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Por que os bancos brasileiros adotam um padrão contábil local, e não o IFRS?

Os bancos brasileiros adotam um padrão contábil local, e não o IFRS, normas usadas em boa parte do mundo.

14/01/2015 14:55:01

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Por que os bancos brasileiros adotam um padrão contábil local, e não o IFRS?

“Quando o Brasil vai abandonar essa espécie de contabilidade primitiva que vocês ainda têm? perguntou durante recente teleconferência o analista Boris Molina, do Santander, ao diretor de relações com investidores do Bradesco, Luiz Carlos Angelotti. “É muito difícil reconciliar esses números, comparado a outros países”, disse.

O questionamento deve-se ao fato de que os bancos brasileiros adotam um padrão contábil local, e não o IFRS, normas usadas em boa parte do mundo.

Essas regras já são seguidas integralmente pelas empresas não financeiras desde 2010. Por exigência da Comissão de Valores Mobiliários (CMV), é nesse padrão que as companhias de capital aberto têm de divulgar seus balanços trimestrais.

Para os bancos, a obrigatoriedade é outra, ditada pelo Banco Central (BC) – o BR Gaap. A cada trimestre, as instituições apresentam seus números conforme as regras do BC. A autoridade exige que apenas as demonstrações consolidadas anuais sejam feitas pelo IFRS.

Desde o ano passado, os bancos passaram a entregar ao BC mais um formato de balanço, o prudencial. Essa contabilidade também é baseada no padrão brasileiro, mas muda a forma de consolidação de subsidiárias. O objetivo é dar à autoridade uma visão mais adequada sobre o capital dos bancos sob as normas de Basiléia 3.

Adotar os dois modelos implica custos. Os gastos com divulgação de balanços ficam em R$ 3 milhões por ano, diz um executivo de uma grande instituição. “Temos quase duas equipes para prepara os dados em cada padrão. Quanto mais padrões, mais trabalho e mais confusão”, afirma essa fonte, que pediu para não ser identificada.

Mesmo sem abrir mão das regras locais, o BC começou a incorporar às regras bancárias alguns princípios do IFRS. No entanto, mais recentemente os esforços de convergência ficaram aquém do esperado por executivos do setor.

Embora haja a expectativa de convergência dos padrões, não há prazo para que isso aconteça. Um dos entraves, segundo fontes que acompanham a questão, são os custos de sistema e treinamento que a medida imporia ao BC.

Procurado desde novembro para comentar o assunto, o BC não quis se pronunciar. Atualmente, a CVM e o BC discutem o assunto em um comitê.

O padrão contábil utilizado pelo BC não é visto no mercado como um sistema inferior. Ao contrário, as regras brasileiras são consideradas mais conservadoras que as IFRS, baseado em princípios mais gerais.

“O BC é um regulador prudencial, com foco na solidez do sistema” afirma Edison Arisa, líder de auditoria da Pwc Brasil, para quem a convergência total será um processo lento. O padrão brasileiro é à base da regulação e da supervisão do sistema bancário do país.

Uma das diferenças mais significativas se dá na classificação da qualidade do crédito. Sob o padrão brasileiro, as provisões para devedores duvidosos refletem perdas esperadas. Já na largada, os bancos precisam separar no mínimo 0,5% do valor do crédito para um eventual calote. Depois, fazem provisões adicionais conforme os dias de atraso.

No caso do IFRS, são provisionadas apenas as perdas incorridas. Após uma reforma capitaneada pelo Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb), os princípios globais vão aderir ao conceito de perda esperada a partir de 2017 – porem, de forma mais livre que a adotada no país.

Outras divergências importantes estão no reconhecimento de ativos intangíveis e de créditos tributários.

A diferença de conceitos se reflete nos resultados. Pelo IFRS, o Itaú teria lucro líquido de R$ 11,5 bilhões no acumulado de janeiro a setembro. É um valor R$ 466 milhões maior em relação ao balanço que segue o padrão estabelecido pelo BC. A discrepância se dá por conta das provisões para perdas com crédito. Na contabilidade internacional, o Itaú precisaria fazer R$ 295 milhões a menos em provisões.

O saldo no balanço patrimonial de provisões para crédito do Itaú no BR Gaap é de R$ 25,3 bilhões, ou R$ 3,4 bilhões superior ao do IFRS.

No Santander, a reserva para perdas soma R$ 13,7 bilhões em IFRS, o que representa R$ 1 bilhão a menos que pelo BR Gaap. O maior impacto, nesse caso, está na amortização do ágio da compra do banco Real, inexistente no IFRS. Pelo padrão internacional, o Santander teve lucro líquido de R$ 4,3 bilhões de janeiro a setembro do ano passado. Já pelo padrão brasileiro, o resultado foi de R$ 1,6 bilhão.

“entre os bancos, o Santander é que apresenta a maior diferença”, diz o analista Tito Labarta, do Deutsche Bank. “Mas o banco já mostra seus números no IFRS, então não há um grande problema. No caso dos demais bancos não há tanta diferença.”

Dos grandes bancos brasileiros, apenas Itaú e Santander divulgam os números em IFRS junto com a apresentação dos dados exigidos pelo BC. “Já nos preparamos voluntariamente (para o IFRS) desde 2013 porque essa é uma boa prática”, diz Alexsandro Broedel, diretor do Itaú. O executivo não critica o padrão brasileiro, mas afirma que a unificação contábil poderia trazer redução de custo e facilitar a comparabilidade.

Em algumas instituições, especialmente nas que têm menos foco em crédito e mais em tesouraria, a diferença não é tão relevante. No BTG Pactual, o lucro líquido de 2013 no padrão brasileiro foi de R$ 2,67 bilhões. No internacional, ficou em R$ 2,69 bilhões. “Nosso patrimônio é quase todo caixa ou conversível em caixa. Temos pouco intangível”, afirma o diretor de relações com investidores do banco, João Marcello Dantas. Para ele, a duplicidade não é um grande problema. “O padrão do BC atende os objetivos e é conhecido pelos investidores, além de ser base para pagar dividendos” , diz.

Para Flavio Peppe, sócio de auditoria para o mercado financeiro da Ernst & Young, a prestação de contas em IFRS uma vez ao ano tornou os bancos brasileiros mais comparáveis com pares internacionais. Por outro lado, as exigências do BC ajudaram as instituições do país a atravessar melhor a crise de 2008. “O outro lado da moeda é que, nos dias de bonança, os bancos locais pagam menos dividendos, afirma.

Fonte: Jornal Contábil

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