Trabalho e Previdência
INFORMAÇÃO
FGTS
CONTRIBUIÇÃO SOCIAL
Constitucionalidade
O Parecer 1.983 PGFN, de 12-11-2001, publicado na página 9 do DO-U, Seção
1, de 5-2-2002, analisou a natureza jurídica das Contribuições
Sociais instituídas pela Lei Complementar 110, de 29-6-2001 (Informativo
27/2001).
A seguir, reproduzimos a íntegra do referido Parecer:
I
DOS FATOS
Com a edição da Lei Complementar nº 110, de 29 de junho
de 2001, foram criadas em seus artigos 1º e 2º, duas novas Contribuições
Sociais, cujas hipóteses de incidência encontram-se traçadas
nos seguintes termos, verbis:
Art. 1º Fica instituída contribuição social
devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa,
à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos
devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), durante
a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações
aplicáveis às contas vinculadas.
Art. 2º Fica instituída contribuição social
devida pelos empregadores à alíquota de cinco décimos por cento
sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador,
incluídas as parcelas de que trata o artigo 5º da Lei nº 8.036,
de 11 de maio de 1990.
2. Inicialmente, a fim de sistematizar a exposição acerca da constitucionalidade
das contribuições criadas pelos artigos 1º e 2º, da Lei
Complementar nº 110/2001, mister se faz analisar inicialmente sua
natureza jurídica, a fim de definir seu regime legal, bem como as normas
jurídicas aplicáveis, para, ao depois, analisarmos detidamente cada
uma das contribuições em seus principais aspectos, formais e materiais.
3. Em que pese o fato de as contribuições sociais ainda constituírem
hoje ponto de intermináveis controvérsias doutrinárias, na medida
em que assumem ora feição de imposto ora de taxa, é importante
frisar que a hipótese vertente não reclama maiores dificuldades, conforme
demonstrar-se-á no decorrer da exposição.
4. Convém, porém, desde logo fixar ponto fundamental ao correto entendimento
da natureza jurídica das duas contribuições de que se trata:
embora destinadas a integrar os recursos do FGTS Fundo de Garantia de
Tempo de Serviço , para atender ao complemento da atualização
monetária resultante da aplicação cumulativa dos índices
relativos aos expurgos inflacionários ocorridos no passado sobre as contas
vinculadas do FGTS, essas duas novas contribuições tem natureza e
aplicabilidade distintas da contribuição para o FGTS, com esta não
se confundindo. E tanto, isso é certo, que o legislador, em vez de, simplesmente
instituir adicionais ao valor da multa pela rescisão injustificada do contrato
de trabalho e ao da alíquota de incidência da contribuição
para o FGTS, dando-lhes a destinação prevista na nova lei, optou,
em realidade, por instituir duas novas figuras tributárias, ainda que com
fatos geradores e bases de cálculo muito assemelhadas aos daquelas multa
e contribuição.
DA NATUREZA JURÍDICA DAS CONTRIBUIÇÕES
5. Com efeito, as contribuições insertas nos artigos 1º e 2º,
da Lei Complementar nº 110/2001, objetivam, à semelhança
da destinada ao FGTS, dar efetividade ao direito social consagrado no inciso
III, do artigo 7º, do Capítulo II, da Carta Política de 1988,
expresso no sentido de que todos os trabalhadores urbanos e rurais tem direito
ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Assim, no contexto do novo panorama
introduzido pelo imperativo das decisões judiciais, e no sentido de efetivar
a correção dos valores das contas individuais dos trabalhadores, para
que o Estado possa dar cumprimento ao mencionado comando, necessário é
que este institua fonte de arrecadação para essa finalidade específica.
6. Com base nesse comando e nos objetivos sociais que aponta, foi editada a
Lei Complementar nº 110/2001, cujas contribuições veiculadas
nos seus artigos 1º e 2º, tem por fundamento de validade o inciso
III, do artigo 7º, cominado com o artigo 195, ambos da Carta Política
de 1988, que consagram, respectivamente, o direito à percepção
do FGTS e o princípio da universalidade relativamente ao custeio e manutenção
da seguridade social, cujo encargo pertence a toda sociedade, bem como ao próprio
Estado por intermédio da destinação orçamentária de
recursos.
