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ARTIGO CONTÁBIL

A reforma tributária no terceiro setor

O fortalecimento do diálogo entre o terceiro setor e os órgãos governamentais será determinante para assegurar que as reformas ocorram de modo a preservar o importante papel social dessas entidades.

09/09/2025 13:30

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A reforma tributária no terceiro setor

A reforma tributária no terceiro setor

A relação entre o sistema tributário brasileiro e o Terceiro Setor tem sido objeto de constantes debates, especialmente em um cenário de reformas tributárias. As organizações do terceiro setor, que englobam entidades sem fins lucrativos voltadas para causas sociais, culturais, educacionais e de saúde, desempenham papel fundamental na sociedade, muitas vezes suprindo lacunas deixadas pelo Estado.

Na prática, a carga tributária sobre bens tende a se manter estável, mas o setor de serviços – que é parte do modelo de atuação de muitas organizações, seja como tomadora ou prestadora de serviços – pode enfrentar aumento de custos, já que as novas alíquotas são mais altas e não há mais regimes cumulativos favorecidos.

A boa notícia é que a Constituição continua protegendo as entidades sem fins lucrativos de educação, assistência social e saúde, garantindo imunidade sobre impostos relacionados ao patrimônio, renda e serviços, desde que cumpram os requisitos legais.  No entanto, a reforma trouxe detalhes importantes:

O IBS não incide sobre as receitas de fornecimento de bens ou serviços realizados por essas entidades, mas as compras feitas por elas continuam sendo tributadas normalmente, sem direito a crédito. Isso pode aumentar o custo das operações, já que o imposto pago nas aquisições não pode ser recuperado.

Para a CBS, a imunidade também se aplica às receitas, independentemente da Certificação como Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), mas, novamente, as compras permanecem tributadas.

Operações (ainda que não onerosas) com partes relacionadas podem atrair incidência de IBS e CBS, sendo importante avaliar com cautela as relações jurídicas estabelecidas.

A nova lei complementar prevê regimes diferenciados, com possibilidade de redução de 60% ou até 100% das alíquotas de IBS e CBS para atividades como educação formal, saúde, insumos médicos, cultura e esporte.

Já para as organizações sujeitas ao regime tributário de isenção e que até então tinham tratamento diferenciado para PIS/COFINS, há possível impacto, pois o novo texto não manteve as antigas alíquotas reduzidas, o que pode elevar a carga tributária.

A mudança não será imediata. Entre 2027 e 2032, os antigos e novos tributos vão coexistir, com alíquotas residuais de IPI, PIS/COFINS, ISS e ICMS sendo gradualmente reduzidas, enquanto IBS e CBS aumentam proporcionalmente.  Esse período de transição exige atenção redobrada das entidades, que precisarão adaptar seus controles contábeis, revisar contratos e investir em sistemas para garantir o correto cumprimento das obrigações fiscais.

A promulgação da Reforma Tributária (Emenda Constitucional nº 132/2023) trouxe um misto de alívio e apreensão para as mais de 800 mil organizações da sociedade civil no Brasil. Embora o texto constitucional tenha preservado a imunidade tributária para entidades beneficentes, o futuro do setor depende agora da regulamentação por meio de leis complementares, cujo debate está em andamento no Congresso Nacional. Especialistas alertam que as novas regras podem tanto simplificar e fortalecer a atuação do setor quanto criar barreiras operacionais e financeiras.

Entre os principais pontos de atenção que serão definidos na regulamentação, destacam-se:

Tributação sobre o consumo: como a imunidade se aplicará às compras de bens e serviços pelas entidades? Haverá isenção direta na ponta, um sistema de devolução de impostos (cashback) ou a necessidade de aproveitamento de créditos? A complexidade deste mecanismo pode impactar diretamente o fluxo de caixa das organizações;

Critérios para imunidade: as leis complementares poderão estabelecer ou redefinir os requisitos para que uma entidade seja considerada beneficente e, portanto, apta a usufruir da imunidade. Regras mais rígidas ou burocráticas podem dificultar o acesso ao benefício, especialmente para organizações menores;

Regimes específicos: a criação de regimes tributários específicos e simplificados para as entidades sem fins lucrativos é uma das grandes expectativas. Um modelo adequado poderia reduzir a burocracia e os custos de conformidade, permitindo que mais recursos sejam destinados à atividade-fim;

Burocracia e obrigações: a transição para o novo sistema exigirá a adaptação a novas declarações e procedimentos fiscais. A complexidade dessas obrigações pode representar um ônus administrativo e financeiro significativo, desviando recursos que deveriam ser aplicados em projetos sociais, ambientais e culturais.

