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A Contabilidade nos Estaleiros de Construção Naval

13/08/2005 00:00:00

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A Contabilidade nos Estaleiros de Construção Naval

Os estaleiros são estabelecimentos de vital importância para o País, sem falar na economia dos Estados onde eles se estabelecem. Estados que têm uma tradição marítima consolidada - como Santa Catarina, Rio de Janeiro e outros - sabem o impulso que podem dar à economia. A renovação da Marinha Mercante, durante muitos anos negligenciada pelas pseudo- autoridades da Social-Demagogia, é uma necessidade para a sobrevivência da nossa navegação de longo curso, já que a de cabotagem praticamente não existe mais. Também a frota pesqueira sente a necessidade não apenas de uma renovação, mas de modernização. Essas circunstâncias trarão inúmeras e atrativas oportunidades, para as quais os empreendimentos precisarão estar preparados.

Desde o início do empreendimento a contabilidade deverá estar presente. Porém, essa presença não deve se limitar a registrar o que acontece; deve antes ajudar a fazer com que as coisas aconteçam. Isso inclui participar do planejamento da própria empresa, desde o estágio inicial até sua implantação e consolidação. Para isto será preciso não apenas uma visão de longo prazo, mas também uma visão abrangente sobre os sistemas que compõem um estaleiro. Montar e administrar um estaleiro com todos os seus sistemas, operando sob mil e uma situações, significa custos, e custos significam contabilidade, apuração, análise, demonstração, escolha de alternativas, orientação para uma gestão eficiente e lucrativa.

O planejamento do estaleiro supõe, de início, a definição dos tipos de embarcações que serão construídas. Poderão ser pequenos barcos de pesca de 12 a 15 m de comprimento; ou barcos maiores, com 100 a 120 toneladas; ou navios de 2.500, 4.000, 16.000, 40.000, 80.000 T ou até mais. Muitos dos superpetroleiros chegam a 500.000 T, enquanto outros navios já superaram essa marca. Esses tipos condicionarão as instalações e os recursos que serão necessários: diques secos, carreiras, oficinas, equipamentos de movimentação, etc.

Toda empresa precisa localizar e explorar seu nicho de mercado. Um estaleiro deve, de início, dissecar o mercado nos seus segmentos básicos, para poder determinar onde concentrar seus recursos e seus esforços.Um estaleiro japonês, por exemplo, com essa análise, conseguiu identificar os segmentos de clientes entre europeus de primeira e segunda classes, gregos de primeira classe e de menor porte, armadores de Hong Kong, empresas petrolíferas, países em desenvolvimento, e do leste europeu. A esses segmentos associou seus produtos principais, como petroleiro grande, médio e pequeno; transporte; contentor; roll-on/roll-off; cargueiro de alto, médio e baixo grau; graneleiro grande e pequeno e transporte de gases liquefeitos. Um estaleiro que se localize no Brasil poderá enfocar o mercado internacional ou apenas o mercado interno, segundo o seu porte e sua capacidade técnica. Aí terá um leque composto por pequenos ou médios pesqueiros, barcas para transporte de passageiros (tipo Cantareira), navios ribeirinhos para operação na Amazônia e nas hidrovias, lanchas, etc.

Supondo que sejam pequenos barcos de pesca, uma ou duas carreiras, com 16 a 20 m de comprimento, poderão ser suficientes. Se forem barcos maiores, com 100 a 120 T, poderá ser uma carreira com aproximadamente 70 m de comprimento, 6,50 de boca, declividade de 6%, 4 cabrestantes/guinchos elétricos. Também poderá ser uma carreira com 116,00 m de comprimento, 25,00 m de boca, 6% de declividade, 4 cabrestantes/guinchos elétricos.

Para navios até 2.500 DWT será necessário um dique seco com o comprimento utilizável de 89,00 a 90,00 m, altura de 8,50 m, largura do fundo de 9,15 m, 4 cabrestantes/guinchos elétricos. Para navios até 16.000 DWT, o dique terá 166,00 m de comprimento utilizável, 11,20 m de altura, 19,00 m de largura no fundo, 8 cabrestantes/guinchos elétricos. Para navios com até 40.000 DWT poderemos ter um dique com 225,00 m de comprimento, 25,00 m de boca, 14 cabrestantes/guinchos elétricos e 4 cabrestantes/guinchos manuais. Já navios até 80.000 DWT sugerem um dique seco com comprimento utilizável de 255,00 m, largura no fundo de 36,00 m, altura de 15,50 m, 14 cabrestantes/guinchos elétricos e 4 cabrestantes/guinchos manuais.

