No universo hiperconectado em que vivemos, onde bastam poucos toques na tela para compartilhar informações, a linha entre o que é público e o que é privado parece cada vez mais tênue.
É inerente ao ser humano a famosa “fofoca”, mas quando feita entre duas pessoas é inofensiva, mas quando essa conversa se torna pública, começa o problema.
Conversas de WhatsApp, e-mails, mensagens no Instagram ou em qualquer outro aplicativo podem, em segundos, ser expostas para centenas, milhares ou até milhões de pessoas.
Mas, o que muitos não sabem é que essa prática, tão comum quanto perigosa, pode trazer consequências sérias, inclusive criminais.
O que diz a lei: Artigo 153 do Código Penal
O Código Penal brasileiro é claro no artigo 153: " Art. 153 - Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa”.
"Isto é, aquela captura de tela que parece inofensiva, um “print” enviado para um amigo, um grupo ou até publicado nas redes sociais, pode ser suficiente para caracterizar violação de sigilo.
Embora a lei fale em “correspondência”, a interpretação atualizada e aplicada pela Justiça abrange também meios digitais.
Mensagens privadas, independentemente da plataforma, são consideradas comunicações protegidas.
Violação de privacidade e a Constituição Federal
Além do Código Penal, a Constituição Federal, no artigo 5º, inciso X, assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, garantindo indenização por dano material ou moral em caso de violação.
Diz o artigo 5°, inciso X, da Constituição Federal: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”
Isso significa que, mesmo que não haja condenação criminal, quem divulgar conversas privadas sem autorização poderá responder civilmente e ser condenado a pagar indenização às vítimas.
Responsabilidade civil: o bolso também sente
No campo cível, o compartilhamento de conversas privadas, sejam elas integrais ou em trechos isolados, pode obrigar o autor da divulgação a indenizar os envolvidos pelos danos causados.
A reparação pode incluir danos morais, quando a exposição causar constrangimento, abalo à imagem ou sofrimento emocional, e até danos materiais, caso a divulgação traga prejuízos financeiros.
Esse risco vale também para os populares prints.
A Justiça brasileira já reconheceu, em diversas decisões, que prints de conversas enviados sem consentimento violam direitos de personalidade e, portanto, podem gerar condenações.
Mas por que gera indenização?
O Código Civil é claro quanto a isso em seus artigos 186 e 927 que dispõem respectivamente:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Assim, o dever de indenizar nasce por determinação do Código Civil e o compartilhamento indevido de conversas é considerado ato ilícito, portanto, passível de indenização quando causar dano patrimonial ou moral.
Casos que ganharam repercussão
Nos últimos anos, não foram poucos os casos que ganharam destaque na mídia envolvendo vazamentos de conversas.
De figuras públicas a pessoas comuns, a exposição de diálogos privados já levou a processos milionários, demissões e até a prisões.
Em 2023, por exemplo, um caso envolvendo a divulgação de mensagens entre empresários resultou em condenação por danos morais no valor de R$ 50 mil para cada vítima.
O Judiciário tem reforçado que a ausência de “justa causa” como em casos de denúncia de crime ou de interesse público relevante, não apenas torna a divulgação ilícita, como agrava a conduta de quem age por vingança, curiosidade ou simples entretenimento.
Grupos de WhatsApp também estão protegidos
Um erro comum é acreditar que mensagens enviadas em grupos de WhatsApp são “menos privadas” por serem vistas por várias pessoas.
A lei, no entanto, entende que tais comunicações também têm caráter reservado, e seu compartilhamento fora do grupo sem autorização pode configurar ilícito.
Vazar conversas privadas não é apenas uma questão de ética, mas de responsabilidade jurídica. O ato pode gerar consequências criminais, com risco de prisão e multa, além de processos civis que afetam diretamente o bolso. Mais do que isso, pode destruir reputações, relações pessoais e profissionais.
Prevenção e consciência
A melhor forma de evitar problemas é simples: não compartilhar. Antes de enviar um print, repassar um áudio ou publicar um diálogo, pergunte-se: - Tenho autorização para isso? Se a resposta for “não”, o risco é certo.
Num mundo onde tudo pode ser capturado e replicado em segundos, a privacidade é um bem cada vez mais precioso e a lei está aí para lembrar que violá-la pode custar muito caro.