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Pressão da sociedade cresce e governo prepara medidas para "fatiar" mudanças

21/07/2011 11:23:42

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Pressão da sociedade cresce e governo prepara medidas para

A arrecadação de todos os impostos (federais, estaduais e municipais) pagos pelos contribuintes brasileiros deve chegar à marca de R$ 800 bilhões amanhã. É o que mostrará o Impostômetro, ferramenta criada pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) e mantida pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

De acordo com as entidades, o patamar que o recolhimento deve alcançar nesta sexta-feira acontece com 31 dias de antecedência em relação ao ano passado. Desta forma, o coordenador de estudos do IBPT, Gilberto Luiz do Amaral, prevê que a arrecadação em 2011 chegará a R$ 1,4 trilhão, cerca de R$ 200 bilhões a mais do que a de 2010. "Em tudo que fazemos, desde o momento em que acordamos, estamos pagando impostos. O sistema tributário brasileiro está excessivamente moldado para tributar o consumo. Nos países desenvolvidos, ocorre o inverso: tributa-se menos o consumo e mais a renda e o patrimônio", afirma. "A carga tributária nada mais é do que o preço que se paga pelo serviço público, e se no Brasil paga-se muito, o contribuinte deve exigir um serviço de qualidade", completa.

O IBPT calcula que a carga tributária atingiu 35,04% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010 - o resultado oficial ainda não foi divulgado. E o instituto espera que neste ano ocorra um avanço ainda maior. Se for considerada a previsão de que a economia crescerá 4% em 2011 ante o ano passado, isto indica que a carga tributária ficará a 36,6% do PIB, caso a projeção de arrecadação do IBPT se confirme.

Frente a este cenário, o governo ensaia mais uma tentativa de reformar o sistema tributário. A proposta da equipe econômica é implementar aquela que o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, chamou de "reforma fatiada". Ou seja, as mudanças podem ser graduais. Contudo, tudo indica que a presidente Dilma Rousseff terá de enfrentar o mesmo desafio dos seus antecessores: a falta de consenso acerca das mudanças. Empresários, líderes setoriais e especialistas apontam diferentes prioridades, o que dificulta a decisão.

O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, por exemplo, acredita que a desoneração da folha em todos os setores pode prejudicar a economia do Brasil, motivo pelo qual uma solução, na sua opinião, é começar a desoneração pela indústria. "Se desonerar todos os setores, o impacto [nas contas públicas] seria de R$ 90 bilhões. Somente no caso da indústria, esse prejuízo seria menor [R$ 18 bilhões], de modo a que o governo possa melhor resolver essa situação", justificou.

Já o secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, Andrea Calabi, critica a proposta de desonerar a folha de pagamento. Para ele, essa mudança poderá aumentar a carga tributária, uma vez que em contrapartida o governo quer tributar o faturamento das empresas com PIS e Cofins.

Para o secretário, assim como afirmou ao DCI o governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), a definição da alíquota de imposto cobrado na importação pelos estados deveria ser priorizada dentro da reforma tributária, para evitar um êxodo de empresas para fora do País. Calabi acredita que a implementação de uma alíquota de 2% a 4% na importação em todos os estados seria solução ideal.

Porém, o maior embate para a conclusão da reforma, que, na opinião de Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal, pode ser resolvido com matéria de lei complementar, sem alterar a constituição, é a redução e unificação das alíquotas de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) interestaduais e na importação.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que o governo está "focado" no ICMS. E que estados mais reticentes em aceitar a proposta de redução da alíquota, como os do norte e nordeste, já sinalizam acordo. "Eu acredito que em pouco tempo poderemos ter um acordo para a reforma do ICMS no Brasil."

Não é de hoje que a obtenção de consenso encontra dificuldade nos estados, principalmente nas Regiões Norte e Nordeste. "Em todas as propostas de reforma passadas, a questão do ICMS emperra as discussões", contextualiza Paulo Sigaud, sócio do Aidar SBZ Advogados.

Os governadores pedem formas de compensação em caso de perda de receita - em muitos estados, o ICMS é a principal arrecadação. O governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), explicou ao DCI que "para se ter uma reforma tributária no Brasil, precisa-se levar em consideração às disparidades regionais e a necessidade de criar um fundo de equalização dessas diferenças". "Criar um fundo de desenvolvimento regional que possibilite gerar recursos para investimento e financiamento a fim de que os estados, que hoje dependem de políticas fiscais mais agressivas, possam ter alternativas depois de realizada essa reforma", disse o governador.

Para tentar resolver o quanto antes as alterações do sistema tributário, o governo está disposto a negociar contrapartidas. Recentemente, o secretário da Fazenda do Paraná, Luiz Carlos Hauly, anfitrião da 142ª reunião do Conselho de Política Fazendária (Confaz), afirmou ao DCI que breve haverá acordos quanto às alterações das regras de ICMS. De acordo com ele, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, (que participou do encontro), "deixou claro" que o governo pode realmente criar fundo de desenvolvimento regional.