A imunidade tributária, é uma proteção constitucional que impede a incidência de tributos sobre determinadas situações, trata-se de um conceito fundamental no direito brasileiro, sendo que no contexto do terceiro setor – pessoas jurídicas sem fins lucrativos – a imunidade tributária é crucial para garantir sua perenidade, de modo que possam operar sem o ônus de impostos que comprometeriam suas atividades essenciais. 

Assim, diferentemente da isenção, que é regulada por leis infraconstitucionais, a imunidade tem sua origem na Constituição, sendo que no contexto deste texto é pertinente a análise da imunidade trazida pelo artigo 150, VI, “c” da Constituição Federal de 1988, que contempla as entidades sem fins lucrativos.

No contexto das entidades sem fins lucrativos, a Emenda Constitucional 132/2023, estabeleceu através do artigo 149-B, parágrafo único, que o IBS e a CBS observarão as imunidades previstas no artigo 150, inciso VI da CF/88, vide: “Os tributos de que trata o caput observarão as imunidades previstas no art. 150, VI, não se aplicando a ambos os tributos o disposto no art. 195, § 7º” (art. 149-B, parágrafo único).

Cabendo a Lei Complementar a regulamentação do IBS e CBS, o que se deu através da Lei Complementar 214/2025, a qual dispôs sobre a fruição da imunidade tributária pelas organizações sem fins lucrativos, assim, destaca-se:

LC 214/2025: 

Art. 9º São imunes também ao IBS e à CBS os fornecimentos:

[…]

III – realizados por partidos políticos, inclusive seus institutos e fundações, entidades sindicais dos trabalhadores e instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos;

[…]

  • 3º A imunidade prevista no inciso III do caput deste artigo aplica-se, exclusivamente, às pessoas jurídicas sem fins lucrativos que cumpram, de forma cumulativa, os requisitos previstos no art. 14 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional).
  • 4º As imunidades das entidades previstas nos incisos I a III do caput deste artigo não se aplicam às suas aquisições de bens materiais e imateriais, inclusive direitos, e serviços.

Como se vê, a LC 214/2025 trouxe mudanças significativas na aplicação prática da imunidade tributária constitucional às entidades sem fins lucrativos, visto que, o atual entendimento sedimentado pela jurisprudência pátria, em especial o Supremo Tribunal Federal, é de que, na aquisição de bens destinados à finalidade essencial da instituição, a organização é imune, por exemplo, ao IPI e ao ICMS, visto que estará na qualidade de contribuinte de direito, contudo, há incidência dos impostos quando a organização seja contribuinte de fato (organizações que revendem produtos, na qualidade de revendedoras), sendo está a tese firmada pelo STF, através do tema de repercussão geral 342: 

A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante para a verificação da existência do consentimento constitucional a repercussão econômica do tributo envolvido. (RE 608.872, Tema 342 da RG, de relatoria do Min. Dias Toffoli, Pleno, DJe 27.9.2017)

Assim, o §4ª, do art. 9º, da LC 214/2015, pode trazer expressivo impacto quanto a realidade, atualmente vivenciada pelas entidades sem fins lucrativos, visto que na aquisição de bens não haverá imunidade, e incidirá o IBS e a CBS.

Dessa forma, em que pese a EC 132/2024, tenha garantido a imunidade tributária trazida pelo artigo 150, VI, “c”, da CF/88, a LC 214/2025, ao limitar a imunidade ao fornecimento de bens e serviços, trouxe significativa mudança quanto a fruição da imunidade, o que pode resultar em novos desafios para organizações sem fins lucrativos. 

Portanto, é crucial que tais entidades revisem seus planejamentos estratégicos e orçamentários para mitigar os impactos que serão sentidos com as mudanças legislativas aqui apontadas.

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