No cenário jurídico contemporâneo, é frequente o debate sobre a modulação de decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) visando mitigar impactos aos cofres públicos quando as questões são decididas em favor dos contribuintes.
Essa prática, embora necessária em alguns casos, suscita dificuldades conceituais e práticas à teoria do Direito.
As consequências não podem ser ignoradas no momento do julgamento. A motivação deve levar em consideração os resultados práticos da decisão, conforme determina o art. 20 da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (LINDB).
Na medida em que os julgadores passam a utilizar das consequências como elemento de solução dos casos, surgem questionamentos sobre a legitimidade e a eficácia dessas decisões.
De fato, é preciso uma preocupação com a repercussão das referidas decisões proferidas pelos tribunais. As decisões judiciais não são isoladas e causam consequências inevitáveis no meio social.
É esperado que as decisões surtam efeitos positivos e não negativos. A segurança jurídica pressupõe previsibilidade das decisões.
Na tentativa de trazer uma reflexão sobre a extensão das consequências que os tribunais superiores devem considerar, deve-se ter em mente que uma decisão que considere as consequências não pode contrariar qualquer norma jurídica existente, sob pena de não prosperar devido à invalidade jurídica.
Assim, é fundamental que as decisões sejam coerentes e devidamente fundamentadas, para que os contribuintes possam confiar no sistema jurídico e se guiar por ele.
No campo tributário, as decisões do STF e do STJ acarretam em implicações para os contribuintes. Referidas decisões podem alterar significativamente a carga tributária de empresas e cidadãos, impactando diretamente a economia do país.
Quando o ente público discute uma tese tributária, realiza uma projeção do risco fiscal no caso de eventual perda, tendo conhecimento prévio sobre as eventuais implicações econômicas e fiscais.
No entanto, é cada vez mais comum identificar manifestações da Fazenda Pública argumentando sobre o impacto econômico/fiscal que uma decisão tributária pode ter, caso determinado assunto seja julgado de forma favorável ao contribuinte.
Há também uma tendência do STJ e do STF em modular os efeitos das teses tributárias nos casos envolvendo grandes repercussões econômicas, visando preservar os cofres públicos. Isso levanta alguns questionamentos para reflexão:
- Se o ente público já possui conhecimento e ajusta o orçamento levando em consideração todos os potenciais riscos envolvidos, qual a razão dos pedidos de modulação por parte da Fazenda Pública?
- Qual motivo leva o STJ e o STF a decidirem por restringir os efeitos das decisões em matéria tributária quando reconhecem a ilegalidade ou inconstitucionalidade de determinada cobrança tributária, mesmo considerando que o impacto econômico já deveria estar previsto no orçamento público?
- Como ficam direitos dos contribuintes diante da incerteza de ganhar uma decisão e, ao mesmo tempo, não poderem desfrutar plenamente dos benefícios devido à possibilidade de modulação ou restrição dos efeitos das decisões?
É preciso muita cautela por parte dos tribunais superiores ao considerar o impacto econômico e financeiro como fundamento para restringir os efeitos das decisões. Isso ocorre porque, do outro lado da balança, estão diversos direitos fundamentais dos contribuintes que não podem ser negligenciados.
A imoralidade e a ineficiência do ente público são fatores determinantes nesse cenário, pois poderiam modificar a legislação a qualquer momento, porém optam por arrecadar na expectativa de que, mesmo que a cobrança seja ilegal/inconstitucional, ocorra uma modulação restringindo os efeitos da decisão.
Diante da já elevada carga tributária, não é razoável que os contribuintes sejam ainda mais sobrecarregados e tenham seus direitos limitados.
Com isso, é necessário considerar que o desequilíbrio econômico resultante de uma decisão justa e coerente é, na verdade, um reflexo da ineficiência legislativa e executiva na criação e regulamentação da legislação tributária.
Os tribunais superiores desempenham um papel importante e devem decidir com base na realidade do país. No entanto, não devem se concentrar apenas no impacto econômico/fiscal.
É necessário razoabilidade e proporcionalidade ao decidir com base nas consequências. As decisões judiciais devem equilibrar a necessidade de estabilidade fiscal com os direitos dos contribuintes. O impacto aos cofres públicos não pode ser usado como justificativa para a tomada de decisões judiciais que vão contra os princípios constantes na Constituição Federal.
Portanto, embora a situação econômica do país seja um fator relevante, ela não deve ser a única consideração nas decisões judiciais tributárias. A justiça, a equidade e a legalidade devem prevalecer.