A regulamentação da Lei nº 12.865, de 2013, que dispõe sobre a reabertura do prazo para parcelamento dos débitos tributários, impediu, ilegal e sutilmente, que fossem incluídas nessa oportunidade as dívidas parceladas nos termos da Lei nº 11.941, de 2009, mas que, por algum motivo, foram excluídas daquele primeiro parcelamento.
A Lei nº 12.865, ao prorrogar até 31 de dezembro deste ano o prazo para os novos parcelamentos, excluiu apenas "os débitos que já tinham sido parcelados" com base na Lei 11.941. Bem entendida a restrição, ela impede a inclusão no novo parcelamento apenas dos débitos cujo parcelamento esteja em vigor, como forma de evitar que, da nova inclusão, resulte um prazo superior aos 180 meses previstos na Lei 11.941.
Ao instituir proibição não prevista em lei, o regulamento restringe um direito do contribuinte
Se o parcelamento em vigor contar com 40 ou 50 meses, a nova inclusão resultaria em um prazo para pagamento de 220 ou 230 meses e não nos 180 previstos inicialmente. Isso é o que decorre da interpretação sistemática da lei e essa foi a verdadeira intenção do legislador.
A Portaria PGFN/RFB nº 7/2013 amplia a proibição prevista na Lei 12.865 para alcançar os débitos "que não estejam nem tenham sido parcelados até o dia anterior ao da publicação da Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013".
O jogo semântico do ato regulamentar que veicula uma ilegalidade consiste em admitir no parcelamento somente os débitos tributários que não "tenham sido parcelados" anteriormente. Ao instituir proibição não prevista em lei, o regulamento restringe um direito do contribuinte. E ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. É o que nos assegura a Constituição.
Para que não fosse admitida a inclusão de débitos cujo parcelamento não esteja em vigor seria preciso que a expressão "nem tenham sido parcelados" tivesse sido empregada pela lei e não pelo regulamento.
Como está na lei, é plenamente possível reincluir até 31 de dezembro de 2013 os débitos excluídos de parcelamentos anteriores porque a única finalidade da proibição constante da Lei 12.865 é impedir que o prazo de 180 meses seja prorrogado. E, como visto, isso não aconteceria caso sejam admitidos os débito excluído de parcelamento anterior.
Ainda que os débitos tenham sido pagos parceladamente por algum tempo, a exclusão do parcelamento faz com que o valor da dívida seja consolidado com todos os acréscimos. Em virtude da exclusão, os valores devidos passam a ser os existentes antes da concessão do benefício mais correção monetária, juros e multa previstos para qualquer débito tributário.
Ao ser incluído nesse novo parcelamento da Lei 12.865, os débitos que tenham sido parcelados mas que foram excluídos anteriormente serão consolidados com todos os seus acréscimos. Não haverá nenhum benefício para quem, excluído anteriormente, optar por parcelar o pagamento de seus débitos até 31 de dezembro. Até porque muitas das exclusões decorrem de falhas no preenchimento de formulários ou de uma outra irregularidade formal cometida pelo contribuinte.
As ampliações das proibições por ato regulamentar e o consequente cometimento de ilegalidades pela administração tributária são resultado do permanente estado de tensão entre o que prevê a lei e o que deseja a burocracia encarregada da arrecadação dos tributos.
É por essa e por outras razões que os contribuintes têm sido vitoriosos em várias demandas judiciais, sobretudo nesses casos de pagamento parcelado da dívida tributária.
A decisão sobre a concessão de parcelamentos fiscais é do legislador. A discordância dos órgãos encarregados de aplicar a lei não se pode manifestar na forma de proibições que inviabilizem o próprio direito concedido aos contribuintes.
As multas, os juros e a correção monetária incidentes sobre a dívida dos contribuintes são altos, desproporcionais e revelam um poder opressivo da atividade tributária capaz de inviabilizar a atividade produtiva. O que é pago por meio dos parcelamentos representa o valor efetivo do tributo e sobre ele ainda incidem alguns acréscimos. Não é possível aceitar como incontestável os pesados encargos que a administração tributária cobra de quem não paga pontualmente os tributos em nosso país.
Ibaneis Rocha
Fonte: Valor Econômico