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O pacotinho de Dilma

Com medidas requentadas e de curto prazo, a presidenta Dilma Rousseff tenta reconquistar o apoio dos empresários. Não será fácil

23/06/2014 08:45

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O pacotinho de Dilma

Aliviados no curto prazo e preocupados com o futuro. Esse era o sentimento dos representantes da indústria brasileira na tarde da quarta-feira 18, logo após o anúncio do novo pacote de estímulo ao setor produtivo feito pela presidenta Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Os empresários consideram que as medidas anunciadas são tímidas e não serão suficientes para recuperar a competitividade da indústria nacional, mas elogiam a rapidez com que o governo concordou com boa parte dos pedidos pontuais, feitos há menos de um mês, em uma reunião semelhante.

“Todo ano poderia ser eleitoral”, disse Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), um dos 40 executivos presentes ao evento. Desde que passou a ser criticado por interferir demasiadamente nos assuntos de mercado, o governo vem se esforçando para reconquistar a confiança dos homens de negócios, com a esperança de garantir os investimentos necessários para reverter a trajetória de desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB).

Afinal de contas, há um consenso, inclusive entre os integrantes da equipe econômica, de que o País não tem mais fôlego para crescer apenas puxado pelo consumo das famílias. O afago ao setor produtivo é uma das últimas cartadas de Dilma antes das eleições, em outubro. A prioridade é eliminar uma antiga reclamação sobre a falta de diálogo. “O aspecto mais positivo foi a presidenta ter determinado que os ministérios se encontrassem com os setores para verificar o que precisa ser feito especificamente em cada um deles”, afirma Fernando Figueiredo, presidente da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim).

Com as medidas apresentadas a quatro meses das eleições, Dilma buscou atender pleitos antigos, muitos deles já contemplados em programas anteriores, e acabou dando munição às acusações de uso eleitoral, feitas pelas oposições. “É um pacote de desespero”, afirmou o presidenciável tucano Aécio Neves, em Pernambuco. O azedume com a gestão atual tem levado um número crescente de empresários a flertar com candidatos de oposição, que começam a apresentar suas alternativas econômicas para virar o jogo em 2015. Com espaço fiscal reduzido, o governo lançou mão de artilharia já testada.

Reeditou e tornou permanente o Reintegra, programa de estímulo aos exportadores, criado em 2011 e retirado ao final de 2013. No entanto, o mecanismo de compensação de impostos ficou mais tímido: passou de 3% do faturamento com as vendas ao Exterior para um intervalo de 0,1% a 3%. O pacote também prorrogou por mais um ano a linha de juros subsidiados para a compra de caminhões, ônibus e máquinas, reunida no Programa de Sustentação de Investimento (PSI), anunciado em 2009 para combater a crise e estendido em mais de três oportunidades desde então.

Fabricantes de caminhões, ônibus, máquinas e material de construção tiveram atendido o pedido de isenção perpétua do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que também já fora adotado e ampliado na esteira da crise de 2008. Outros dois programas já existentes foram alterados para oferecer condições mais favoráveis: o Refis, de parcelamento de dívidas tributárias, com o qual o governo espera arrecadar R$ 12 bilhões neste ano, montante que ajudará a Receita Federal a cumprir as metas de superávit primário. E o programa que dá preferência aos produtos nacionais nas compras governamentais, mesmo que eles custem 25% a mais do que os importados.

POLÍTICA INDUSTRIAL No encontro da semana passada, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, vendeu a ideia de que as medidas são parte de uma política industrial mais ampla, embora faltem soluções de longo prazo. “O que poderá criar uma política industrial é a intensificação do diálogo entre governo e empresários”, diz Walter Cover, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat). Irritada com as críticas, a presidenta Dilma rebateu à altura. “Se for assim, tudo é eleitoral neste País”, afirmou.

Segundo a presidenta, a lei é clara: não se tomam certas medidas após um determinado prazo. “Estamos perfeitamente no uso da legalidade”, disse. Dilma vem tentando melhorar sua relação com o setor privado. Aceitou neste ano, inclusive, um convite para ir a Davos participar do Fórum Econômico Mundial, onde dedicou boa parte do seu discurso aos elogios a investidores e ao setor produtivo. Ainda assim, não foi o suficiente para evitar uma deterioração nos níveis de confiança de empresários e consumidores.

Agravados pelo quadro de inflação elevada e baixo crescimento, os índices sofrem quedas seguidas e já estão em patamares só vistos na época da crise, em 2009. A consequência lógica é a menor disposição do setor privado de desengavetar seus projetos. “O empresário só investe se a perspectiva futura for positiva, com capacidade de pagar e lucrar”, diz Fernando Pimentel, superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). Segundo as principais entidades do setor produtivo, o pacotinho de bondades não resolve a perda de competitividade da indústria brasileira, que coleciona resultados tímidos diante da concorrência com importados, de entraves burocráticos e da falta de infraestrutura.

Além disso, veio com atraso. “Ela poderia ter tomado essas medidas antes”, afirma Carlos Pastoriza, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). “Mas antes tarde do que nunca.” Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, o sinal do governo de que novas medidas podem ser adotadas a qualquer momento ajuda a melhorar o ambiente, mas é preciso fazer mais. “O empresário nunca vai estar satisfeito”, reconhece Andrade.

