O parágrafo décimo do artigo 517 da Lei Complementar 214/25 altera a Lei Complementar 123/06 de forma a permitir que contribuintes do regime do Simples Nacional sejam contribuintes de IBS e CBS. Acredito que foi uma gafe dos legisladores e principalmente dos personagens dos grupos de trabalho da reforma tributária. Sim, uma gafe. Um equívoco que terá consequências da maneira que está.
Acredito na melhor intenção dos legisladores. Exatamente por isso menciono gafe. Os contribuintes do regime do Simples Nacional têm uma situação em relação ao ICMS. Não geram ou conforme a situação (e ente federado) gera um crédito diminuto ao adquirente do regime geral. Esta situação é o que faz alguns contribuintes migrarem de regime: a geração de créditos “normais” ao destinatário. Em outras palavras, alguns clientes dos empreendedores enquadrados no regime do Simples preferem comprar de contribuintes que estão fora deste regime pelo aproveitamento de crédito de compras de insumos e bens para revenda, eventualmente serviços também.
O que foi colocado na Lei Complementar 214, em alteração à Lei 123/06, é que o contribuinte enquadrado no regime do Simples poderá apurar os tributos IBS e CBS apartado do recolhimento geral do Simples. É uma opção. É melhor opções do que imposições. Sempre será melhor. Mas neste caso, a opção que será temporária e renovável a cada semestre iniciado em janeiro e julho de cada exercício fiscal, terá como alvo o contribuinte do Simples pressionado pelos seus clientes.
A pressão se dará pelas empresas que inicialmente desejarão créditos tributários de seus fornecedores. Todavia, a partir da reforma tributária, os preços estarão líquidos de tributos. Ou seja, para que um cliente de uma empresa do Regime do Simples possa ter crédito terá que pagar o tributo deste fornecedor. Isso entre empresas extra Regime do Simples também acontecerá. Os clientes deverão comprar os créditos das operações já que os preços estarão líquidos – bem diferente do que ocorre hoje!
Pois bem, se uma empresa vende bens para uma grande empresa, e esta grande empresa é significativa na carteira do fornecedor (no Regime do Simples) provavelmente exigirá a migração de regime do seu fornecedor. Porém, esta grande empresa não seria, no meu exemplo, o único cliente. Se esta empresa fornecedora de bens tiver outros clientes no regime do Simples Nacional haverá um problema financeiro a ser ultrapassado: os clientes que estão no Simples Nacional não tomarão créditos. Assim, o valor a ser pago a maior (produtos acrescidos de IBS/CBS) será jogado no lixo já que contribuintes do Simples – sem apuração de CBS e IBS apartado – não poderão se creditar do valor pago na operação de aquisição.
Vejamos um exemplo. Uma empresa W e uma empresa B compram desde a muito tempo bens de uma empresa C. A empresa W está no regime geral de IBS e CBS. Já a empresa B está no Simples Nacional. A empresa W pede à empresa C (fornecedora) que migre para o regime de apuração de IBS/CBS para que, mesmo pagando pelos tributos, possa tomar créditos. A empresa B pede à empresa C que não migre de regime, pois ela não tomaria créditos, mas teria que pagá-los nas operações, se a empresa C migrar de regime.
Usando valores como exemplo: o valor do bem da empresa C é R$ 100. A empresa W prefere pagar R$ 128 (R$100 + R$28 de IBS/CBS) e tomar créditos e exige a migração de regime da empresa C (fornecedora) para manter as operações. Já a empresa B não quer pagar os mesmos R$ 128,00, pois os vinte e oito reais que serão gastos não terão contrapartida creditória.
Esta lógica aplicada ao cenário atual, com o ICMS faz muito sentido. No cenário futuro da Reforma Tributária não será fácil a tomada de decisão para os contribuintes do Simples Nacional.
Eu sou consultor e professor Mauro Negruni. Sócio fundador de uma consultoria focada em processos e sistemas de gestão. Atuo na integração de informações fiscais para gerar melhorias de processos e qualificação no âmbito das obrigações acessórias e tributação. Me encontre no LinkedIn e Instagram por @mauronegruni.