Não é de minha lavra o artigo abaixo, mas além de bem escrito é bastante esclarecedor:
Dacon e a multa confiscatória: inconstitucionalidade
A Secretaria da Receita Federal, no uso de suas atribuições instituiu, através da Instrução Normativa nº 387, de 20 de Janeiro de 2004, o Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais (Dacon), em substituição ao Demonstrativo de Apuração de Contribuição para o PIS/Pasep não cumulativo (Dapis). Ocorre que, como meio de sanção, foi previsto, para o caso de descumprimento deste ato normativo, multa fixa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que, conforme analisaremos, fere os direitos basilares consagrados na Constituição Federal de 1988.
Não obstante o fato de a Administração Pública possuir liberdade para editar atos que lhe proporcionem uma melhor gestão e fiscalização mediante a efetivação do princípio da eficiência, este introduzido na Carta Magna pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, a mesma deve se atentar aos limites impostos pela Constituição Federal de 1988, limites estes que norteiam todo o ordenamento jurídico infra-constitucional, sendo este ordinário, complementar ou ordinatório.
Prevê o art. 5º do ato em análise que a pessoa jurídica que deixar de apresentar o Dacon até o último dia útil do mês subseqüente ao término do trimestre-calendário de referência, sujeitar-se-á a multa fixa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por mês calendário, no caso da falta de entrega ou simplesmente pela entrega após o prazo, bem como a 5% (cinco por cento), não inferior a R$ 100,00 (cem reais), do valor das transações comerciais ou das operações financeiras, próprias da pessoa jurídica ou de terceiros em relação aos quais seja responsável tributário, quanto às informações omitidas, inexatas ou incompletas.
Da simples exegese do dispositivo citado, denotamos que independente do valor do tributo a ser declarado, seja ele, v.g., R$ 1,00; R$ 1.000,00 ou R$ 4.000,00, incidirá a multa de R$ 5.000,00, mais o percentual de 5% (cinco por cento) como vimos. Temos portanto, neste exemplo citado, uma hipótese de sanção por ato ilícito superior a 100% do valor da obrigação principal, o que, de acordo com a posição da doutrina dominante e do Poder Judiciário constitui hipótese de confisco.
Nos ensina o Mestre Roque Antônio Carraza (in Curso de Direito Constitucional Tributário, 19a Edição, pág. 89, Ed. Malheiros) que "o princípio da não-confiscatoriedade exige do legislador conduta marcada pelo equilíbrio, pela moderação e pela medida, na quantificação dos tributos, tudo tendo em vista um Direito Tributário justo. (...) O confisco está presente quando o tributo, de tão gravoso, dificulta-lhes sobremodo a exploração de suas atividades econômicas habituais. Mais ainda, o fenômeno está presente quando a carga tributária inviabiliza o desempenho destas mesmas atividades."
Com muita felicidade o Ilustre professor Luciano Amaro (in Direito Tributário Brasileiro, 9º Edição, pág. 143, Editora Saraiva) afirma que "o princípio da vedação de tributo confiscatório não é um preceito matemático; é um critério informador da atividade do legislador e é, além disso, preceito dirigido ao intérprete e ao julgador, que, à vista das características da situação concreta, verificarão se um determinado tributo invade ou não o território do confisco."
Os critérios informadores do legislador estão consagrados na Lei Suprema, em seu art. 150, inciso IV, prevendo que sem prejuízos de outras garantias (portanto trata-se de cláusula pétrea) é vedado a União, Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios utilizar tributo com efeito de confisco, bem como em seu art. 145, parágrafo primeiro, normatizando que sempre que possível os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do Contribuinte.
Dentre os inúmeros julgados do Poder Judiciário, destacamos, pela sua importância, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar a ADI 551/RJ, da relatoria do Ilustre Min. ILMAR GALVÃO, ementado nos seguintes termos: "Ação Direta de Inconstitucionalidade. §§ 2.º e 3.º do art. 57 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Fixação de valores mínimos para multas pelo não-recolhimento e sonegação de tributos estaduais. Violação ao inciso IV do art. 150 da Carta da República. A desproporção entre o desrespeito à norma tributária e sua conseqüência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do contribuinte, em contrariedade ao mencionado dispositivo do texto constitucional federal. Ação julgada procedente."
Assim é que, a fixação de multa no valor de R$ 5.000,00, independentemente do valor a ser declarado, afronta o princípio da capacidade contributiva, iguala, não os desiguais, mas todos os contribuintes sem distinção de suas realidades econômicas, sendo certo que em algumas situações, como o exemplo citado anteriormente, importará em verdadeiro confisco.
Finalizando, conclui-se portanto que, a multa exigida pela IN SRF nº 387/04, é inconstitucional por afrontar princípios constitucionais tributários, dentre eles, o princípio do não confisco. (Gazeta Mercantil) (do Rio)
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Walter Carlos da Conceição