De qualquer forma, o setor de informática já esfrega as mãos diante da possibilidade de prorrogação da chamada Lei do Bem, que desonera de PIS e Cofins os tablets e smartphones. “A presidenta me garantiu que a Lei do Bem será renovada”, diz Barbato, da Abinee. Se no setor produtivo paira um clima de “antes tarde do que nunca” e de “fôlego no curto prazo”, entre os analistas do mercado financeiro o consenso é de que o pacote não altera a trajetória de baixo crescimento prevista para este e o próximo ano.

“O governo insiste no mesmo antibiótico, que já não dá mais resultado”, afirma Felipe Salto, economista da Tendências Consultoria. Para algumas entidades, no entanto, as medidas de curto prazo representam um fôlego importante. “A não prorrogação do Reintegra no primeiro semestre de 2014 foi determinante para a queda de 3,6% nas exportações”, diz Heitor Klein, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).

MAIS UM PIBINHO? Também há críticas quanto à escolha de setores, em detrimento de uma política horizontal, que abranja toda a indústria. No último mês, o governo tornou permanente a desoneração da folha de pagamentos para 56 setores, com um custo de R$ 23,4 bilhões neste ano, ao Tesouro Nacional. “Todo país merecedor de crédito faz a sua política industrial”, diz Fabio Silveira, diretor da consultoria GO Associados. “Só que a nossa está difusa, não tem metas claras de alcance.”

Com exceção de 2010, quando uma avalanche de crédito ajudou nos resultados, a indústria sofreu com baixo crescimento nos últimos cinco anos, abaixo de 1,0%, em média, travando o avanço do PIB. As previsões de mercado para 2014 indicam uma alta de apenas 0,5% para a produção industrial e de 1,24% para o PIB, o que representa, na prática, mais um pibinho na conta de Dilma. Caso essa expectativa se confirme, o Brasil só crescerá mais do que Argentina e Venezuela na América do Sul, segundo o Banco Mundial.

Em 2013, a expansão foi de 2,5%. Com mais um pacotinho de bondades, a presidenta Dilma pode ter ganho a simpatia momentânea do empresariado, mas que ainda não se traduz em apoio à sua reeleição. Para que isso ocorra, falta aquilo que seria o mais importante para resgatar o País da inação econômica : a confiança do setor produtivo, traduzida em um volume significativo de investimentos, combustível indispensável para acionar o motor do crescimento.


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Bolsa para menores

Incentivo fiscal aos investidores pode ajudar pequenas e médias empresas a abrir capital

Por Natália Flach

Na segunda-feira 16, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, acompanhado por Luciano Coutinho, presidente do BNDES, e Leonardo Pereira, presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), anunciou na BM&FBovespa um pacote de medidas de estímulo à participação das pequenas e médias empresas no mercado de capitais. O ponto principal é a isenção fiscal para pessoas físicas que investirem em ações dessas empresas. “Com isso, esperamos trazer mais diversidade ao mercado”, disse Mantega. “Das 125 aberturas de capital dos últimos dez anos, apenas 11 foram realizadas por empresas de pequeno e médio porte.”

A decisão, que ainda precisa ser regulamentada por Medida Provisória, chegou depois de mais de dois anos de discussão entre a bolsa, profissionais do mercado, a CVM e a Fazenda. Acertar os ponteiros com a Receita Federal é fundamental. “Investir em empresas de menor porte é estruturalmente mais arriscado do que aplicar em companhias maiores, daí ser razoável conceder um tratamento tributário que incentive o investimento”, diz Maria Helena Santana, ex-presidente da CVM. A definição do que é uma empresa média para a Receita – companhias com faturamento de até R$ 500 milhões por ano e valor de mercado inferior a R$ 700 milhões – facilita o trabalho dos bancos para montar as ofertas públicas. Os exemplos de fora mostram que esses estímulos costumam funcionar.

Em 2012, os Estados Unidos promulgaram a lei Jumpstart Our Small Business Startups Act, conhecida por JOBS Act, que proporciona às empresas com receita anual de até US$ 1 bilhão benefícios para acessar o mercado de capitais. Não há isenção fiscal, mas os procedimentos e os demonstrativos contábeis são simplificados, o que reduz a burocracia e os custos. Por lá, esses benefícios já se transformaram em números. De acordo com Alex Ibrahim, diretor da Nyse Euronext para a América Latina, desde 2013 foram realizados 374 IPOs na Nyse. Desse total, 315, ou 84%, foram de pequenas e médias companhias, que levantaram US$ 46,2 bilhões.

Não foram apenas as americanas que aproveitaram as novas medidas: das 58 companhias não americanas listadas, 52 contaram com os benefícios do JOBS Act e captaram US$ 7,86 bilhões. Por aqui, não é possível esperar um sucesso tão grande no curto prazo. Os motivos são vários, a começar pelo desânimo no mercado: em 2014, descontando-se um follow-on da Oi, nenhuma empresa, grande ou pequena, se arriscou a tocar o sino no pregão da Bolsa comemorando sua abertura de capital. Outra dificuldade é a intenção do investidor em aplicar em ações de empresas menores. “Esse interesse ainda precisa ser comprovado na prática”, diz Maria Helena.

Fonte: Isto É

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