1 – INTRODUÇÃO
Usualmente é chamado de Terceiro Setor o conjunto de pessoas jurídicas sem fins lucrativos, que exercem funções constitucionais do Estado, como educação, cultura, saúde e assistência social, com a participação do mercado e da sociedade na forma de empresas com fins lucrativos e pessoas físicas.
As entidades do terceiro setor são organizadas na forma de Associações ou de Fundações de direito privado sem fins lucrativos ou econômicos, ou seja, não distribuem resultados. Quando é apurado superávit, este é aplicado em sua atividade fim.
São comumente denominadas Organizações Não Governamentais – ONGS, por terem autonomia de gestão e não serem administradas pelo Estado. Sua articulação com o Estado se dá através de convênios e parcerias e da concessão de imunidades e isenções de tributos.
Ser uma organização não governamental não quer dizer, necessariamente, agir contra o governo através de movimentos sociais. Pelo contrário, os governos buscam, cada vez mais, parcerias com estas entidades com o objetivo de fomentar as atividades por ela desenvolvidas (OLAK, 2006)
De acordo com MACHADO (2007) o Banco Mundial e outras instituições multilaterais, entendem que o Terceiro Setor tem um importante papel executor de políticas sociais, articulado e complementar à ação do Estado. Estas instituições são eficientes, baratas, não desperdiçam recursos com burocracia e apresentam resultados muito mais significativos que a ação do Estado.
Para o professor Lopes de Sá a contabilidade estuda os fenômenos patrimoniais das células sociais, ou seja, de quaisquer entidades, pessoas físicas ou jurídicas, com finalidade econômica ou não.
Contabilidade é uma ciência que estuda os fenômenos patrimoniais das células sociais, mas a informação sobre os referidos fenômenos também faz parte da tarefa do contabilista [...]. Como um bom trabalho contábil depende de um bom Plano de Contas que enseje imagem fiel da riqueza, quer em sua estática ou por efeito de sua dinâmica [...]. A diferença dos modelos está entre o social e o capitalismo canibal, entre esses dois assume características deveras marcante (SÁ, 2004)
Independentemente do setor onde atua e do estágio de desenvolvimento de uma organização, o planejamento estratégico é uma indispensável ferramenta de gestão, que vai definir principalmente a sua missão (razão de ser) e sua visão (posição desejada no futuro).
2 – O TERCEIRO SETOR NO BRASIL
O Terceiro Setor já existia no Brasil desde a época colonial, apenas com outra conotação, restrita ao paternalismo e assistencialismo praticado especialmente pelas entidades religiosas preocupadas com o bem-estar dos cidadãos.
Nas últimas décadas o Terceiro Setor vem se expandindo em todo o mundo, inclusive no Brasil. Começa a surgir um número considerável de organizações cujos idealizadores buscam suprir as deficiências do Estado na garantia dos direitos sociais dos cidadãos.
Em 2005 foi desenvolvida pesquisa sobre as Fundações e Associações privadas sem fins lucrativos no Brasil, a partir da parceria entre IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Instituto de Pesquisa Econômicas e Aplicadas - IPEA, a Associação Brasileira de ONGs – ABONG e o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas – GIFE.
Com baseem dados do Cadastrode Empresas – CEMPRE de2005, apesquisa demonstra que existiam em 2005 no Brasil 338 mil organizações sem fins lucrativos, que empregavam 1,7 milhão de pessoas em todo o país.
A sua participação oficial de 1,4% na formação do produto interno bruto - PIB brasileiro significa que movimenta cerca de 32 bilhões de reais, valor bastante superior às despesas com pessoal no Estado de São Paulo, que somam aproximadamente 25 bilhões de reais. É um valor considerável já que São Paulo administra o maior orçamento entre os Estados brasileiros sendo superado somente pelo orçamento da União, em que as despesas com pessoal atingem o valor de 44 bilhões de reais (MEREGE, 2007).
Em virtude da atuação ineficiente do Estado, em especial na área social, o terceiro setor vem crescendo e se expandindo em várias áreas, objetivando atender a demanda por serviços sociais, requisitados por uma quantidade expressiva da população menos favorecida, em vários sentidos, de que o Estado e os agentes econômicos não têm interesses ou não são capazes de provê-la. Seu crescimento vem em virtude, também, de práticas cada vez mais efetivas de políticas neoliberais do capitalismo global, produzindo instabilidade econômica, política e social, principalmente nos países do terceiro mundo. (GONÇALVES, 2002)
3 - O QUE É PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO
O conceito de estratégia tem origem nos cenários de guerra. As constantes lutas e batalhas ao longo dos séculos fizeram com que os militares começassem a pensar antes de agir. A condução das guerras passou a ser planejada com antecipação (CHIAVENATO, 2003).
A estratégia nas organizações pode ser definida como a determinação das metas a serem alcançadas, bem como o planejamento do caminho e dos recursos que serão necessários para que estas metas sejam atingidas.
