limites para as despesas com pessoal tanto ativos quanto inativos e no seu artigo 68 atende o prescrito no artigo 250 da CF que é a criação do Fundo do Regime Geral de Previdência Social, cuja finalidade é prover recursos para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência social.

Em palavras mais singelas, a LRF é uma espécie de irmã mais nova da cinquentona que neste ano comemorou as bodas de bronze (51 anos), Lei nº 4.320/64, que estabelece normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos dos entes da federação.

São raras as leis em nosso País que não foram modificadas ou sofreram poucas alterações ao longo do tempo e a LRF é uma dessas, onde que nesses 15 anos foi alterada somente uma vez através da Lei Complementar nº 131/2009. Conta também com somente quatro decretos de regulamentação, são eles: (i) nº 3.917/2001; (ii) nº 4.959/2004; (iii) nº 5.356/2005 e (iv) nº 7.185/2010. O fato de ter sofrido apenas uma modificação demonstra a solidez com que a LRF foi arquitetada.

O objetivo principal da LRF vem estampado já no art. 1º, onde estabelece normas de finanças públicas com ênfase na responsabilização da gestão fiscal, ao passo que no parágrafo primeiro desse artigo é trazido à baila a definição de “responsabilidade na gestão fiscal”, que entre outros, é transparência e planejamento nas ações, prevenção de riscos que venham a afetar o equilíbrio das contas públicas, cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas, condições para renúncia de receita, despesas com pessoal, inscrição em restos a pagar e operações de crédito.

Com relação a operações de crédito, cabe aqui um parêntese; recentemente a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), publicou a Portaria nº 199/2015 regulamentando o Sistema de Análise da Dívida Pública, Operações de Crédito e Garantias da União, Estados e Municípios – SADIPEM, que é um sistema onde permite maior integração entre a STN, entes da federação e Instituições Financeiras no que concerne ao envio de pleitos à STN e à análise das operações de crédito da União, Estados e Municípios, já o lançamento do sistema ocorreu no dia 20 de abril de 2015.

Podemos extrair da LRF quatro grandes pilares que apesar das turbulência na qual tem passado a administração pública, continuam firmes em seus princípios, quais sejam: i) o planejamento, que compreende o Plano Plurianual, bem como os conteúdos da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei Orçamentária Anual; ii) o controle, que exige ações mais efetivas e fiscalizadoras por parte dos Tribunais de Contas; iii) a responsabilidade, onde os responsáveis pelo mau uso dos recursos ou danos ao erário sofrerão sanções conforme a Lei nº 10.028/2000; iv) a transparência, este alterado pela Lei Complementar nº 131/2009, que consiste na divulgação de relatórios e informações que interessam a população, bem como demais informações publicadas na internet.

Mesmo em alguns casos trazendo difícil interpretação em seus artigos, como exemplo podemos citar o artigo 42, qual o militante da área que nunca deparou com ele? a LRF como um todo tem seus prós e como quase nada é perfeito possui também os contras.

É claro e cristalino que a LRF trouxe mudanças dantescas para as finanças públicas do País, haja vista que se não fosse ela, a estabilização da moeda (Plano Real), não teria surtido os efeitos desejados. Com a entrada em vigor da Lei foram estabelecidos limites de gastos com pessoal em todas as esferas de governo, com isso os servidores e funcionários públicos passaram a receber seus vencimentos de forma digna, uma vez que no período antecessor da mesma muitos conviviam com os constantes atrasos salariais.

São várias as outras mudanças que impactaram positivamente as finanças públicas bem como a maneira com os gestores foram obrigados a agir. Não vamos aqui aprofundar o assunto, portanto, mencionaremos somente mais algumas, entre elas a de que os prefeitos deverão assumir compromissos de metas e riscos fiscais e apresentar os demonstrativos desses compromissos para a sociedade; no último ano de mandato desses prefeitos a coisa fica, digamos, mais difícil, pois torna proibido o aumento de despesa com pessoal; também é proibido a contratação de antecipação de receita orçamentária (ARO); além de ser proibido contrair obrigações nos últimos oito meses de gestão sem que tenha recursos financeiros suficientes.

O descumprimento dos limites impostos pela Lei, assim como o de algum dos pontos mencionados nos dois parágrafos anteriores acarreta a suspensão de transferências para os municípios, bem como sujeita o gestor às penalidades da lei.

Outra importante imposição da LRF é a proibição dos bancos públicos financiarem diretamente o governo, ou seja, o seu controlador, tal previsão está contida em seu artigo 36. No entanto, recentemente segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), o governo federal por estar com dificuldade de caixa atropelou esta proibição ao determinar que a Caixa Econômica Federal destinasse recursos para pagamentos do Bolsa Família, bem como ao Banco do Brasil para que liberasse subsídios para os créditos agrícolas. Na visão do TCU, tal prática configurou financiamento direto ao governo brasileiro sendo enquadrado portanto, como crime de responsabilidade fiscal. Essa, se assim podemos dizer, manobra, recebeu o apelido de “pedaladas fiscais”. É! pernas e mãos têm de sobra para pedalar!

Na outra vertente, a LRF traz percentuais padrão para todo o Brasil, devemos ter em mente que a Lei foi sancionada há quinze anos atrás e de lá para cá os tempos e as circunstâncias, inclusive da economia mudaram. Por que percentuais de 50%, 60% e 70% por exemplo, permanecem até hoje? Seria de grande valia um estudo para rever estes percentuais.

Além disso, o Brasil apresenta enormes desigualdades regionais sendo assim, não é razoável que os percentuais e alguns critérios fiscais estabelecidos na Lei sejam os mesmos para regiões ou cidades com realidades totalmente díspares, não é inteligente por exemplo, compararmos a cidade de São Paulo com a de Centro do Guilherme no Maranhão, que segundo a Fundação Getúlio Vargas é a cidade mais pobre do Brasil.

Assim, é claro que esses percentuais devem ser revistos, para isso seria interessante a criação de grupos de estudo regionalizados para que todos pudessem expor suas respectivas realidades, neste sentido, o Professor Mestre e atual Presidente do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, possui o seguinte entendimento “os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal devem ser readequados à realidade dos tempos atuais, sem contudo desfigurar essa Lei que muito contribui para a gestão fiscal do Brasil”.

Dessa forma, a sociedade não deve esperar somente da LRF, ela (sociedade), deve exercer com mais veemência o poder que lhes cabe o controle social por exemplo, além é claro de se envolver mais com os assuntos ligados à política porque só assim deixaremos as desigualdades sociais e regionais para trás. A Lei debutante está há quinze primaveras fazendo a parte dela, cabe agora a cada um dos cidadãos exercer também o seu mister para quiçá, quando ela se tornar uma Balzaquiana as finanças públicas do nosso Brasil possam estar verdadeiramente nos trilhos.

 

Claiton Cavalcante

Contador, Pós Graduado em Contabilidade Pública e Controladoria Governamental

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