O brilho no olhar de uma criança ao ver uma vitrine, ou aquela gritaria pedindo insistentemente por alguma coisa no supermercado, é prova de um ser humano ainda em compreensão sobre a relação entre ter e ser. Preço é o que se paga e valor é o que se leva para a vida.
A infância é um terreno fértil para ensinar que não se trata apenas de consumir, mas de viver experiências que vão além do dinheiro. Desde cedo, pais e educadores podem mostrar a diferença entre preço, o quanto algo custa, e valor, o que aquilo representa e gera de impacto.
O que compramos se gasta. O que vivemos se multiplica
Um estudo da Universidade de Cambridge (2013) mostra que os hábitos financeiros se formam até os 7 anos - fase em que as crianças começam a compreender trocas e custos. É o momento ideal para explicar, por exemplo, por que uma bicicleta pode custar mais que um brinquedo eletrônico: ela traz anos de uso, saúde, convivência e memórias - representando o valor, e não apenas o preço, das coisas.
Dos 3 aos 5 anos, as crianças entendem o conceito de escolha, mas ainda sem abstrações financeiras. Cabe aos pais introduzir noções básicas: se levar isso, não pode levar aquilo; se há determinado valor, é preciso escolher.
Dos 6 aos 10 anos, a noção de preço se torna mais clara e é possível introduzir pequenas comparações e até a mesada. Pesquisas indicam que 56% das famílias brasileiras já oferecem mesada aos filhos (CNN Brasil).
Um exemplo simples: dar R$10 por semana e mostrar que, se algo custa R$20, é preciso esperar e guardar. Se não conseguir, deve viver a consequência - parte essencial do aprendizado. Assim, entende planejamento, paciência e o poder da escolha. Dinheiro é limitado; desejos são infinitos.
Apenas 21% dos brasileiros tiveram contato com educação financeira até os 12 anos, segundo o IBOPE. E, de acordo com pesquisa da Serasa (2024), 64% dos jovens de 18 a 24 anos se arrependem de decisões financeiras por impulso. A educação financeira infantil é, portanto, uma forma de prevenção para a vida adulta.
Na pré-adolescência, as conversas podem incluir orçamento, poupança e a diferença entre desejo e necessidade. A partir dos 14 ou 15 anos, é hora de discutir ética e propósito em relação ao dinheiro, e mostrar que nem tudo pode ser comprado, que experiências e memórias têm valor próprio.
Mas o exemplo ainda é o maior professor. Pais que demonstram ansiedade em relação ao dinheiro transmitem insegurança. Os que associam afeto a presentes ensinam que amor se compra.
E os que evitam falar sobre finanças criam adultos despreparados.
Muito diálogo e equilíbrio são os melhores antídotos
Dinheiro é ferramenta, não objetivo. É meio, não fim. Ensine a planejar, esperar, compartilhar e valorizar o que realmente importa.
Mais do que um dia de presentes, o Dia das Crianças pode ser um laboratório de valores, onde se formam adultos com uma relação saudável com o dinheiro e, no fundo, com a própria vida.
*Diogo Angioleti, especialista em finanças e comportamento do Sistema Ailos