Já o planejamento estratégico é um processo contínuo de, sistematicamente e com o maior conhecimento possível do futuro, tomar decisões atuais que envolvam riscos, organizar sistematicamente as atividades necessárias à execução destas decisões e, através de um diagnóstico organizado e sistemático, medir o resultado dessas decisões em confronto com as expectativas (P. DRUKER, 1984).
Podemos inferir que o planejamento estratégico busca a definição de uma missão institucional, a posição que se quer chegar ao cumprir esta missão, o mapeamento dos riscos e oportunidades da instituição e a elaboração de planos de ação que possibilitem o cumprimento do planejado. Em síntese, o planejamento estratégico consiste em pensar, planejar, antes de agir.
Para DRUKER (1994) as instituições sem fins lucrativos têm algo em comum: são agentes de mudança humana. Seu produto é um paciente curado, uma criança que aprende, um jovem que se transforma em um adulto com respeito próprio; isto é, toda uma vida transformada.
A subjetividade do resultado buscado pelas organizações do Terceiro Setor nos mostra a complexidade do processo de elaboração do planejamento estratégico nessas organizações. Enquanto no Segundo Setor (as empresas com fins lucrativos) as organizações almejam resultados econômicos e posições no mercado, no Terceiro Setor elas almejam a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos e a sua inclusão social.
O planejamento estratégico no terceiro setor deve buscar o alcance dos objetivos sociais a que a organização se propõe. O fato de ter sustentabilidade econômica e financeira não indica que estes objetivos foram alcançados. O desafio do planejamento estratégico no Terceiro Setor está em buscar o equilíbrio entre o sucesso no desenvolvimento de seus projetos sociais e a sustentabilidade destes.
3.1 - Definição da Missão
O primeiro passo para a elaboração do planejamento estratégico é a definição da missão da organização. Trata-se do propósito, da sua razão de existência. Essa definição deve ser elaborada com a participação do maior número possível de colaboradores, de forma clara, objetiva e identificar com precisão o foco estratégico institucional.
A definição da missão deve responder a três perguntas: qual a razão da existência, a área de atuação e o público a ser atingido pela organização.
Definir a missão de uma organização é difícil, doloroso e arriscado. Mas é só assim que se consegue estabelecer políticas, desenvolver estratégias, concentrar recursos e começar a trabalhar. É só assim que uma empresa pode ser administrada de forma estratégica, visando a um desempenho ótimo (P. DRUKER, 1984).
Como exemplo de missão, podemos citar a do Instituto Mário Penna, entidade atuante na área de saúde, em Minas Gerais:
Promover a saúde através da assistência, do ensino e da pesquisa, com ênfase em oncologia, visando à melhoria da qualidade de vida, com responsabilidade social e filantrópica. (INSTITUTO MÁRIO PENNA, 2005)
A organização definiu sua missão de forma clara e objetiva, esclarecendo sua razão de existência, seu público alvo e área de atuação.
3.2 - Definição da Visão
Considerando sua missão, a organização deve conceber uma visão que retrate um estado futuro desejado capaz de responder fundamentalmente a uma questão: aonde queremos chegar ao longo deste nosso caminho cumprindo a missão?
Para projetar onde quer se chegar, o gestor da organização deve saber inicialmente onde ela está no momento. A contabilidade será sem dúvida uma importante ferramenta para esclarecer a atual situação da organização e se o ponto aonde quer se chegar é viável do ponto de vista econômico e financeiro.
A visão deve refletir, de forma clara, qual a posição almejada pela organização ao longo do tempo. O tempo de alcance da visão vai depender da organização e do ponto aonde quer se chegar, podendo ser de curto, médio ou longo prazo.
Independente do tempo previsto para o alcance da visão, o mais importante é que esta seja elaborada em consonância com a missão da organização e pautada por planos de ação, diagnósticos, análise de riscos e oportunidades, planejamento e controle.
Citando novamente o Instituto Mário Penna, a organização definiu sua visão como ser referência nacional em oncologia até2011. Adefinição foi feita de forma objetiva e em sintonia com a sua missão.
4 - O PAPEL DO CONTADOR
O Contador é definido pela IFAC - International Federation of Accoutants como um profissional que identifica, mede, acumula, analisa, prepara, interpreta e relata informações (tanto financeiras quanto operacionais) para uso da administração de uma empresa, nas funções de planejamento, avaliação e controle de suas atividades e para assegurar o uso apropriado e a responsabilidade abrangente de seus recursos.
A definição da IFAC, entidade que busca o desenvolvimento global da profissão contábil, atuando em mais de 120 países, evidencia a importância do Contador no processo de formulação do planejamento estratégico organizacional.
A contabilidade surgiu da necessidade do homem ter informações a respeito dos seus negócios. Tem um potencial enorme de fornecer informações, pois todos os fatos que são passíveis de mensuração monetária são registrados nas demonstrações e relatórios contábeis.
