Em uma discussão em grupo de Whatsapp, aliás muito qualificada, entramos no tema da locação de bens que recebem o benefício de redução de alíquota. Na discussão fática eram equipamentos médicos, mas poderia ser qualquer outra categoria.
A questão que se impõe é a múltipla possibilidade de interpretação de alguns dispositivos inseridos na Lei Complementar 214/25. Descobrir qual seria a intenção do legislador quando coloca que os novos tributos devem ter o princípio da neutralidade e evitar distorcer a decisão de consumo e das atividades econômicas, é um desafio. Desafio posto à prova quando traduzimos em língua portuguesa o pensamento de um grupo de pessoas que legislou.
Na Lei Complementar 214/25 temos no artigo segundo a afirmação da neutralidade e no artigo 131 que o FORNECIMENTO de alguns dispositivos médicos (anexo IV) goza de redução de alíquota de 60%. Cabe então a pergunta: para o legislador alugar ou comprar seriam operações equivalentes? Pelo princípio da neutralidade, me parece que sim. Assim o fornecimento seria remetido para o artigo terceiro em que o fornecimento é, entre outras situações, a disponibilização. Na hipótese de incidência, o artigo quarto incluiu a locação.
A questão e não é entender ou perceber o que seria as operações que envolvem bens e serviços, já que a própria lei estabelece o que não é bem material é imaterial e portanto, sujeito a tributação nos termos da lei como fornecimento de um direito (direito de usar o material, sem adquirir) com contrapartida onerosa.
Percorrido o trajeto na própria lei, fizemos o imbricamento legal que poderia resultar em duas interpretações possíveis para efeitos tributários da incidência de CBS e IBS:
I – a cessão de uso por locação seria equivalente a operação de compra, portanto seria tributada e aplicada a redução de 60% de alíquota;
II – a aplicação da redução de alíquota se aplica ao fornecimento, exclusivamente, já que a própria Lei Complementar especifica em outros trechos quando incide sobre serviços e fornecimento, como é o caso do artigo 142 que explicita “prestação de serviços”.
Ora, seria razoável pensar que o legislador teve a necessidade de distinguir as operações materiais e imateriais. Se for o caso, o percurso proposto acima resultaria na alternativa II em que serviços têm tratamento distinto de operações com materiais.
Em contrapartida, se as operações são realmente equivalentes, a alternativa I seria mais aderente. Para que não paire esta dúvida para ser dirimida após a vigência efetiva da CBS no exercício de 2027, qual seria a solução (não solução de consulta!)?
Pedir aos deputados que explicitem ou corrijam, unificando o texto, nas expressões de consumo, fornecimento, operações etc. tornando a Lei Complementar hígida para interpretação. Foram muitas equipes redigindo e modificando simultaneamente, logo é razoável que haja estas arestas a serem aparadas.
Eu sou consultor e professor Mauro Negruni. Atuo na integração de informações fiscais para gerar melhorias de processos e sistemas das obrigações acessórias e tributação.