Em dezembro de 2025, as fraudes contábeis descobertas na Lojas Americanas e no Banco Master já representam os maiores ilícitos contra o mercado de capitais da última década, e as auditorias independentes realizadas pela PwC e KPMG emitiram pareceres sem ressalvas ou com ressalvas insuficientes diante de distorções materiais já consolidadas no contexto da operação das mencionadas empresas.
A gravidade que o contexto apresentado representa para o sistema financeiro nacional – em especial no que diz respeito à confiabilidade por parte das instituições externas – ressalta a importância da adequada punibilidade das condutas ilícitas em todas as esferas, já que toda a diligência necessária falhou, causando um estrondoso dano.
No âmbito da responsabilidade civil, consolidou-se importante precedente oriundo da Corte Estadual do Rio de Janeiro, em fevereiro do ano corrente, ocasião em que o Tribunal fluminense admitiu a possibilidade de reparação do dano mesmo na ausência de dolo comprovado, declarando que é suficiente a configuração de culpa grave (negligência ou imperícia manifestas), relevandorevelando a tendência do judiciário em reconhecer o ilícito civil.
Já no âmbito administrativo-sancionador, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em novembro de 2025, instaurou, simultaneamente, dois processos em face das empresas de auditoria independente já referenciadas, nos quais há requisição de declaração de inidoneidade e a aplicação de multas que superam um bilhão de reais – um valor recorde na história da autarquia que regula o mercado de capitais.
Entretanto, no âmbito penal, a responsabilização ainda é de difícil consolidação e, as vezesàs vezes, inexistente.
Isso porque, embora os procedimentos adotados para perseguir a responsabilidade civil e administrativa do auditor independente possam acatar como fundamento a inobservância dos parâmetroparâmetros técnicos que regem a atividade, apontando para uma culpa por parte do sujeito, o mesmomesmo não ocorre – e nem poderia – na seara criminal.
Isso é: o auditor independente pode ser punido com pesadas indenizações, multas e demais sanções administrativas caso constatado que realizou a auditoria em desacordo com as normas regulamentares que regem a atividade, mas istoisso não é suficiente para concretizar uma condenação criminal.
Nesse contexto, eventual responsabilidade criminal dependeria da constatação de que a auditoria teria sido realizada de modo fraudulento, ou até mesmo inepta – pro forma – a fim de satisfazer interesse próprio ou alheio.
Denota-se, portanto, que a persecução criminal de condutas que envolvem a manipulação do sistema financeiro nacional, com grandes conglomerados societários envolvidos e rombos bilionários, guarda reservas peculiares para a punição criminal da conduta, de modo que o precedente civil não migra para o direito penal, onde vigora a exigência de dolo para a tipificação do crime.
O mercado, todavia, tende a impor sua própria sanção: companhias abertas trocando de auditorias, metas estipuladas pelo quadro societário que não serão alcançadas em 2025, migração para outras empresas e, sobretudo, a mancha na reputação de uma instituição procurada pela excelência e confiança, evidenciando que a punição efetiva é a escolha dos clientes.
Evidencia-se, portanto, que ainda que o Direito Penal siga ancorado irremediavelmente na exigência de comprovação de dolo na prática do ilícito, as esferas civil e administrativa, aliadas ao veredicto implacável dos próprios clientes, já executam a sentença definitiva: auditorias que cometam ilícitos poderão não sofrer sanções criminais, mas serão abandonadas em massa por seus clientes, com reputação irreversivelmente queimada e faturamento que pode entrar em colapso, pois a confiança perdida não se recupera com recursos à Suprema Corte — ela simplesmente mata.