Como gerente de informações, os relatórios, análises, projeções e informações fornecidas pelo contador vão subsidiar um planejamento consistente e consequentemente com maiores possibilidades de êxito.
Muitos projetos desenvolvidos pelas organizações do terceiro setor não alcançam seus objetivos propostos em função da falta de planejamento e controle de seus custos e pela discrepância entre o fluxo de caixa previsto e o realizado. O Contador é um profissional preparado para projetar os custos e assessorar o gestor no estudo da viabilidade dos projetos da organização.
5 - O CONTADOR E O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO
O fato de serem entidades sem fins lucrativos e com finalidades sociais, muitas vezes leva as lideranças das organizações do terceiro setor a esquecerem que embora não seja um fim, os superávits são um meio de alcançarem seus objetivos. Não se trata de colocar a questão do lucro como prioritária, mas de refletir se a missão a que se propõe tem sustentabilidade e se a visão a ser atingida tem viabilidade econômica e financeira.
Na elaboração do Planejamento Estratégico, além de definir a missão, o público-alvo, a área de atuação, é imprescindível elaborar um planejamento econômico e financeiro que verifique se o que foi planejado é viável.
Segundo IUDÍCIBUS (1997), a contabilidade pode ser conceituada como sendo o método de identificar, mensurar e comunicar informação econômica, financeira, física e social, a fim de permitir decisões e julgamentos adequados por parte dos usuários da informação. O autor deixa clara a importância da contabilidade no processo de planejamento.
6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
A informação é a mais poderosa ferramenta de gestão a disposição dos dirigentes e dos responsáveis pela elaboração do planejamento estratégico nas organizações.
Através das informações extraídas das demonstrações contábeis, como Balanço Patrimonial, Demonstração dos Resultados do Exercício, Demonstração do Valor Adicionado e Demonstração dos Fluxos de Caixa, podemos mensurar o desempenho da organização e projetar desempenhos futuros, traçando um planejamento estratégico adequado utilizando estas informações como ferramentas.
O planejamento para o futuro não pode se balizar somente pelo ocorrido no passado, é necessário também incluir variáveis como mercado, concorrência, tecnologia, desempenho da economia, dentre outras. O conhecimento e projeção destas variáveis e seus eventuais impactos no planejamento é imprescindível e o contador vai contribuir na avaliação destas variáveis.
No caso específico do Terceiro Setor, onde as metas das organizações são em síntese a garantiade direitos sociais, não podemos nos ater somente à nobreza da intenção do gestor. É necessária uma assessoria contábil. Ela que vai avaliar se o sonho pode se tornar realidade.
Dentro deste contexto podemos inferir que o contador é um ator importante no processo de inclusão social, um dos maiores desafios que vivemos na atualidade em todo o mundo.
7 - REFERÊNCIAS
ABONG. A Rica Expressão do Associativismo Brasileiro. 2008. Disponível em <http://www.abong.org.br>. Acessado em 30/10/2009.
BARBOSA, Alcedino. Manual de Procedimentos Contábeis para Fundações e Entidades de Interesse Social. 1. ed. Brasília, Conselho Federal de Contabilidade, 2003.
CHIAVENATO, Idalberto. Planejamento Estratégico – Fundamentos e Aplicações. Rio de Janeiro, Editora Campus, 2003.
DRUCKER, Peter F. Introdução a Administração. São Paulo, Editora Pioneira, 1984.
DRUCKER, Peter F. Administração de Organizações sem Fins Lucrativos. São Paulo, Editora Pioneira, 1994.
GONÇALVES, H. S. O Estado o Terceiro Setor e o Mercado: Uma Tríade Completa. Disponível em <http://www.rits.org.br>. Acesso em 30/10/2009.
IUDÍCIBUS, Sérgio de. Teoria da Contabilidade. São Paulo, Editora Atlas, 1997.
INSTITUTO MÁRIO PENNA. Filosofia do Instituto Mário Penna. 2005. Disponível em <http://www.mariopenna.org.br/institucional/missao.php >. Acessado em 30/10/2009.
MACHADO, Maria Rejane Bitencourt. Entidades Beneficentes de Assistência Social, Contabilidade, Obrigações Acessórias e Principais. Curitiba, Editoria Juruá, 2007.
MEREGE, Luiz Carlos. Terceiro Setor: Finalmente no PIB. 2007. Disponível em <http://www.gife.org.br/redegifeonline_noticias.php>. Acessado em 30/10/2009.
OLAK, Paulo Arnaldo. Contabilidade para Entidades sem Fins Lucrativos (Terceiro Setor). São Paulo, Editora Atlas, 2006.
SÁ, Antônio Lopes de, Ana Maria de. Planos de Contas. São Paulo, Editora Atlas, 2004.