7. Em razão dessas premissas, cuidou o legislador infraconstitucional da
criação de nova fonte de custeio da seguridade social, com base no
§ 4º, do artigo 195, da Constituição da República
Federativa do Brasil, expresso no sentido de que o produto de sua arrecadação
encontra-se legalmente destinado ao aporte de recursos financeiros aos cofres
do FGTS, a fim de dar cumprimento efetivo ao Direito Social consagrado no inciso
III, do artigo 7º, da Constituição da República Federativa
do Brasil.
8. Como se sabe, tanto a doutrina, quanto a jurisprudência, são acordes
no sentido, de que a destinação do produto da arrecadação
constitui traço distintivo da contribuição social, com relação
aos demais tributos.
9. Assim, para o correto enquadramento das contribuições, é fundamental
que a lei que as instituiu contenha expressa previsão de afetação
do produto de sua arrecadação, tal como o fez a Lei Complementar nº 110/2001,
no § 1º, do artigo 3º, que destina integralmente ao FGTS
os valores equivalentes à arrecadação das contribuições
de que tratam seus artigos 1º e 2º, verbis:
§ 1º As contribuições sociais serão
recolhidas na rede arrecadadora e transferidas à Caixa Econômica Federal,
na forma do artigo 11, da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, e as
respectivas receitas serão incorporadas ao FGTS. (grifos nossos)
10. Nesse sentido, manifesta-se a doutrina, conforme se infere da lição
de HAMILTON DIAS DE SOUZA, constante do Curso de Direito Tributário
volume II Coordenador IVES GANDRA DA SILVA MARTINS 5ª
ed. Editora CEJUP pp. 116/117, clara no sentido de que a afetação
de receita para atender a determinada necessidade social constitui, tal como
na hipótese presente, traço identificador das contribuições
sociais, verbis:
De outro lado, é da essência da contribuição a afetação
das receitas a um determinado órgão para atender a finalidades também
determinadas. Realmente, assim, é como conseqüência da natureza
da ação examinada. Sendo ela instituída para atender a finalidades
previamente traçadas, não teria sentido que o produto de sua arrecadação
tivesse distinção diversa que a referida à atividade que é
o pressuposto da obrigação.
11. Desta feita, não resta dúvida de que a finalidade e a destinação
constituem características das contribuições sociais, sendo bem
de ver que na presente hipótese as novas contribuições destinam-se
indubitavelmente à seguridade social, porquanto constituem novas fontes
de recursos ao FGTS, a teor do que determina o § 5º, do artigo
195, da Constituição da República Federativa do Brasil, que veda
a criação, majoração ou extensão, sem a respectiva
fonte de custeio.
12. Portanto, constituindo a contribuição em testilha meio de incremento
e capitalização do regime da seguridade social, mais especifcamente
do FGTS, forçoso é concluir no sentido de que esta possui inegavelmente,
natureza jurídica de contribuição social, destinada à seguridade
social.
13. Nesse sentido é a jurisprudência pacífica do Egrégio
Supremo Tribunal Federal, que confere ao FGTS conforme se infere da ementa de
acórdão tirada para o julgamento do Recurso Extraordinário nº 120.189-4/SC,
expressa nos seguintes termos, verbis:
FGTS NATUREZA. O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço tem
natureza trabalhista e social, não se lhe aplicando as normas disciplinadoras
da prescrição e da decadência relativas aos tributos. Precedente:
Recurso Extraordinário nº 100.249, julgado pelo Pleno, conhecido
e provido, por maioria, tendo sido Redator designado o Ministro Néri da
Silveira, com aresto veiculado no Diário de Justiça de 1º de
julho de 1988, à página 16.903. (2ª Turma DJ-U 19-2-99
Rel. Ministro MARCO AURÉLIO)
14. Reforça o entendimento no sentido de que as contribuições
sociais instituídas pelos artigos 1º e 2º, da Lei Complementar
110/2001, são destinadas a seguridade social a lição sempre segura
e oportuna de SERGIO MARTINS PINTO, em sua obra Direito do Trabalho
4ª ed. São Paulo Malheiros Editores 1997, pp.
352 e seguintes, verbis:
(...) entendemos que para o empregador o FGTS vem a ser uma contribuição
social, espécie do gênero tributo. Não se trata de um outro tipo
de contribuição ou contribuição previdenciária, pois
para nós esta tem natureza tributária, de contribuição social.
