A proposta de Emenda Constitucional (PEC) que prevê a criação de um teto para os gastos públicos federais deve ser encaminhada ao Congresso nesta quarta-feira (15/06).
Definir o teto se mostrou bem mais complexo do que a equipe econômica do governo Temer gostaria. Não basta determinar que o gasto de um ano não pode ser superior ao INPC ou ao IPCA do ano anterior, por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Essa parte é fácil, dizem os especialistas.
Complicado é que, em paralelo, é preciso desmontar um arcabouço legal que sustenta cerca de 14 gastos obrigatórios - aqueles que o governo não tem autonomia para mexer.
Segundo o jornal O Estado de S. Paulo apurou, a equipe do Ministério da Fazenda deparou-se com dificuldades para definir como fazer o desmonte de tantas regras, sem gerar oposição política no Congresso ou enfrentar uma judicialização. O problema está na composição e no potencial polêmico de se mexer nesses gastos.
Quem está do lado de fora do governo também já identificou o problema. "O governo pode até vender a PEC do Teto como algo impressionante, mas a PEC do Teto sozinha e nada é praticamente a mesma coisa", diz a economista Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute, em Washington.
QUE GASTOS SÂO ESSES?
Quando se fala em gastos obrigatórios, sempre vêm à cabeça os gastos com saúde e com educação, que estão previstos na Constituição e tendem a alimentar divergências. Mas a lista é maior.
O economista e assessor parlamentar Felipe Salto fez um levantamento do tamanho do problema. Salto identificou que há, por baixo, 14 rubricas "amarradas" por algum tipo de indexação ou vinculação que afetam a chamada despesa primária (que exclui os gastos financeiros, como o pagamento de juros da dívida).
Esse grupo de gastos obrigatórios, diz ele, drena R$ 878 bilhões. Ou seja: o governo não pode mexer em 76% da despesa primária.
Segundo Salto, fazem parte desse pacote os gastos com o Fundo de Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb); os fundos constitucionais do Norte, do Centro-Oeste, do Nordeste e do Distrito Federal; a Previdência Social; o salário-educação; as transferências constitucionais a Estados e municípios; a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas); o abono salarial; o seguro-desemprego; afora os sempre lembrados gastos com a saúde e a educação.
Salto acrescenta que, se forem considerados os gastos com pessoal - que também são obrigatórios e demandariam algum dispositivo para serem flexibilizados -, o nível de rigidez orçamentária sobe para 95%.
Garantir autonomia para mexer nos gastos obrigatórios representa a diferença entre o fracasso ou o sucesso do teto. Primeiro, porque são eles que crescem de maneira exponencial e tornam o peso das contas públicas insustentáveis.
Segundo, porque o volume de gastos obrigatórios é tão elevado que, se o governo não tiver autonomia para mexer neles, o teto vai travar a gestão da máquina pública. Simplesmente, não vai sobrar dinheiro para nada.
PROPOSTA
Na lista de medidas para garantir a aplicação do teto dos gastos do governo, o Ministério da Fazenda propõe o fim do aumento gradual de recursos "carimbados" na Constituição para a Saúde.
O texto da proposta retira da Constituição artigo que prevê o escalonamento dos gastos na área da Saúde, nos próximos cinco anos, de 13,2% para 15% da receita corrente líquida do governo.
Também estava previsto o fim do abono salarial. O benefício, criado há 46 anos, é dado hoje aos trabalhadores que recebem até dois salários mínimos (R$ 1.760).
Mas o Ministério da Fazenda informou que a proposta não constará mais na PEC.
A medida do governo Temer também quer que o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) financie as despesas de previdência dos trabalhadores da iniciativa privada e dos servidores públicos, além de benefícios assistenciais previstos na Constituição.
Com a medida, o governo quer ampliar na Constituição o leque de benefícios sociais que são bancados com o dinheiro do FAT e, ao mesmo tempo, desobrigar o Tesouro de cobrir anualmente o rombo do FAT, que em 2016 está estimado em R$ 8,7 bilhões.
PRAZOS
Conforme revelou o jornal O Estado de S. Paulo, o texto da PEC encaminhado pelo Ministério da Fazenda ao Palácio do Planalto prevê a fixação de um teto para os gastos públicos por 20 anos.
Pela proposta, esse limitador do crescimento das despesas do governo poderá ser alterado a partir do décimo ano de vigência do novo regime fiscal. Mas apenas por lei aprovada pelo Congresso Nacional. É vedado o uso de Medida Provisória, instrumento usado pelo Poder Executivo que entra em vigor de forma imediata. Na prática, essa revisão significa que o prazo inicial para o teto será de dez anos.
O texto da PEC, que ocupa apenas três páginas, estabelece também, como espécie de penalidade, uma sequência de sete "travas" a novas despesas no caso de o teto ser descumprido.
Entre elas está a proibição de reajuste salarial de servidores públicos; criação de novos cargos ou funções; mudanças na estrutura de carreira; contratação de pessoal, e realização de concurso. Além disso, as despesas com subsídios concedidos pelo Tesouro Nacional não poderão superar os gastos do ano anterior. Também será proibida a concessão de novos incentivos tributários.
Fonte: Estadão Conteúdo