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CONTABILIDADE DIGITAL

Tokenização de ativos: desafios contábeis e o impacto no reconhecimento e mensuração dos novos ativos digitais

Entenda como classificar, mensurar e divulgar tokens à luz das normas internacionais e dos desafios normativos ainda existentes.

01/05/2025 13:30

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Tokenização de ativos: impactos contábeis e desafios

Tokenização de ativos: desafios contábeis e o impacto no reconhecimento e mensuração dos novos ativos digitais

A digitalização dos mercados trouxe uma inovação disruptiva: a tokenização de ativos. Essa prática permite representar digitalmente direitos sobre bens físicos, intangíveis ou financeiros por meio de tokens registrados em blockchain. No entanto, à medida que essa tecnologia avança, surgem lacunas contábeis e fiscais que desafiam profissionais da área. 

Tokens são representações digitais de ativos ou direitos, criptografadas e registradas em redes de blockchain. A classificação dos tokens (pagamento, utilidade e referenciados a ativos) influencia diretamente na forma como devem ser registrados contábil e juridicamente.

Tokens referenciados a ativos, por exemplo, podem representar frações de imóveis, recebíveis, títulos de crédito ou commodities. Essa característica traz implicações relevantes para o reconhecimento contábil, uma vez que a essência econômica deve nortear a classificação patrimonial.

Tratamento contábil e classificação dos tokens

A classificação contábil dos tokens e criptoativos, como os bitcoins e tokens de ativos, ainda é um desafio, dada a ausência de normas específicas emitidas pelo IASB ou pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC)​. Contudo, a doutrina e a prática vêm orientando a contabilização com base nos princípios já estabelecidos para ativos existentes.

As criptomoedas, e por consequência os tokens, são ativos digitais intangíveis registrados via infraestrutura blockchain, proporcionando benefícios como segurança, autenticidade e eficiência nas transações.

Ausência de regulamentação específica e consulta às normas existentes

Por não existirem padrões contábeis específicos para os criptoativos, contadores são obrigados a recorrer às normas tradicionais para interpretar a natureza dos tokens​. A utilização das normas depende fundamentalmente do propósito da posse do ativo e da natureza econômica que ele representa.

Assim, a classificação dos tokens deve ser feita considerando:

  • Ativo Intangível (IAS 38 / CPC 04 R1):

Quando o token representa um direito de uso, valor econômico negociável e não possui substância física — a classificação como ativo intangível é a mais adequada. Exemplo: holdings de bitcoin ou ethereum para investimento.

Se o token for adquirido com a intenção de revenda no curso normal das operações, como ocorre em exchanges ou corretoras de criptoativos.

  • Instrumento Financeiro (IFRS 9 / CPC 48):

Aplicável apenas se o token representar um direito contratual de receber caixa ou outro ativo financeiro, o que raramente ocorre com criptoativos tradicionais, mas pode ser relevante para tokens securitizados.

  • Caixa e Equivalente de Caixa (IAS 7 / CPC 03 R2):

Apesar de inicialmente associadas ao conceito de moeda, as criptomoedas não são consideradas dinheiro para fins contábeis, conforme interpretação predominante, pois não são amplamente aceitas como meio de troca em todos os mercados​​.

A natureza jurídica e econômica dos tokens

A classificação de tokens deve ser dinâmica e considerar seu uso e função no contexto da empresa. As criptomoedas e tokens podem assumir diferentes naturezas jurídicas — moeda, bem móvel, commodity ou valor mobiliário — conforme seu contexto de uso.

De forma prática:

Situação de Uso

Classificação Contábil Sugerida

Tokens detidos como reserva de valor

Ativo Intangível

Tokens destinados à revenda

Estoque

Tokens que representam recebíveis financeiros

Instrumento Financeiro

Tokens utilizados em transações operacionais

Intangível ou Outras contas patrimoniais

Essa análise reforça a necessidade de julgamento profissional para determinar a classificação correta.