15. Do cotejo entre a natureza e os objetivos do FGTS com as contribuições
criadas pela Lei Complementar nº 110/2001, extrai-se a conclusão
no sentido de que estas possuem natureza jurídica de contribuições
destinadas à seguridade social, na medida em que se amoldam, com perfeição,
à hipótese do § 4º, do artigo 195, da Constituição
da República Federativa do Brasil, que assegura à Lei Complementar
a possibilidade de instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção
ou expansão da seguridade social.
16. A jurisprudência mais recente e autorizada coaduna-se com o que até
aqui foi aduzido conforme se infere do brilhante voto do MM. Juiz TEORI ALBINO
ZAVASCKI, atual Presidente do Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª
Região proferido nos autos, da ação cautelar nº 94.04.54999-1/SC,
publicado na RT RF nº 21, p. 311, que serviu de fundamento por ocasião
do rumoroso julgamento envolvendo a correção monetária dos saldos
do FGTS, perante o Egrégio Supremo Tribunal Federal, que desencadeou a
necessidade de suprir a defasagem do Fundo e, destarte, deu origem à Lei
Complementar nº 110/2001, cujo conteúdo deixa entrever a plena
identificação das contribuições sociais criadas, com aquelas
destinadas ao financiamento da seguridade social, verbis:
Hoje, adesão ao regime do FGTS é imposta por lei a empresas
e a trabalhadores, e é a lei que disciplina, de forma exaustiva todo o
conteúdo e todas as conseqüências de tal vinculação.
Em suma, nada tem de contratual o regime do FGTS. Sua natureza é tipicamente
institucional, estatutária, objetiva. É, sob esse aspecto, em tudo
semelhante ao regime da Previdência Social: em ambos os casos, o ingresso
é automático, e decorre tão-somente da existência do contrato
de trabalho, que é seu ato-condição. (grifos acrescidos)
17. Como se vê, as contribuições criadas pela Lei Complementar
nº 110/2001, possuem nítida feição de contribuições
destinadas à seguridade social, haja visto o fato de que o produto de sua
arrecadação encontra-se destinada ao ingresso nos cofres da seguridade
social a teor de expressa determinação legal, nos termos do artigo
3º, da mencionada Lei Complementar.
18. Ante o exposto, é lícito concluir que as contribuições
instituídas pela Lei Complementar nº 110/2001, são destinadas
ao financiamento da seguridade social, conforme faculta o inciso III, do § 4º,
do artigo 195, da Constituição Federal, que autoriza a instituição
de outras fontes destinadas a manutenção ou expansão da seguridade
social, desde que veiculada, tal como na espécie, por Lei Complementar.
19. Outrossim, conforme asseverou em hipótese análoga o Exmo.
Min. Carlos Mário Velloso, por ocasião do julgamento do RE nº 138.248-4/CE,
sobre a contribuição social lucro, o que importa perquirir não
é o fato de a União arrecadar a contribuição, mas se o produto
da arrecadação destinado ao financiamento da seguridade social,
cuja ementa merece ser transcrita, a fim de que não mais remanesça
dúvida quanto à natureza jurídica de contribuição para
a seguridade social das exações em comento, expressa nos seguintes
termos, verbis:
CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. CONTRIBUIÇÕES
INCIDENTES SOBRE O LUCRO DAS PESSOAS JURÍDICAS. Lei nº 7.689,
de 15-12-88.
I Contribuições parafiscais: contribuições sociais,
contribuições de intervenção e contribuições corporativas.
CF, artigo 149. Contribuições sociais de seguridade social. CF, artigos
149 e 195. As diversas espécies de contribuições sociais.
II A contribuição da Lei 7.689, de 15-12-88, é uma contribuição
social instituída com base no artigo 195, I, da Constituição.
As contribuições do artigo 195, I, II, III, da Constituição,
não exigem, para sua instituição, Lei Complementar. Apenas a
contribuição do § 4º, do mesmo artigo 195 é que
exige, para a sua instituição, Lei Complementar, dado que essa instituição
deverá observar a técnica da competência residual da União
(CF, artigo 195, § 4º; CF, 154, I). Posto estarem sujeitas à
Lei Complementar do artigo 146, III, da Constituição, porque não
são impostos, não há necessidade de que a Lei Complementar defina
o seu fato gerador, base de cálculo e contribuintes (CF, artigo 146, III,
a).
III Adicional ao imposto de renda classificação desarrazoada.
IV Irrelevância do fato de a receita integrar o orçamento fiscal
da União. O que importa é que ela se destina ao financiamento da seguridade
social (Lei 7.689/88, artigo 1º).
