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Economia

A retração da economia do Brasil mostrou seus piores efeitos este ano.

O país ganhou mais de 2 milhões de desempregados. Caíram o poder aquisitivo e o consumo, subiu a inadimplência, o crédito escasseou. Assim, muitos brasileiros têm feito malabarismos para sobreviver à recessão.

20/12/2016 14:20:21

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A retração da economia do Brasil mostrou seus piores efeitos este ano.

Cláudia Barbosa passou a comprar em atacarejo e, pela primeira vez em muitos anos, não vai viajar neste final de ano. Roberto Cordeiro Leite deixou de dar aulas e virou motorista do Uber. Já o casal Mariana Sola e Eduardo Silva passou a vender brigadeiros na rua, foi morar de favor e adiou o sonho de ter filho por tempo indeterminado.

Com o prolongamento da recessão e o desemprego em alta, o brasileiro teve que apertar ainda mais os cintos em 2016 e abrir mão de alguns hábitos de consumo que acreditava serem conquistas. O ano termina com inadimplência recorde, renda em queda e confiança baixa em meio a dúvidas sobre a retomada da economia em 2017. 

Para mostrar os impactos da crise econômica na vida dos brasileiros, o G1 reuniu três histórias de trabalhadores que tiveram que mudar de ocupação ou de hábitos de consumo em 2016. Confira mais abaixo. 

O número de desempregados saltou para 12 milhões, um acréscimo de mais de 2 milhões em 1 ano. A taxa de desemprego está em 11,8% e só não é maior porque também aumentou o número de pessoas que simplesmente desistiram de procurar emprego. No ano, até outubro, foram eliminados mais de 750 mil postos de trabalho com carteira assinada. 

 

Gráfico mostra o crescimento do número de desempregados em 12 meses

Até mesmo o trabalho por conta própria dá sinais de saturação. Em 1 ano, encolheu em mais de 720 mil o número de brasileiros com esse tipo de ocupação. Ou seja, muitos dos desempregados que tentaram abrir um negócio quebraram ou desistiram da empreitada. 

A deterioração do mercado de trabalho se refletiu também na perda de certas conquistas da classe média brasileira nos tempos de bonança, como plano de saúde e a TV por assinatura. No ano, 1,1 milhão de pessoas deixaram de ter planos de saúde e terão de recorrer ao sistema de saúde pública. E o número de assinantes de TV a cabo caiu 550 mil em 1 ano. 

Com medo do desemprego, crédito mais escasso e dinheiro mais curto, as famílias frearam os gastos. Segundo os dados do IBGE, as vendas do comércio varejista caíram 6,8% em 12 meses até outubro, a maior queda desde 2001. O consumo caiu em todos os setores, do supermercado ao shopping. Nas ruas e dentro de casa, atingindo até mesmo a vaidade e os cuidados pessoais. 


O ano de 2016 foi também de raspar os cofrinhos. Os saques na caderneta de poupança superaram os depósitos pelo segundo ano consecutivo. No acumulado até novembro, a saída líquida de recursos somou R$ 51,3 bilhões, o segundo pior resultado da história - perdendo apenas para 2015. 

Já a inadimplência dos clientes bancários bateu 5,9% - o maior patamar da série histórica do Banco Central, que começa em março de 2011 – o que refletiu na menor oferta de crédito e juros recordes do cartão de crédito e cheque especial. Hoje são cerca de 60 milhões de brasileiros inadimplentes. 

A inflação, que foi o vilão da economia no primeiro semestre, deu uma trégua no fim do ano. A inflação oficial desacelerou para abaixo de 8% em 12 meses, o que permitiu o Banco Central iniciar em outubro a redução da taxa básica de juros – o primeiro corte em quatro anos. 

Gráfico mostra as taxas de inflação desde o começo de 2016

O ano chega ao fim sem a certeza de que a crise atingiu o fundo do poço. Já são ao menos 7 trimestres consecutivos de queda do Produto Interno Bruto (PIB), e nos últimos meses pioraram as expectativas em relação à retomada da economia. O governo e parte do mercado projetam que a retomada deverá vir a partir do 2º semestre de 2017, mas já há quem diga que o crescimento será nulo no ano que vem. 