Importância da contabilidade digital

A revolução tecnológica, impulsionada pela blockchain, também redefine o papel da contabilidade. A chamada contabilidade digital permite o registro, certificação e auditoria de ativos digitais com mais transparência e segurança. 

Contudo, o contador deve se manter atualizado para lidar com os novos riscos, como contraparte, volatilidade e segurança digital.

Desafios na mensuração e divulgação

A mensuração dos tokens e criptoativos ainda é um dos principais desafios enfrentados pela contabilidade atual. A ausência de regulamentação contábil específica, somada à elevada volatilidade do mercado de criptoativos e à falta de mercados organizados para todos os tipos de tokens, impõe barreiras à aplicação adequada do princípio da mensuração ao valor justo (IFRS 13 / CPC 46).

Como, os tokens não possuem, via de regra, mercado ativo consolidado, o que dificulta a aferição de preços de forma confiável e auditável. O mercado de criptoativos sofre com variações abruptas de preços, baixa liquidez em determinadas moedas e tokens, além de riscos relacionados a fraudes, hacks e instabilidade de exchanges.

Outro ponto crítico é a classificação apropriada dos tokens nos relatórios financeiros. A depender do uso e da natureza do token, o ativo pode ser classificado como estoque, intangível, instrumento financeiro ou até mesmo não ser reconhecido imediatamente como ativo, exigindo divulgação em notas explicativas para atender aos princípios da relevância e da representação fidedigna.

Principais desafios contábeis na mensuração e divulgação dos tokens incluem:

  • Definir corretamente o mercado principal para o valor justo (IFRS 13).
  • Lidar com a ausência de preços cotados confiáveis para ativos pouco negociados.
  • Avaliar impairment de ativos digitais de forma tempestiva (IAS 36).
  • Elaborar políticas contábeis específicas para criptoativos (IAS 8).
  • Divulgar adequadamente riscos associados a ativos digitais (IFRS 7 para instrumentos financeiros e práticas recomendadas para intangíveis).

Esses fatores demonstram que a contabilidade de criptoativos demanda não apenas técnica contábil tradicional, mas também a compreensão do funcionamento do ecossistema blockchain e dos ambientes de negociação descentralizados.

Reflexões sobre o papel do contador

A ascensão dos tokens e ativos digitais trouxe à tona um novo protagonismo para o contador, exigindo dele habilidades que vão além da técnica convencional. O avanço tecnológico transformou a contabilidade em um serviço de inteligência estratégica, em que o profissional deve ser capaz de interpretar tecnologias disruptivas e transformá-las em informações contábeis úteis e relevantes.

O contador moderno precisa entender:

  • As tecnologias subjacentes como blockchain, smart contracts e DLT.
  • A classificação e o tratamento contábil de diferentes tipos de tokens.
  • Os riscos jurídicos, fiscais e operacionais relacionados aos criptoativos.
  • As tendências de regulamentação nacional e internacional sobre ativos digitais.

A ausência de padrões específicos para criptoativos reforça a importância do julgamento profissional e do ceticismo contábil. O contador torna-se responsável por definir políticas adequadas, avaliar o valor dos ativos com prudência e divulgar informações que sejam compreensíveis, relevantes e comparáveis para os usuários das demonstrações financeiras.

Além disso, o contador deve manter-se constantemente atualizado, pois novas ferramentas, legislações e riscos emergem rapidamente nesse ambiente dinâmico.

Em suma, o contador no contexto da tokenização é mais do que um registrador de dados: é um consultor estratégico, um gestor de riscos digitais e um garantidor da transparência e confiabilidade das informações patrimoniais.

Considerações finais

A tokenização de ativos inaugura uma nova era na contabilidade, onde a compreensão de tecnologias como blockchain e smart contracts é tão relevante quanto o domínio das normas IFRS. A ausência de um "Crypto-IFRS" não isenta os profissionais da responsabilidade de aplicar julgamento técnico e fundamentação normativa adequada.

Neste cenário de transformação, o contador consultivo é protagonista: auxilia empresas a interpretar riscos, criar políticas robustas e se adequar à complexidade do novo mercado digital.

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