Os sistemas necessários nas carreiras e diques secos incluem incêndio, água doce, fornecimento de oxiacetileno, ar comprimido e energia elétrica em 110V, 220V e 440V. Também são necessárias oficinas de caldeiraria, fundição, eletricidade, motores e refrigeração, solda (MIG/TIG), eletrônica, instrumentação, hidráulica, e madeira e velame. Essas oficinas devem estar aparelhadas para executar a fabricação de estruturas navais para todos os tipos de navios de superfície e submarinos; laminação de estruturas de embarcações e peças em plástico reforçado com fibra de vidro e revestimentos anti-corrosivos com resinas plásticas; caldeiraria de ferro e cobre; curvamento de tubos a frio e a quente; calandragem; solda de brazagem em ligas não ferrosas; solda em aços especiais com controle das variáveis de soldagem; usinagem de grande porte; usinagem de superfície plana em peças metálicas; usinagem e ajustagem de precisão; mandrilhamento; fresagem; tornearia; fabricação de peças para equipamentos elétricos; reparo, ajustamento, alinhamento e testes em motores diesel, elétricos, geradores, compressores e redutores; balanceamento dos componentes rotativos de máquinas elétricas e motores de propulsão; instalações elétricas; isolamento térmico; balanceamento dinâmico e estático de peças até 12 toneladas (ou mais); e uma infinidade de trabalhos requeridos na construção de um navio.
Os equipamentos necessários a tão variados serviços incluirão calandras para chapas de 1 ¼"; guilhotinas para chapas de ½" viradeiras para chapas de ½"; tornos horizontais (inclusive com barramento até 10 metros de comprimento), verticais e limador; furadeiras universais e verticais; plaina; fresadoras universais e verticais; mandrilhadoras universais e verticais; máquinas para cortar tubos; máquinas de metalização para solda a arco submerso; prensa hidráulica; lixadeiras e serras industriais; equipamentos diversos para solda MIG/TIG e outros processos e muitos outros.

Instalações e aparelhos adequados são requeridos para a realização de testes hidráulicos; metrologia para pequenas tolerâncias; testes eletropneumáticos; ensaios não destrutivos (ultra-som, líquido penetrante e outros); medição de espessura de película de tinta (microteste); medição de umidade; explosímetro (gas free); aferição, testes e calibragem de manômetros e outros instrumentos; testes em bombas injetoras; bancada de testes para válvulas até 300 psi (ou mais), e, enfim, todos os testes necessários à atividade.

Considerando os diques e carreiras que existirão no projeto (na hipótese de estaleiro já de um certo porte), equipamentos de movimentação de materiais serão extremamente necessários, incluindo pórticos, guinchos, cabrestantes, etc. Podemos citar guindaste elétrico com lança até 26,50 m, capacidade de 30 T; guindaste elétrico com lança até 21,00 m, capacidade de 10 T; guindaste elétrico com lança até 21,00 m, capacidade de 30 T; guindaste elétrico com lança até 25,00 m, capacidade de 10 T; guindaste elétrico com lança até 23,00 m, capacidade de 15 T; guindaste elétrico com lança até 40,00 m, capacidade de 6 T; guindaste elétrico com lança até 40,00 m, capacidade de 11 T; guindaste hidráulico com capacidade, a 3,00 m do centro de giro da carga, de 12 a 13 T; guindaste hidráulico com capacidade, a 3,00 m do centro de giro da carga, de 20 T; guindaste hidráulico com capacidade, com lança de 12,20 metros a 3,30 m do centro de giro da carga, de 68 T.

O Departamento Técnico assume importância vital, como cérebro do estaleiro, devendo executar projetos e detalhamento nas áreas de arquitetura e estrutura naval; propulsão, refrigeração, hidráulica e mecânica; eletricidade, eletrônica e instrumentação; e arranjo geral e acabamento. Com as modernas tecnologias de projeto, será preciso equipar o Departamento com softwares tipo CAD/CAM, ploters e tudo mais que as necessidades da moderna engenharia naval indicarem. Não significa que métodos tradicionais, como a velha prancheta, sejam desprezados: poderão ter muita valia principalmente em pequenos trabalhos, por exemplo.

