Nos últimos tempos, o consumidor brasileiro tem transformado substancialmente os hábitos de consumo. Embora a inflação não esteja nos piores patamares, ainda representa um peso considerável no orçamento familiar. Os preços sobem de forma mais moderada, mas seguem em trajetória ascendente. E quando a inflação se combina com juros elevados e crédito restrito, o resultado é previsível: mais cautela nas decisões de compra.
O Banco Central (BC) mantém a taxa Selic em 15% ao ano (a.a.) na tentativa de conter a alta nos preços. Mas essa estratégia traz efeitos colaterais. O custo do crédito se eleva e a taxa média de juros no crédito pessoal já ultrapassa 90% a.a. Por isso, muitos consumidores acabam evitando assumir novos compromissos financeiros. O cartão de crédito, que antes funcionava como alternativa de fôlego, tornou-se armadilha para quem não consegue quitar a fatura integralmente. Por consequência, a inadimplência cresce, em especial entre as faixas de renda mais baixas.
Dados recentes da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) ajudam a ilustrar esse quadro. Em setembro, o Índice de Confiança do Consumidor recuou 3,2%. Mais da metade dos entrevistados afirmou que pretende reduzir as despesas nos próximos meses. Em um ambiente de incertezas, o impulso de comprar dá lugar à necessidade de economizar. Gastos com lazer, vestuário e eletrônicos são postergados, e o foco se volta para itens essenciais. Esse comportamento não só reflete a conjuntura econômica interna, como também traduz a percepção de um ambiente mundial instável. Mudanças nas cadeias de suprimentos globais, conflitos entre grandes potências e tensões no Oriente Médio, somados aos ajustes estruturais no Brasil, aumentam a sensação de insegurança — e quando o futuro parece incerto, a tendência natural é consumir menos e poupar mais.
Para as empresas, compreender esse novo perfil de consumo é necessário. O cliente atual está mais cauteloso, com menor propensão a gastar. Diante disso, investir em canais digitais e oferecer experiências de compra simples, ágeis e transparentes tornam-se diferenciais competitivos. Outro aspecto importante é a gestão do crédito. Negócios que trabalhem com parcelamentos precisam revisar as políticas de concessão, uma vez que a inadimplência pode comprometer o fluxo de caixa e ameaçar a sustentabilidade da operação. Equilibrar a oferta de crédito com a real capacidade de pagamento do consumidor é uma questão de sobrevivência.
A formação de preços também requer atenção redobrada. Com um público mais sensível, preservar margens de lucro se torna desafiador. Estratégias como promoções pontuais, programas de fidelidade e pacotes personalizados podem estimular o consumo sem corroer a rentabilidade. Além disso, acompanhar o contexto internacional é indispensável. A guerra comercial entre China e Estados Unidos, os conflitos geopolíticos e as transformações nas cadeias produtivas impactam diretamente os custos, a disponibilidade de insumos e a previsibilidade do mercado. Já no plano doméstico, a Reforma Tributária deve alterar dinâmicas setoriais, sobretudo para os segmentos que dependem de incentivos fiscais ou regimes especiais.
Frente a tantas variáveis, o planejamento empresarial precisa ser mais estratégico e flexível. Trabalhar com cenários alternativos, apoiar-se em dados e antecipar tendências de consumo são medidas que aumentam a capacidade de resposta dos negócios em tempos turbulentos. Aqui, vale lembrar que o consumidor brasileiro é heterogêneo: diferentes faixas de renda, regiões e perfis comportamentais reagem de forma distinta às mudanças econômicas. Por isso, segmentar o público e personalizar a comunicação são práticas essenciais. Valorizar as especificidades locais e manter uma escuta ativa das necessidades do cliente fortalecem a relação de confiança e ampliam as chances de fidelização.
Em suma, o ambiente econômico atual leva o consumidor a ponderar mais, comparar preços e avaliar com rigor a real necessidade de cada compra. A combinação entre inflação persistente, crédito caro e incertezas globais molda um comportamento mais racional e conservador. Para as empresas, adaptar-se a essa situação é urgente.