Gráfico mostra a variação do PIB desde 2015
 

PERDA DE CONQUISTAS

Oano de 2016 definitivamente será lembrado como um teste de resistência para Mariana Marcon Sola e Eduardo Silveira Silva. A crise os atingiu em cheio e eles tiveram de fechar um negócio próprio. Isso fez com que eles perdessem diversas conquistas financeiras. Eles tiveram que ir morar com a mãe de Mariana, deixaram de comer fora e de viajar, cancelaram a TV a cabo e a internet, passaram a usar o sistema público de saúde e adiaram o sonho de ter filho por tempo indeterminado.

Mariana, de 35 anos, e Silva, de 39, vendem brigadeiros no porta-malas do carro. No ano passado, eles atendiam os clientes num estande numa galeria na badalada Rua Augusta, em São Paulo. Antes de quebrar, o casal chegou a ter emprego fixo – ele era gerente de projetos na área de tecnologia da informação, e ela, secretária de diretoria. 

Silva ficou desempregado em setembro de 2014, e Mariana segurou as contas sozinha. Eles ainda moravam em apartamento alugado e tinham plano de saúde. O ex-gerente de projetos passou a fazer brigadeiros e Mariana os vendia no seu trabalho. Em maio de 2015, abriram um estande para vender os doces e café numa galeria na Rua Augusta. Pagavam R$ 1,5 mil de aluguel com o salário dela mais o dinheiro do faturamento. 

Mas em julho do ano passado, Mariana saiu do emprego porque a empresa ia cortar pessoal e ela fez acordo para receber as verbas da rescisão. Pegou o dinheiro dos 4 anos de trabalho e investiu no estande. Até agosto o movimento foi muito bom, depois começou a cair e em outubro o casal já estava no vermelho. “Mas decidimos esperar as vendas do Natal e até renovamos o contrato do aluguel”, lembra Silva. 

O casal caiu na inadimplência com as despesas de condomínio, aluguel e contas de luz atrasados. E se endividaram em novembro, quando pegaram empréstimo para pagar as contas. O aluguel do estande teve de ser parcelado. “Entramos numa espiral de dívidas, até a minha mãe pegou empréstimo pra gente”, diz Mariana. 

O movimento do Natal de 2015 decepcionou, e o casal fechou o estande no final de janeiro deste ano. Sem dinheiro, passaram a comer arroz com farofa todos os dias. Mas a pior decisão veio no final de fevereiro: foram morar de favor na casa da mãe de Mariana porque não tinham dinheiro para pagar o aluguel. “Adiamos o máximo que pudemos, mas já estávamos devendo quatro meses de aluguel e a luz já tinha sido cortada três vezes”, conta Silva. 

O casal vendeu os móveis e usou o dinheiro para pagar as dívidas e investir na venda de brigadeiros. “A gente relutou a vender na rua. Mas no carnaval deste ano tivemos de vender cerveja e catuaba para poder comer. Nunca imaginei que passaria por isso na minha vida”, diz Silva. 

Desde maio, eles estão vendendo brigadeiros no carro emprestado pela mãe de Mariana numa travessa de uma avenida comercial da Zona Sul de São Paulo. “O dinheiro dá para pagar os gastos, mas ainda não dá para voltar a morarmos sozinhos”, lamenta Silva. 

Quando os dois trabalhavam em emprego formal, a renda familiar era de R$ 9 mil. Neste mês, eles faturaram R$ 3,5 mil, mas gastaram R$ 3,2 mil com todas as despesas mensais. Silva diz que voltar à renda antiga pode levar um bom tempo, mas não perde a esperança. “Aos poucos vai melhorando, para 2017 esperamos ter uma casa, voltar a ter plano de saúde, que nosso negócio prospere, até abrir um food truck", diz Silva. "Porque mais um ano de 2016 a gente não aguenta.” 
 

PERDA DO EMPREGO

Opedagogo Roberto Cordeiro Leite, de 44 anos, não imaginaria 6 meses atrás que iria se tornar motorista do Uber. Sem conseguir emprego na área de educação, Leite teve de se virar. Ele confessa que se sente desconfortável com a nova ocupação e encara seu trabalho como um bico temporário. “Eu não sou Uber, eu estou”, afirma.

