As empresas brasileiras estão prestes a ter um ônus adicional. Caso um funcionário alegue ter desenvolvido uma doença no exercício de suas funções e a empresa não concorde, o próprio empregador terá de arcar com perícia ou recolhimento de provas indicando que o trabalho não é a causa do acidente ou da doença. Ou seja, um trabalhador que apresentar doenças que possam ser relacionadas ao seu trabalho terá o nexo ocupacional automaticamente estabelecido. A Medida Provisória nº 316, publicada este mês, estabelece que essa constatação será pressuposta.
Na prática, não é mais necessário a perícia do Instituto Nacional da Seguridade Social (
INSS) para que se tenha uma prova de que a enfermidade foi originada pela atividade do funcionário ou por um acidente de trabalho.
O especialista em direito previdenciário, Wladimir Novaes Martinez, afirma que esta medida irá trazer muitos problemas para as empresas, assim como aumentar o número de casos de afastamento por acidente de trabalho. "O governo inverteu o ônus da prova. Se a empresa silenciar, arcará com o custo de pagar os benefícios ao funcionário, assim como oferecer estabilidade por um ano. Além disso, se o trabalhador for ao INSS sem a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), emitida pela empregador, pois a empresa não concorda com o motivo, ainda pode haver a ocorrência de multa", explica.
O assessor da presidência do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis, Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas do Estado de São Paulo (Sescon), José Constantino, diz que além do aumento de custos, outra grande preocupação é a criação de estabilidade por "mera" pressuposição. "Essa medida deixa o empregador em uma situação preocupante, tanto pelo aumento dos custos, quanto por motivos jurídicos", avalia.
Martinez explica também que o benefício pago ao trabalhador, nestes casos, será o acidentário, quando o funcionário pode abrir ação civil contra a empresa. "Quando o benefício é acidentário, as decisões judiciais passam a ser na Justiça comum e a empresa ainda terá o custo de defesa", explica Martinez. Ainda segundo ele, a pressuposição não poderia ser aplicada devido a existência de diversas causas não relacionadas ao trabalho. "O trabalhador pode ter, por exemplo, ter uma predisposição genética em desenvolver determinada doença, independente do trabalho".
O advogado especialista em Direito do Trabalho do escritório Albino Advogados, Eduardo Muzzi, concorda com o aumento de custo que as empresas terão com a prova pericial e afirma também que a medida altera alguns conceitos, pois até hoje "nenhum problema físico pode ser constatado de forma presumida".
A oficialização da MP ainda depende de um decreto regulamentador do poder executivo. No entanto, já a quem aposte que isso não ocorrerá. "Não acredito que o Decreto que regulamentará esta matéria seja aprovado. Entendo que qualquer dúvida acerca da existência de nexo de causalidade será anulada na Justiça do Trabalho. A presente medida afronta os príncipios da razoabilidade, uma vez que é notório que muitos afastamentos não têm causa com acidente de trabalho. Esta medida não parece ser juridicamente compatível com o ordenamento jurídico que rege este assunto", explica a advogada do Escritório Leite, Tosto e Barros Advogados, Rúbia Cristina Vieira Cassiano.
Conseqüências
Uma das principais conseqüências apontadas pelos especialistas diante desta MP é o aumento do número de casos de acidente e doenças do trabalho. "Com certeza o número de casos irá aumentar muito", diz Muzzi. Durante o ano de 2004 foram registrados 459 mil acidentes do trabalho. Comparado com o ano anterior, o número de acidentes aumentou 15%. As doenças do trabalho representam 6% do total.
Diante dessa possibilidade Martinez avalia que haverá uma movimentação de associações e sindicatos representativos de empresas contra essa medida, assim como, "ampliar as exigências para admitir um funcionário, como por exemplo, a elaboração de um exame admissional mais rigoroso, que passe a avaliar o histórico familiar do trabalhador, a fim de evitar qualquer tipo de problema futuro".
Fonte: DCI