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Opinião Econômica - Vergonha

Uma visão crítica de Benjamin Steinbruch para o Jornal do Comércio

08/04/2014 07:28:30

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Opinião Econômica - Vergonha

Procurei nos jornais manifestações de descontentamento pelo novo aumento da taxa básica de juros - a nona em um ano, que elevou a Selic para 11%. Não encontrei quase nada. Só vi declarações sintonizadas com a decisão e poucas menções aos efeitos negativos dela, com honrosas exceções de algumas entidades empresariais, como a Fiesp. 

Pode ser que a imprensa não tenha procurado os descontentes, mas também pode ser que eles já estejam conformados com a situação ou receosos de assumir posições contrárias à onda dominante que considera natural a tendência de aperto monetário neste momento. 

É triste que seja assim, que se observe pouca preocupação com o efeito que a alta de juros tem sobre a atividade econômica. Nos EUA, Janet Yellen, presidente do Banco Central, fez um discurso na semana passada em que mostrou enorme compromisso com a busca do crescimento da economia e, principalmente, do emprego e da renda. 

Ainda que as taxas de desemprego tenham caído significativamente nos EUA, a fala de Yellen deixou implícito que não haverá aumento de juros neste ano e provavelmente nem em 2015. Ela lembrou que ainda existem 7 milhões de americanos trabalhando em tempo parcial que deveriam trabalhar em tempo integral e disse que os salários estão crescendo muito vagarosamente. 

Em outros tempos, aqui no Brasil, jamais empresários do setor produtivo assimilariam tão facilmente o discurso favorável à elevação dos juros ou se calariam conformados em momentos como este. 

Não há razão para mais essa elevação de 0,25 ponto percentual da semana passada. A inflação teve um aumento no primeiro trimestre, ninguém pode negar, mas em consequência da alta dos alimentos por razões puramente climáticas: a falta de chuvas, em níveis históricos, que também ameaça o abastecimento de água em São Paulo e cria grandes problemas para a geração de energia elétrica na região Sudeste. 

O impacto da elevação dos juros no combate a essa inflação climática e sazonal, tirando um possível efeito residual psicológico sobre as expectativas, será próximo de zero. Tão logo o clima melhore, os preços se acomodarão, qualquer que seja a Selic. Mas a taxa maior significará gastos adicionais bilionários com juros da dívida pública atrelada à Selic, um ônus fiscal bastante pesado e, em geral, ignorado. 

Tudo isso ajuda a agravar a percepção negativa sobre o Brasil, levada ao auge no dia em que a Standard & Poor’s anunciou, há duas semanas, o rebaixamento da nota de crédito do País. Sintomaticamente, depois do anúncio, houve um efeito contrário ao imaginado: as ações das empresas listadas na bolsa brasileira, em especial as de estatais, tiveram forte alta, e o real se valorizou. 

De tudo o que a Standard & Poor’s afirmou ao rebaixar a nota de crédito do Brasil, o único ponto razoável refere-se ao baixo crescimento. O ritmo lento de expansão da economia é um fato que, por sinal, decorre, entre outras causas, do elevado custo do crédito no País. Os resultados fiscais, lembrados pela agência como uma das principais razões para o rebaixamento, não são brilhantes, mas também não são catastróficos. E o déficit externo efetivamente cresceu, mas não para níveis que possam ser considerados perigosos. 

Há uma série de indicações de que a economia deu uma ligeira reaquecida no primeiro trimestre, especialmente em janeiro e fevereiro. A produção industrial aumentou 3,8% no primeiro mês do ano e 0,4% no segundo. O emprego continuou em alta - segundo os dados do Ministério do Trabalho, houve 261 mil contratações com carteira assinada em fevereiro. E a renda também cresceu. 

Será lamentável se essa tendência for revertida nos próximos meses, em razão dos efeitos retardados do aperto monetário que começou há um ano e de novos que podem vir. 

O conformismo com o arrocho monetário é inadmissível. Por definição, altas taxas de juros solapam a produção, desestimulam investimentos e impedem o crescimento econômico e a criação de empregos. Ninguém vai me convencer do contrário, nem que fique sozinho nessa batalha. Não dá para explicar por que o Brasil precisa continuar sendo, durante tantos anos, dependente desse remédio amargo e cheio de danosos efeitos colaterais. 

A vergonhosa realidade da mais alta taxa de juros do mundo. 

Diretor-presidente da CSN, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro-vice-presidente da Fiesp

Fonte: Jornal do Comércio

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