O fato de perder dois empregos em sua área nos últimos 10 anos o fez desviar o caminho da sua profissão. Leite foi inspetor de alunos num colégio tradicional de São Paulo por oito anos e depois deu aulas de filosofia, sociologia e ética numa Escola Técnica Estadual de São Paulo (Etec) por dois anos. Há um ano ele espera por concurso público. 


A ideia de se tornar motorista do Uber surgiu após ele comprar um carro zero km seis meses atrás. Como estava desemprego, entrou no Uber para complementar a renda familiar. Mas sua esposa perdeu o emprego de gerente administrativa há cerca de dois meses e ele passou a sustentar a casa sozinho. Leite diz que os dois vão se mudar para o interior no começo do ano e tentar outra ocupação. 


Ele trabalha no máximo 9 horas por dia e folga aos finais de semana. Mas ser motorista da Uber gera certa insegurança pelo fato de a renda oscilar muito de acordo com o movimento. Tem semana que ele tira só R$ 200. E o máximo chega a R$ 500. “Eu nunca pensei em ser Uber, não estudei para isso. Foi uma oportunidade que apareceu, e se eu não fizer isso eu danço”, diz. 

Para segurar as contas, eles reduziram a ida a restaurantes e viagens, desativaram a TV a cabo, usam celular pré-pago e compartilham o cartão de crédito. Mesmo assim, eles estão sacando dinheiro da poupança, criada quando ambos tinham emprego fixo, para pagar as contas do dia a dia.  

PERDA DO PODER DE COMPRA

Aempresária Claudia Barbosa, 46 anos, passou a comprar em atacarejo este ano. Para manter o poder de compra, ela teve de substituir os supermercados e empórios de alto padrão por estabelecimentos que misturam o atacado e o varejo e, por isso, oferecem maiores descontos.

Seu padrão de vida financeiro caiu após sua corretora de seguros perder clientes. Ela teve de demitir 78 dos 90 funcionários e mudou a empresa para um espaço menor. Claudia mora em uma cobertura no Morumbi, bairro de classe média alta de São Paulo, que ainda não foi quitada. Por isso, tem feito malabarismos para dar conta de todos os gastos. 

A empresária mudou o hábito de compra também por causa da inflação, que pressionou o bolso dos brasileiros especialmente no primeiro semestre do ano. Segundo ela, os supermercados subiram muito os preços das mercadorias este ano. “Tivemos que nos adequar a uma nova realidade, e se adaptar à mudança de qualidade não é fácil”, comenta. 


Agora ela escolhe bem o que vai comprar, priorizando os itens de maior necessidade. “Tem que buscar a qualidade com o menor preço e substituir marcas mais caras pelas mais em conta”, afirma. Antes ela ia todo final de semana em supermercado e sua dispensa nunca ficava vazia. Agora ela vai ao atacarejo de 15 em 15 dias para comprar somente o necessário para repor o que acabou. 

Claudia conta que encontra marcas até 50% mais baratas no atacarejo, principalmente em produtos de limpeza, pão de queijo e bebidas. Mas ela fez questão de manter as marcas melhores de alguns produtos, como papel higiênico e do café. “É lógico que eu quero voltar a ter o poder de compra que eu tinha e escolher por qualidade e não preço”, diz. 

E neste final de ano, pela primeira vez em muitos anos, ela não vai viajar para o exterior ou para o litoral. E parte das compras para as festas ela vai fazer no atacarejo. Segundo ela, o vinho frisante italiano que ela costuma comprar no Natal está por R$ 25 em vez dos R$ 40 cobrados pelo supermercado que frequentava. “Vou comprar 10 garrafas”, diz. Claudia diz que comprará ainda os refrigerantes e as cervejas no atacarejo. “O panetone eu paguei a metade do preço”, comemora. 

Mesmo com os esforços para economizar nas compras, Cláudia teve de mudar seus hábitos mais básicos, como o café da manhã. Antes a sua mesa tinha três tipos de queijo, como brie, gruyère e requeijão, cinco sabores de geleia importada e frutas populares na Europa e EUA como blueberry. Agora tem queijo minas, uma geleia e uma fruta da estação, como mamão. 

Ela cortou ainda sorvete, biscoitos e macarrão importados. Carnes e queijos caros saíram do cardápio e só voltam à mesa de Cláudia em quantidades bem reduzidas e ocasiões especiais. 

Fonte: G1

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