V Inconstitucionalidade do artigo 8º, da Lei 7.689/88, por ofender
o princípio da irretroatividade (CF, artigo 150, III, a) qualificado
pela inexigibilidade da contribuição dentro do prazo de noventa dias
da publicação da lei (CF, artigo 195, § 6º). Vigência
e eficácia da lei: distinção.
VI Recurso extraordinário conhecido, mas improvido, declarada a
inconstitucionalidade apenas do artigo 8º, da Lei 7.689, de 1988.
(grifos acrescidos)
DA ANTERIORIDADE MITIGADA
20. Identificada a natureza jurídica das contribuições sociais
como sendo espécies destinadas à seguridade social, impõe-se
a conclusão de que a elas é aplicável o princípio da anterioridade
mitigada ou anterioridade nonagesimal como preferem alguns doutrinadores.
21. Com efeito, a jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal Federal
é sólida no sentido de que às contribuições destinadas
à seguridade social aplica-se o disposto no § 6º, do artigo
195, da Constituição da República Federativa do Brasil, que consagra
a anterioridade nonagesimal, também denominada anterioridade mitigada,
conforme se depreende dos arestos a seguir transcritos, verbis:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. MEDIDA
PROVISÓRIA N.º 812, DE 31-12-94, CONVERTIDA NA LEI N.º 8.981/95,
ARTIGOS 42 E 58, QUE REDUZIRAM A 30% A PARCELA DOS PREJUÍZOS SOCIAIS DE
EXERCÍCIOS ANTERIORES, SUSCETÍVEL DE SER DEDUZIDA DO LUCRO REAL, PARA
APURAÇÃO DOS TRIBUTOS EM REFERÊNCIA. ALEGAÇÃO DE OFENSA
AOS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE E DA IRRETROATIVIDADE.
Diploma normativo que foi editado em 31-12-94, a tempo, portanto, de incidir
sobre o resultado do exercício financeiro encerrado.
Descabimento da alegação de ofensa aos princípios da anterioridade
e irretroatividade, relativamente ao Imposto de Renda, o mesmo não se dando
no tocante à contribuição social, sujeita que está à
anterioridade nonagesimal, prevista no artigo 195, § 6º da CF,
que não foi observado.
Recurso conhecido, em parte, e nela provido. (RE 232084/SP 1ª Turma
Rel. Min. Ilmar Galvão DJ-U 16-6-2000) grifos acrescidos
22. Em outra oportunidade, manifestou-se o Pretório Excelso no mesmo sentido
o julgado acima transcrito, cuja ementa transcreve-se apenas para reforçar
a argumentação até aqui expendida, verbis:
IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. MEDIDA PROVISÓRIA
N.º 812, DE 31-12-94, CONVERTIDA NA LEI N.º 8.981/95, ARTIGOS 42 E
58. PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE E DA IRRETROATIVIDADE.
Medida Provisória que foi publicada em 31-12-94, apesar de esse dia ser
um sábado e o Diário Oficial ter sido posto à venda à noite.
Não ocorrência, portanto, de ofensa quanto à alteração
relativa ao Imposto de Renda, aos princípios da anterioridade e da irretroatividade.
O mesmo, porém, não sucede com a alteração relativa à
contribuição social, por estar ela sujeita, no caso, ao princípio
da anterioridade mitigada ou nonagesimal do artigo 195, § 6º,
da CF, o qual não foi observado.
Recurso Extraordinário conhecido em parte e nela provido. (RE 250521/SP
1ª Turma Rel. Min. Moreira Alves DJ-U 30-6-2000, p.
89) grifos acrescidos
23. Portanto, tendo em vista o fato de que as contribuições sociais
em tela constituem nova fonte de custeio para a seguridade social, nos termos
do § 4º, do artigo 195, da Carta Política de 1988, revela-se
acertada a fixação da anterioridade nonagesimal ou mitigada, tal como
lançada no artigo 14, da Lei Complementar nº 110/2001.
DA INEXISTÊNCIA DE BITRIBUTAÇÃO
24. Como se sabe, a vedação constante do inciso I, do artigo 154,
da Constituição da República Federativa do Brasil, somente diz
respeito aos impostos e não às contribuições sociais, posto
que a elas é lícito valer-se de base de cálculo relativa a outro
tributo.