Tudo que até aqui foi descrito representa a preocupação em organizar e implantar o estaleiro em bases técnicas sólidas o suficiente para se tornar um empreendimento bem sucedido. Há, porém, uma outra preocupação, que poderá significar a vida ou a morte do empreendimento. Em se tratando de um pequeno estaleiro, com uma ou duas pequenas carreiras, a organização será relativamente simples, como a de qualquer pequena indústria. Porém, em projeto de maior envergadura, a contabilidade assume importância tão relevante como a do Departamento Técnico. Sua ação terá início desde os momentos iniciais, ainda na constituição da empresa, continuará durante o processo de implantação, acompanhando e controlando os investimentos efetuados, e será muito mais presente durante as operações normais. Pela grandeza do que foi descrito, fica evidente a necessidade de acompanhar, registrar, controlar e relatar os custos. E tudo, em um estaleiro, gira em torno de custos. Os investimentos são valores a serem imobilizados, importando, depois, na depreciação; despesas de instalação são valores a serem amortizados. O Departamento Técnico elabora projetos, que são custos a apropriar; as oficinas utilizam e transformam o aço, o que significa custos imputados às encomendas em processo; os equipamentos de movimentação prestam serviços às oficinas, aos diques e às carreiras, o que também são custos a apropriar; os demais departamentos - como almoxarifado, transportes, utilidades - também terão seus custos apropriados.

A contabilização de todas essas transações, por si só, já é uma tarefa gigantesca. Porém, a contabilidade é uma ciência que fornece meios para tudo que se queira fazer, mantendo os preceitos técnicos. Quando se trata de um pequeno estaleiro, a contabilização não representará nenhum problema maior. Mas, em se tratando de empreendimento de um certo porte, incluir todos os custos em apenas algumas poucas contas seria um erro primário Neste caso, a Contabilidade poderá, para efeito de apropriação e controle dos custos, dividir cada encomenda (cada navio) nas suas partes principais, como quilha, casco, superestrutura, máquinas e motores, convés e outros. Cada parte poderá ser dividida em seus principais elementos, como materiais, mão-de-obra e gastos gerais de fabricação. Estes poderão ser subdivididos conforme o tipo de componente utilizado: mão-de-obra direta, indireta, tipo de material, contas incluídas nos gastos gerais, etc. As contas analíticas dos componentes utilizados deverão sempre ser iguais à conta sintética de cada elemento. As contas sintéticas de todos os elementos serão iguais à conta sintética de cada parte. A soma de todas as contas sintéticas (de todas as partes) será igual ao valor acumulado,. até determinado momento.

Ao final, quando uma encomenda - um navio - for concluída, a Contabilidade deverá ter todo o apanhado, de modo a informar o custo de cada componente, de cada elemento, de cada parte, e o custo global. Daí poderá comparar com o orçamento e suas revisões, inclusive como subsídios para o planejamento do fluxo financeiro de futuros contratos. É comum que, na contratação de um navio, sejam fixados os percentuais, do valor total, que o armador (contratante) deverá desembolsar. Em geral esses desembolsos costumam ocorrer na assinatura do contrato de construção do navio, na encomenda do aço, quando 40% do aço estiverem no estaleiro, na batida da quilha, com a evolução do casco, no lançamento do navio, etc. Esses desembolsos são importantes na medida em que o fluxo financeiro é que permite ao estaleiro pagar seus fornecedores, seus operários, os impostos, e demais compromissos. Encerrada a encomenda, recebidos todos os valores e quitados todos os compromissos, ficará evidente se o estaleiro estará no rumo da lucratividade ou se necessitará de alguma correção de rota. Ajudar a encontrar e manter esses rumos será função da contabilidade. Mas, para o bem do empreendimento, que seja uma contabilidade bem feita!

Sobre o autor: Carlos José Pedrosa é catarinense de Biguaçu, radicado em Alagoas. Tem formação em contabilidade, sendo um profissional autônomo oriundo da iniciativa privada. Com mais de 40 anos de atuação em banco, na indústria siderúrgica, metalúrgica, mecânica e de laticínios, no comércio, no setor jornalístico, em estatal de abastecimento e no setor público - www.cjpedrosa.webcontabil.com.br.

Carlos José Pedrosa
Maceió, AL
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