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REFORMA TRIBUTÁRIA

Cashback tributário: como garantir transparência e evitar fraudes

Este artigo analisa os desafios para o governo e as empresas, além da importância da governança contábil.

25/08/2025 20:00

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Cashback tributário: riscos e necessidade de transparência

Cashback tributário: como garantir transparência e evitar fraudes

O cashback tributário nasceu como uma das principais bandeiras de justiça social na reforma tributária, sendo simples a proposta no discurso: devolver parte do imposto pago no consumo às famílias de baixa renda. Porém, o que parece ser um gesto de equidade carrega riscos que só podem ser enfrentados com mecanismos robustos de transparência e com uma contabilidade — pública e privada — preparada para dar respostas claras.

No campo governamental, o desafio começa na contabilidade pública. Estados e municípios, já pressionados por queda de arrecadação, terão que registrar em seus balanços uma arrecadação bruta que não se converterá integralmente em receita líquida, pois parte será devolvida via cashback. Essa devolução precisa aparecer de forma clara nas demonstrações, sob pena de transformar-se em uma caixa-preta de difícil controle, onde, sem padronização contábil, o cidadão não terá como saber quanto foi devolvido, a quem, em qual período e com qual impacto social efetivo. A falta de clareza nesse ponto abre brecha não só para críticas de ineficácia, mas também para manipulações políticas em torno de números.

As empresas também estão no centro dessa engrenagem, já que o consumo é a base de incidência do tributo e o varejo se torna a porta de entrada da tributação que, em parte, retorna ao cidadão, surgindo então a necessidade de conciliar o que foi efetivamente recolhido com o que será devolvido. Esse processo exigirá que as empresas revisem seus sistemas ERP, controles fiscais e até mesmo relatórios de auditoria interna, e, ocorrendo divergência entre as informações transmitidas pelas empresas e os valores devolvidos pelo fisco, instalará um cenário de insegurança, com questionamentos sobre a confiabilidade dos dados e a correção dos repasses.

No âmbito da contabilidade privada, a questão não é apenas de registro, mas de compliance, vindo as empresas a reforçar seus controles internos para garantir que as notas fiscais e declarações transmitidas ao fisco estejam corretas, sob pena de gerarem devoluções indevidas. O risco de fraude é real: notas emitidas sem lastro, cadastros irregulares no CadÚnico ou até mesmo operações simuladas podem inflar artificialmente valores a devolver, e, nesse ponto, a contabilidade assume papel de guardiã da integridade do processo, oferecendo rastreabilidade e documentação capaz de proteger a empresa em eventuais auditorias.

Em opinião anterior [1], defendi que o cashback tributário poderia se transformar em uma verdadeira “caixa-preta” sem mecanismos de auditoria e relatórios acessíveis. Essa análise continua válida: sem transparência efetiva, o programa se fragiliza, abrindo espaço para fraudes, manipulação de dados e perda de legitimidade social.

Fraudes também ameaçam a ponta social, com CPFs fantasmas, cadastros irregulares e manipulação de sistemas podem desviar recursos de quem realmente precisa. O governo terá que investir em tecnologia de cruzamento de dados, auditorias independentes e mecanismos de fiscalização em tempo real para minimizar desvios, e, sem isso, o cashback corre o risco de repetir o histórico de outros programas sociais mal geridos: um discurso nobre fragilizado por práticas distorcidas.

A experiência internacional mostra que mecanismos de devolução de impostos só funcionam quando há transparência plena, o que significa relatórios acessíveis, auditados e comparáveis, capazes de mostrar com clareza não apenas quanto foi devolvido, mas também o efeito concreto na redução da desigualdade. No Brasil, essa transparência precisará envolver três níveis: a contabilidade pública, as empresas privadas e o cidadão, tendo todos acesso a informações claras e confiáveis para que o cashback não seja apenas mais uma promessa vistosa.

O desafio, portanto, vai além da técnica tributária, exigindo governança contábil, auditoria séria e compliance empresarial real. Se o cashback for implementado sem esses pilares, abre-se a porta para distorções, fraudes e uma propaganda política sem lastro; porém, se ao contrário for tratado com rigor contábil e com controles transparentes, pode ao menos amenizar parte da regressividade que corrói o sistema.

A lição é simples, mas dura: sem contabilidade clara, o cashback não será justiça fiscal — será apenas ilusão contábil.

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