25. Desse modo, não resta dúvida de que não ocorre o fenômeno
da bitributação relativamente às contribuições sociais
instituídas pelos artigos 1º e 2º, da Lei Complementar nº 110/2001.
26. Nesse sentido, mais uma vez revela-se pertinente a transcrição
de ementa de acórdão tirada para o julgamento de recurso extraordinário
interposto pela União, ao qual foi dado parcial provimento, vazada nos
seguintes termos, verbis:
EMENTA: EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. FINSOCIAL. ALEGAÇÃO
DAS EMPRESAS DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EXAÇÃO POR AUSÊNCIA
DE LEI COMPLEMENTAR A AUTORIZAR A SUA COBRANÇA E EXISTÊNCIA DE BITRIBUTAÇÃO.
RECURSO DA UNIÃO FEDERAL NO SENTIDO DA INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO
DA ANTERIORIDADE ÀS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS.
1. Alegações da empresa. Improcedência. O Plenário desta
Corte firmou entendimento no sentido de que o Decreto-Lei nº 1.940/82
e as alterações havidas anteriormente à promulgação
da Constituição Federal de 1988 continuaram em vigor até a edição
da Lei Complementar nº 70/91.
1.1. Existência de bitributação por ter o FINSOCIAL a mesma base
de cálculo da Contribuição para o PIS. Insubsistência. A
vedação constitucional prevista no artigo 154, I da Carta Federal
somente diz respeito aos impostos e não às contribuições
para a seguridade social.
2. Extraordinário da União Federal. Inaplicabilidade do princípio
da anterioridade às contribuições sociais. Alegação
parcialmente procedente. A teor do disposto no artigo 195, § 6º
da Constituição Federal, a exação somente poderá ser
exigida noventa dias após a edição da lei que a houver instituído
ou modificado.
Extraordinário da União Federal parcialmente conhecido, e, nesta parte,
provido. Não conhecido o recurso da empresa. (RE 200788/MG Rel.
Min. Mauricio Correa DJ de 19-6-98)
DA IRRETROATIVIDADE DA NORMA
27. Nesse particular, é oportuno e pertinente o esclarecimento de que as
contribuições sociais veiculadas na Lei Complementar nº 110/2001,
não ofendem o princípio da irretroatividade constante da alínea
a, do inciso III, do artigo 150, da Carta Política de 1988.
28. Ao estabelecer em seu artigo 1º, que a base de cálculo da contribuição
social corresponde ao montante de todos os depósitos devidos, referentes
ao FGTS, não há que se falar em violação ao princípio
da irretroatividade.
29. Em verdade, o que houve foi tão somente a eleição de nova
base de cálculo, composta do conjunto de valores depositados na conta vinculada
ao FGTS, durante o período em que vigorou o contrato de trabalho.
30. Porém, este não é o principal argumento.
31. Com efeito a irretroatividade está umbilicalmente ligada ao fato gerador
da contribuição e totalmente dissociada de sua base de cálculo.
32. Como se sabe, a limitação ao poder de tributar estampada na alínea
a, do inciso III, do artigo 150, da Carta Política de 1988,
alcança somente fatos geradores ocorridos antes da vigência da lei
instituidora, o que não se deu na presente hipótese, tendo em vista
a redação do artigo 14 da Lei Complementar nº 110/2001,
expresso ao afirmar que a lei entra em vigor na data de sua publicação,
ressalvadas as hipóteses dos artigos 1º e 2º, cuja vigência
obedece ao princípio da anterioridade nonagesimal para a produção
de efeitos.
DAS CONTRIBUIÇÕES EM ESPÉCIE DO ARTIGO 1º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 110/2001
33. Demonstrados os princípios comuns aplicáveis à contribuições
sociais constantes dos artigos 1º e 2º, da Lei Complementar nº 110/2001,
optamos pela análise individualizada das principais características
que envolvem cada uma das referidas contribuições, de molde a evitar
a tautologia, bem como para facilitar a exposição do tema.
34. O artigo 1º encontra-se vazado nos seguintes termos, verbis:
Art. 1º Fica instituída contribuição social
devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa,
à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos
devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), durante
a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações
aplicáveis às contas vinculadas.
35. Com efeito o artigo primeiro versa sobre a contribuição social
devida pelos empregadores em caso de rescisão imotivada do contrato de
trabalho, à alíquota de 10% (dez por cento) sobre o montante total
dos depósitos havidos durante a vigência do contrato de trabalho,
referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, acrescido das remunerações
aplicáveis às contas vinculadas.
