Nos últimos dias, uma notícia econômica ganhou destaque internacional: orebaixamento da nota de crédito dos Estados Unidos (de Aaa para Aa1) pela agência Moody’s. Com isso, o país não mantém mais a classificação máxima de crédito em nenhuma das três principais agências do mercado: Moody’s(Aa1), S&P Global Ratings (AA+) — rebaixada em 2011 — e Fitch Ratings(AA+), rebaixada em 2023.
Aqui, o importante é entender o que esse rebaixamento, de fato, representa. As agências de classificação avaliam o chamado risco soberano com base em múltiplos fatores, como desempenho econômico, sustentabilidade fiscal, solidez institucional e exposição a choques externos. Consideram também acapacidade de arrecadação, o acesso a financiamento internacional e aconfiança nas instituições públicas. Esses fatores são analisados por meio demétricas quantitativas e avaliações qualitativas específicas de cada país. O resultado influencia diretamente a capacidade de um governo de atrair investidores e financiar sua dívida a custos mais baixos.
No caso da Moody’s, o rebaixamento teve como justificativa principal o deterioramento das contas públicas estadunidenses. A agência projeta que a dívida pública do país deva saltar de 98% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2024, para 135%, em 2035, com um déficit fiscal anual chegando a 9% no fim do período. Outro dado alarmante é o custo do serviço da dívida. Até 2035, quase 30% da arrecadação federal poderá estar comprometida só com opagamento de juros. E o cenário se agrava quando, na mesma semana dorebaixamento, parlamentares do Partido Republicano — liderados pelopresidente Donald Trump — propuseram no Congresso a prorrogação doscortes de impostos aprovados no seu mandato anterior, que expiram em 2025. Além disso, sugeriram novos incentivos para trabalhadores, aposentados eescolas privadas, medidas que ampliariam ainda mais o desequilíbrio fiscal.
Os republicanos também pressionam por um novo aumento no limite da dívida federal, mecanismo que funciona, nos Estados Unidos, como uma espécie de “teto de gastos”, similar ao nosso arcabouço fiscal. O problema é que esse tipode ação, sem contrapartidas reais de ajuste, apenas posterga a soluçãoestrutural da crise. Já destacamos anteriormente que os verdadeiros problemaseconômicos do país do Norte (assim como da China) vão muito além da guerracomercial.
No caso norte-americano, a crise é essencialmente fiscal. A deterioração das contas públicas tem impedido o Federal Reserve (FED) dereduzir os juros, mesmo diante de uma desaceleração econômica. A Casa Branca, por sua vez, adota posturas altamente questionáveis ao pressionarpublicamente o presidente do FED para reduzir a taxa básica — mesmo quando isso contraria os fundamentos econômicos.
Esse tipo de interferência institucional eleva ainda mais a percepção de risco, alimentando o ciclo derebaixamentos. Com isso, o Tesouro norte-americano é forçado a pagar juros mais altos para se financiar. Prova disso é que, na semana passada, os títulosde 30 anos do governo de lá ultrapassaram, pela primeira vez, a marca de 5% ao ano (a.a.), reflexo direto da ausência de um plano fiscal crível e da pressãoindevida sobre a autoridade monetária.
Enquanto isso, o foco midiático permanece nas tensões comerciais, desviando a atenção dos problemas fiscais e institucionais profundos que afetam diretamente a economia do país mais rico do mundo — e que terão impactos mundiais. Jogar essas questões para debaixo do tapete, certamente, custará caro tanto aos Estados Unidos quanto ao restante do mundo.