Sra Rafaela,
Vou lhe dar uma orientação como contador e como pessoa que já teve de realizar inventário dentro da família: consulte um bom advogado. Não há o que fazer sem a participação de um advogado.
Quando passei por uma situação semelhante, tive de aprender a levantar informações pois desde gerentes de banco até contadores e advogados me passaram informações errôneas que tiveram consequências posteriormente. Apenas com a atuação de um bom advogado mais as informações que levantei foi possível fazer valer meus direitos e de outros herdeiros. Portanto, vou lhe passar por aqui o que aprendi e reitero: ao menos consulte um bom advogado para levar a cabo essa questão.
Sobre a herança:
A herança é transmitida aos herdeiros por meio da partilha. A partilha é a fase final do inventário; O inventário é um procedimento onde é constituído um inventariante (uma pessoa que receberá a responsabilidade de fazer o levantamento dos bens e obrigações deixadas pelo falecido autor da herança). Esse levantamento recebe o nome de espólio. Após pagar as obrigações, o que sobra no espólio constitui a herança propriamente dita e é partilhada entre os herdeiros. Existem dois tipos de inventário, judicial e extrajudicial. Posso explicar sobre esses dois tipos numa outra resposta, se desejar (eu prefiro o judicial). A questão é que as pessoas normalmente não tomam essas providências, realizando uma partilha informal da herança, e a Sra entenderá por que isso é um erro, especialmente quando há empresa envolvida. Vamos ao seu caso:
Ao consultar a dívida de seu falecido pai junto à Receita Federal, apareceu a mensagem "Cancelado por óbito. Sem espólio". Isso porque não houveram os procedimentos de inventário descritos acima. É importante realizar o inventário e vou explicar porque. Seu pai utilizava uma empresa individual para prestar serviços de transporte. A empresa individual não é uma pessoa jurídica de fato, apenas de direito. Isso significa que o Código Civil permite que uma pessoa registre uma empresa individual em seu nome e atue como pessoa jurídica. Porém, no que tange a questões financeiras, tributárias, contábeis, herança ou qualquer outra questão que envolva direitos e deveres, a empresa individual não se distingue do empresário pessoa física (os patrimônios se confundem, artigo 966 do Código Civil). Ou seja, se uma empresa individual tiver uma dívida registrada em seu CNPJ e não houverem fundos para satisfazer essa obrigação, o empresário pessoa física poderá ter de honrar essa dívida com seus próprios bens. No que tange à herança: como não há distinção entre empresa individual e empresário, todos os bens e obrigações registrados no CNPJ da empresa individual passam a integrar o espólio. E mais: a empresa individual se extingue com o falecimento do empresário. Isso não quer dizer que a empresa desaparece levando todos os bens e obrigações, significa que os herdeiros não poderão continuar com o negócio sob o mesmo CNPJ, ela será encerrada seguindo os procedimentos de baixa na Junta Comercial, os bens e obrigações da empresa passam para o espólio. E é aí que começa o seu problema pois, caso haja inventário, as dívidas só podem ser cobradas nos limites do espólio (artigo 1997 do Código Civil). Porém, vocês não fizeram o inventário, de modo que não há espólio. Neste caso, os herdeiros podem acabar tendo de responder por essas dívidas, na medida da sua parte na herança (também artigo 1997 do Código Civil).
A Sra nos diz que seu falecido pai deixou uma moto e nenhuma quantia em banco. Ora, ao realizar um inventário, a dívida de seu pai com a Receita só poderia ser cobrada dentro do limite do espólio. Se a moto vale R$ 5 mil e é o único bem deixado, paga-se R$ 5 mil à Receita e liquida-se a dívida. Sem o inventário, cada herdeiro terá de pagar a sua parte da dívida, de acordo com a fração correspondente a cada um na herança. O problema é que, sem o inventário, não há solidariedade no pagamento da dívida. A Receita pode cobrar apenas de um herdeiro, limitado ao que esse herdeiro recebeu.
Portanto, a Sra tem duas opções:
1) Pode parcelar a dívida e deixar por isso mesmo. Dependendo da situação, pode parcelar entre 60 e 120 vezes. Não vejo razão para isso, o custo do inventário não chegará nem perto dos R$ 20 mil inscritos na Receita.
2) Pode providenciar um inventário judicial ou extrajudicial e pagar a dívida nos limites do espólio (no caso, a moto). Neste caso, também poderá parcelar. O inventário também é ideal para o caso de existirem outros herdeiros, evitando outras dores de cabeça.
Como seu falecido pai tinha uma empresa, pode ter uma conta jurídica. Com o inventário, você poderá consultar os bancos. Ele pode ter feito seguro de vida por exigência de clientes, você terá três anos a partir do falecimento para requerer o prêmio.
Recomendo que pesquise por bens no site dos Cartórios de Registro, onde poderá conseguir muitas informações sobre bens: http://www.registradores.org.br
O Serasa informará sobre outras dívidas. Com o inventário aberto, o inventariante poderá consultar ao Serasa por escrito, via correios, evitando gastos desnecessários (não recomendo os serviços online da Serasa).
Para qualquer outra dúvida, estou a disposição.