36. Da leitura do dispositivo em comento, temos a criação de nova
contribuição social, com perfil diverso daquele que permanece no sistema
atual, em face do inciso I, do artigo 10, do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias (ADCT), razão pela qual agiu corretamente o legislador,
posto que não elevou o percentual de 40% (quarenta por cento) para 50%
(cinqüenta por cento), referente à indenização nas hipóteses
de despedida arbitrária.
37. O que fez o legislador foi criar uma nova contribuição e manter
a outra: a de 40% (quarenta por cento), nos moldes do inciso I, do artigo 10,
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e
outra de 10% (dez por cento). A primeira destinada ao próprio trabalhador
individual, com caráter nitidamente indenizatório e a segunda, cuja
finalidade é a de ressarcir e manter o equilíbrio econômico-financeiro
das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço pertencentes a todos
os trabalhadores com direito a repasse do expurgo inflacionário.
38. Desta feita, temos uma nova contribuição social, cuja base de
cálculo corresponde ao total dos depósitos do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço, ao longo do contrato de trabalho.
39. Por essa razão, o legislador pátrio veiculou a nova fonte de custeio
da seguridade social por intermédio de Lei Complementar, a fim de se adequar
aos ditames do inciso III, do §4º, do artigo 195, da Constituição
da República Federativa do Brasil.
40. Em reforço ao que até aqui foi aduzido, revela-se oportuna a transcrição
da lição de Roque Antonio Carrazza, em sua obra Curso de Direito
Constitucional Tributário 10ª ed., pp. 344/345, que corrobora
a argumentação até aqui expendida no sentido da constitucionalidade
da Lei Complementar que criou a nova fonte de custeio da seguridade social,
cuja base de cálculo corresponde aos depósitos do Fundo de Garantia
do Tempo de Serviço, realizados pelo empregador, verbis:
Observamos que, nos termos do § 4º, do artigo 195, da CF
a União poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção
ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no artigo 154, II.
Dito de outro modo, as contribuições sociais poderão incidir
sobre outros fatos econômicos, além, da folha de salários (folha
de pagamento dos empregados), o faturamento e o lucro. Quando, porém, isto
acontecer, tais contribuições sociais deverão ser instituídas
ou aumentadas por meio de Lei Complementar... (grifos nossos)
41. Corrobora este entendimento, o fato de que a Carta Política de 1988,
ao cuidar das contribuições sociais para seguridade social, não
elencou rol taxativo de hipóteses de incidência e de bases de cálculo
no inciso I, do artigo 195, da Constituição Federal, circunstância
que deixa certa a constitucionalidade do dispositivo.
DO ARTIGO 2º, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 110/2001
42. O artigo 2º, da Lei Complementar nº 110/2001, encontra-se
expresso nos seguintes termos, verbis:
Art. 2º Fica instituída contribuição social
devida pelos empregadores à alíquota de cinco décimos por cento
sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador,
incluídas as parcelas de que trata o artigo 15 da Lei nº 8.036,
de 11 de maio de 1990.
43. Da leitura do dispositivo em tela, infere-se que a contribuição
social nele veiculada incide sobre a remuneração devida pelo empregador
ao empregado, acrescida dos valores descritos no artigo 15 da Lei nº 8.036/90.
44. Assim, temos que a base de cálculo indicada no dispositivo mencionado
equivale à folha de salários, a teor do entendimento esposado pelo
Egrégio Supremo Tribunal Federal em reiteradas oportunidades, conforme
consta do RREE nº 166.772 e 177.296 e na ADIn nº 1.102.
45. De mais a mais a exemplo do que sucede com a contribuição social
criada pelo artigo 1º, da Lei Complementar nº 110/2001, a exação
em comento observou as vedações constantes do inciso I, do artigo
154, da Constituição da República Federativa do Brasil.
46. Outrossim, igualmente não ocorre o fenômeno da bitributação,
pelas mesmas razões expendidas com relação ao artigo 1º,
da Lei Complementar.
47. No que se refere à alíquota constante do artigo 2º em comento,
é oportuno esclarecer que não se confunde o percentual de 0,5% de
acréscimo com os 8% (oito por cento) destinados ao FGTS, devido pelos trabalhadores.
