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Dinheiro pelo ralo

27/10/2006 00:00

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Dinheiro pelo ralo

Prezados leitores, durante vários artigos anteriores frisei que dois ralos sugavam parte considerável do dinheiro público. Com isso, pouco sobra para a nação e grande parte da população fica sem os bens e serviços que lhe são de direito, tais como: saúde, educação, segurança, estradas, entre outros que deveriam ser providos pelo Estado. Após ler alguns artigos em outros jornais, consegui obter números que explicitam vergonhosamente quão profundo e voraz é esse ralo que suga impiedosamente o dinheiro público.

Um dos ralos é o pagamentos dos juros da dívida pública (dívida esta do setor público representada pelas três esferas: municipal, estadual e federal para com o setor privado, sobretudo para com os bancos). De acordo com reportagem publicada no jornal Folha de São Paulo de 24 de outubro deste ano, de 1995 até 2005, o governo pagou cerca de R$ 1 trilhão e duzentos bilhões só de juros para o setor privado. Em 1995 o pagamento de juros comprometia 18,17% do orçamento. Em 2005 foi responsável por 42,45%, segundo a mesma reportagem. Lembro que em 1995, quando FHC assumiu o governo, a dívida pública girava em torno de R$ 55 bilhões. Hoje, apesar de tudo que foi pago em juros e amortizações, a dívida pública passa de R$ 1 trilhão. Isso mostra que o que se pagou de juros nesse período é maior do que o que se deve atualmente. Uma das grandes vilãs disso é a elevada taxa de juros praticada na economia brasileira. Hoje na casa dos 13,75% ao ano em termos nominais e com uma estimativa de 9,3% ao ano em termos reais (descontada a inflação) é a maior do mundo. Isso mesmo. É a maior do mundo!

Mas por que o Brasil pratica essa taxa absurda? Segundo o governo, a mesma é elevada para controlar a inflação. Quero lembrar ao mesmo que basta ele consultar alguns manuais introdutórios de economia e vai verificar que juros altos só combatem inflação de demanda (aquela inflação que acontece quando a procura por bens e serviços é superior à oferta dos mesmos). Atualmente, no Brasil, se a demanda agregada (de toda economia) estivesse elevada, não haveria tanto desemprego. A inflação que nós temos hoje é tipicamente uma inflação de custos, ou seja, a inflação ocorre por conta da elevação dos preços dos insumos e produtos essenciais ao funcionamento da economia como: energia elétrica, combustíveis, telefones fixo e móvel, gás de cozinha, alimentos industrializados etc. Juros altos não combatem esse tipo de inflação. Pelo contrário, com juros altos, o custo do crédito aumenta e os empresários se vêem obrigados a repassar parte desse custo para os preços finais, o que contribui para elevar ainda mais os preços e consequentemente para alimentar a própria inflação. Acredito que uma das explicações para juros tão elevados é para ampliar cada vez mais os lucros das instituições financeiras, sobretudo os bancos. Para corroborar tal assertiva basta verificar a elevação dos lucros dos mesmos nesses últimos anos, divulgadas periodicamente nos diversos meios de comunicação. Nesse aspecto, tanto FHC quanto Lula foram muito generosos com os bancos, em detrimento do setor produtivo da economia (aquele que realmente gera emprego e renda). Juros altos prejudicam o consumo das famílias, pois as prestações ficam cada vez mais caras (basta ver as propagandas dessas grandes lojas que parcelam em até 36 vezes cobrando juros elevadíssimos) e os investimentos das empresas. Sendo assim, o desemprego só aumenta. Para ilustrar como os juros no crédito são tão altos, outro dia vi uma propaganda que mostrava que uma mercadoria custava R$ 399,00 à vista ou em 18 parcelas de R$ 39,99. Ao fazer o cálculo, encontrei uma taxa de juros mensal de 8,65%, o que equivale a 170,62% ao ano.

O outro ralo a que costumo me referir é a corrupção. Segundo uma reportagem publicada no jornal O Globo de 04 de outubro deste ano, segundo estudo desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o País tem tido um gastos de R$ 234 bilhões por ano com a corrupção (obras superfaturadas, nepotismo etc.). Esse valor equivale a 32% dos impostos que o País arrecada. Como a arrecadação tributária vem crescendo ano a ano, pode-se dizer que a corrupção também cresce anualmente. Segundo a mesma reportagem, são desviados pela corrupção cerca de R$ 642,512 milhões por dia, o que corresponde a R$ 26,1 milhões que são roubados por hora da população honesta e trabalhadora e vai para o bolso dos gatunos do dinheiro público. O pior disso tudo é a impunidade que impera no País, que só contribui para tudo isso que foi apresentado.

Atualmente, a carga tributária do País é uma das maiores do mundo, cerca de 37% do PIB. Isso quer dizer que cada trabalhador despende seus serviços 145 dias do ano só para pagar impostos. Pior do que isso é observar que os serviços públicos ainda estão bastante deficientes. Como exemplo, a imprensa sempre noticia pessoas que morrem por falta de atendimento nos hospitais. O setor privado acha isso uma maravilha, pois encontra espaço para vender seus faraônicos planos de saúde. Lembro que a CPMF foi criada em 1993 (chamava-se inicialmente IPMF e já possuiu várias alíquotas, hoje é de 0,38% em cada operação financeira) para salvar a saúde pública do no Brasil. E saúde pública continua agonizando numa UTI. Para se ter uma idéia, um trabalhador que ganha cerca de R$ 500,00 por mês pagou aproximadamente R$ 296,40 só de CPMF de 1993 até hoje. E se pegarmos que ganha R$ 1.500,00 mensais pagou R$ 889,02 nesse mesmo período. Isso equivale a 59,28% de um salário mensal. Cada trabalhador trabalhou quase 18 dias de um mês só para pagar CPMF no referido período.

Enfim, é muito triste observar tudo isso que foi descrito. Corrupção e juros altos têm empobrecido cada vez mais o País. Com todo esse montante expropriado da nação, sobra muito pouco para as obras de infra-estrutura e para os gastos sociais no País.

Fernando Antônio Agra Santos é Doutor em Economia Aplicada e Professor Universitário em Juiz de Fora - MG ([email protected]).

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