48. Em verdade, trata-se de nova contribuição social destinada a determinada
finalidade, inegavelmente social, posto que destinada à seguridade social,
no perfil que lhe ofertou o constituinte, na sua tríplice faceta.
DA REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
49. A atribuição relativamente à representação judicial
da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, decorre da letra do artigo 3º,
da Lei Complementar nº 110/2001, claro no sentido de que às contribuições
sociais instituídas em seus artigos 1º e 2º, aplicam-se as disposições
da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, e da Lei nº 8.844,
de 20 de janeiro de 1994, inclusive quanto a sujeição passiva e equiparações,
prazo de recolhimento, administração, fiscalização, lançamento,
consulta, cobrança, garantias, processo administrativo de determinação
e exigências de créditos tributários federais.
50. Daí, conclui-se, sem dúvida, que terá legitimidade para fiscalizar
os recolhimentos, efetuar cobranças e exigir os créditos tributários
relativos às contribuições em questão, o mesmo ente responsável
por tais atividades em relação aos valores devidos ao FGTS
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço , previstos nas Leis nos
8.036/90 e 8.844/94.
51. Vejamos, então, o que determinam os dois diplomas legais, em relação
à matéria:
Lei nº 8.036/90
Art. 23 Competirá ao Ministério do Trabalho e da Previdência
Social a verificação, em nome da Caixa Econômica Federal do cumprimento
do disposto nesta Lei, especialmente quanto à apuração dos débitos
e das infrações praticadas pelos empregadores ou tomadores de serviço,
notificando-os para efetuarem e comprovarem os depósitos correspondentes
e cumprirem as demais determinações legais, podendo, para tanto, contar
com o concurso de outros órgãos do Governo Federal, na forma que vier
a ser regulamentada.
Lei nº 8.844/94
Art. 1º Compete ao Ministério do Trabalho a fiscalização
e a apuração das contribuições ao Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço (FGTS), bem assim a aplicação da multas e demais encargos
devidos.
(...)
Art. 2º Compete à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a
inscrição em Dívida Ativa dos débitos para com o Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), bem como, diretamente, ou por intermédio
da Caixa Econômica Federal, mediante convênio, a representação
judicial e extrajudicial do FGTS, para a correspondente cobrança, relativamente
à contribuição e às multas e demais encargos previstos na
legislação respectiva. (grifos acrescidos)
52. Inegável, portanto, a atribuição da Procuradoria-Geral da
Fazenda Nacional quanto a representação da União em Juízo,
nas causas que versem sobre as contribuições sociais criadas pela
Lei Complementar nº 110/2001.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
53. Antes de finalizar, cabe recordar o princípio da constitucionalidade
das leis.
54. Como se sabe, tal princípio permeia todo o sistema constitucional,
sendo certo que dele não pode-se afastar o intérprete da norma, sob
pena de violar o princípio de separação dos poderes consagrada
no artigo 2º, da Carta Política de 1988, que dispõe, verbis:
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos
entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
55. Nesse sentido é que aponta a moderna doutrina, capitaneada por LUIZ
ROBERTO BARROSO, em sua festejada obra Interpretação e Aplicação
da Constituição Editora Saraiva pp. 164/165
1996, verbis:
O princípio desempenha uma função pragmática indispensável
na manutenção da imperatividade das normas jurídicas e, por via
de conseqüência, na harmonia do sistema. O descumprimento ou não
aplicação da lei, sob o fundamento de inconstitucionalidade, antes
que o vício haja sido proclamado pelo órgão competente, sujeita
a vontade insubmissa às sanções prescritas pelo ordenamento.
Antes da decisão judicial, quem subtrair-se à lei o fará por
sua conta e risco.
56. Mais adiante, prossegue o referido autor esclarecendo que, verbis:
se traduz em duas regras de observância necessária pelo intérprete
e aplicador do direito:
a) não sendo evidente a inconstitucionalidade, havendo dúvida ou a
possibilidade de razoavelmente se considerar a norma como válida, deve
o órgão competente abster-se da declaração de inconstitucionalidade;
b) havendo alguma interpretação possível que permita afirmar-se
a compatibilidade da norma com a Constituição, em meio a outras que
carreavam para ela um juízo de invalidade, deve o intérprete optar
pela interpretação legitimadora, mantendo o preceito em vigor.
57. No mesmo diapasão é a lição sempre oportuna do mestre
Carlos Maximiliano, em seu clássico Hermenêutica e Aplicação
do Direito, 18ª edição, Rio de Janeiro, Editora Forense,
2000, pp. 307/309 e 311, verbis:
366 III Todas as presunções militam a favor da validade
de um ato legislativo ou executivo; portanto, se a incompetência, a falta
de jurisdição ou a inconstitucionalidade, em geral, não estão
acima de toda dúvida razoável, interpreta-se e resolve-se pela manutenção
do deliberado por qualquer dos três ramos em que se divide o Poder Público.
Entre duas exegeses possíveis, prefere-se a que não infirma o ato
de autoridade. Oportet ut res plus valeat quam pereat.
Os Tribunais só declaram a inconstitucionalidade de leis quando esta é
evidente, não deixa margem a séria objeção em contrário.
Portanto, se, entre duas interpretações mais ou menos defensáveis,
entre duas correntes de idéias apoiadas por jurisconsultos de valor, o
Congresso adotou uma, o seu ato prevalece. A bem da harmonia e do mútuo
respeito que devem reinar entre os poderes federais (ou estaduais), o Judiciário
só faz uso da sua prerrogativa quando o Congresso viola claramente ou deixa
de aplicar o estatuto básico, e não quando opta apenas por determinada
interpretação não de todo desarrazoada.
367 IV Sempre que for possível sem fazer demasiada violência
às palavras, interpreta-se a linguagem da lei com reservas tais que se
torne constitucional a medida que ela institui, ou disciplina.
(...)
373 X (...)
Cumpre ao legislador e ao juiz, ao invés da ânsia de revelar inconstitucionalidades,
mostrar solicitude no sentido de enquadrar na letra do texto antigo ao instituto
moderno. (grifamos)
58. Em apoio ao que até aqui consta, bem como a fim de arrematar o presente
parecer, mostra-se pertinente a transcrição da lição de
ALEXANDRE DE MORAES, em sua obra Direito Constitucional 5ª
ed. 1999 Editora Atlas S/A São Paulo, vazada nos seguintes
termos, verbis:
A supremacia das normas constitucionais no ordenamento jurídico e
a presunção de constitucionalidade das leis e atos normativos editados
pelo Poder Público competente exigem que, na função hermenêutica
de interpretação do ordenamento jurídico, seja sempre concedida
preferência ao sentido da norma que seja adequado à Constituição
Federal. Assim sendo, no caso de normas com várias significações
possíveis, deverá ser encontrada a significação que apresente
conformidade com as normas constitucionais, evitando sua declaração
de inconstitucionalidade e conseqüente retirada do ordenamento jurídico.
III
CONCLUSÕES
59. Ante o exposto, conclui-se no sentido da constitucionalidade das contribuições
sociais criadas pelos artigos 1º e 2º da Lei Complementar nº 110/2001,
seja formal seja material, na medida em que constituem, inegavelmente, contribuições
sociais destinadas à seguridade social.
60. Finalmente, em face da complexidade e do alcance da matéria aqui abordada,
parece recomendável seja o presente trabalho submetido à aprovação
do Exmo Sr. Ministro de Estado da Fazenda, com a sugestão
de publicação no Diário Oficial da União, a fim de servir
como orientação definitiva no âmbito deste Ministério.
É o parecer, que submetemos à consideração superior.
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, 12 de novembro de 2001. (Castruz Catramby
Coutinho Procurador da Fazenda Nacional)
De acordo.
Submeto à apreciação do Procurador-Geral Adjunto da Fazenda Nacional,
supervisor do presente trabalho.
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, 12 de novembro de 2001. (Maria Walkiria
Rodrigues de Sousa Coordenadora-Geral da Representação Judicial
da Fazenda Nacional Substituta)
De pleno acordo com o Parecer e com as sugestões apresentadas. Submeta-se
à apreciação do Sr. Procurador-Geral da Fazenda Nacional.
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, 12 de novembro de 2001. (Ditimar Souza
Britto Procurador-Geral Adjunto da Fazenda Nacional)
Aprovo as razões e as conclusões deste Parecer.
Submeta-se à aprovação do Exmo Sr. Ministro
de Estado da Fazenda, com a sugestão de que seja publicado no Diário
Oficial da União, para o fim de uniformização do entendimento
acerca da matéria, no âmbito deste Ministério.
Após, encaminhem-se cópias às unidades da PGFN.
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, 12 de novembro de 2001. (Almir Martins
Bastos Procurador-Geral da Fazenda Nacional)
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