Além disso, ele também comentou que logo poderá ter uma definição para a alíquota interestadual do ICMS e para a alíquota de importação dos estados. "Pedimos uma redução da taxa para 4% de ambas as cobranças", afirmou. Atualmente, essas alíquotas variam de 12% a 7%, dependendo do estado brasileiro.

Guerra Fiscal

Na opinião de especialistas, essas alterações no modelo do ICMS podem acabar com a chamada guerra fiscal, em que estados concedem benefícios fiscais considerados inconstitucionais.

Maciel analisa que o problema da diversidade de alíquota não é o que gera a chamada guerra fiscal. "Guerra fiscal decorre de algo comum no Brasil que é o descumprimento de lei. A lei complementar de 24 de janeiro de 1995 diz que qualquer forma de benefício fiscal só pode ser concedida pela unanimidade do secretário de Fazenda do Conselho Nacional de Política Fazendária [Confaz]. E desde 1988, a regra é descumprida", diz.

De acordo com ele, a lei não é verdadeiramente aplicada, pois "a guerra fiscal é um dos maiores exemplos de hipocrisia nacional". "Os estados que se dizem prejudicados não tomam nenhuma medida concreta a não ser medidas superficiais ou midiáticas. O Ministério Público diz que o assunto não é com ele. E o Tribunal de Contas, que tem obrigação, por força da Lei Complementar, de estabelecer regularidade da prestação de contas, nem sequer conhece o assunto. Todos condenam e ninguém se move."

Recentemente o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucionais leis de seis estados e do Distrito Federal que concederam benefícios relativos ao ICMS. Ao decidir 14 ações diretas de inconstitucionalidade, os ministros concluíram que estavam configurados casos de guerra fiscal. Contudo, segundo levantamento realizado pelo IBPT, a dívida das empresas, caso os estados, que não podem mais conceder benefícios, resolvam cobrá-la, representa um passivo de mais de R$ 250 bilhões.

"Está na hora de alguém ver que a lei está errada. Competição fiscal sempre existiu. Precisava ter nova lei para estabelecer regras de competição fiscal lícita. Zona Franca de Manaus é um exemplo disso. Pode desagradar, mas é constitucional", aponta Everardo Maciel.

Setor privado

Por sua vez, empresários e especialistas afirmam que para se fazer uma reforma as mudanças devem passar pela redução da carga tributária. "A carga tributária brasileira é, de fato, muito alta, e nosso sistema fiscal penaliza o setor produtivo ao tributar fortemente o valor adicionado", reconhece o secretário da Fazenda de São Paulo. "Tributamos o valor adicionado, a produtividade, muito mais que a renda. Assim, corremos o risco de sacrificar nossa capacidade produtiva e nossa competitividade."

Outro estudo do IBPT apontou que aumento da carga tributária brasileira subtraiu R$ 1,85 trilhão da sociedade nos últimos 10 anos. Exemplo disso, segundo o advogado e especialista em tributos Edson Pinto, é que em razão dos impostos, o consumidor pode chegar a pagar três vezes a mais por um produto.

Para o economista Paulo Rabello de Castro, coordenador do Movimento Brasil Eficiente, "se não é possível por enquanto chegar a um consenso para realizar uma mudança completa e abrangente, que o Brasil consiga ao menos implementar uma reforma da reforma, que simplifique a estrutura tributária do País e permita crescimento eficiente do PIB e expansão dos investimentos necessários em infraestrutura nos próximos anos".

Por essas múltiplas prioridades o governo observa que não há outro jeito a não ser fazer uma "reforma fatiada". Everardo Maciel considera positiva esta proposta. "Reforma tributária não é um evento, é um processo. Ela exige mudanças todos os dias, porque as circunstâncias e as necessidades mudam. Acho que é um equívoco definir quando será implantada, porque realizar isso não é simples", explicou.

Para ele, "todo o tempo tem que ser feita uma alteração". "Exemplo disso foi que a maior reforma contemporânea do Imposto de Renda do mundo foi feito no Brasil em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso (1994 a 2001) - quando Maciel era secretário da Receita", lembra.

O presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e de Assessoramento no Estado de São Paulo (Sescon-SP), José Chapina Alcazar, julga perigoso fatiar o projeto. Para ele, o sistema tributário do Brasil já é bastante retalhado, e a proposta, da forma como tem sido colocada, não atende às necessidades do País. "A reforma tributária deve ser pensada no todo e debatida com a sociedade. Do contrário, haverá perdas de qualquer maneira", diz.

História

Especialistas apontam indícios de que a reforma tributária pode acontecer ainda no mandato de Dilma. Para o sócio do Aidar SBZ, esta é a primeira vez em duas décadas que se têm propostas "abrangentes".

"Desde o governo de Fernando Collor de Melo [presidente de 1990 até 1992] não se propõe reforma abrangente. Essa proposta do governo de Dilma parece ser a primeira mais contundente desde aquela época", analisa Sigaud.

De fato, nos 50 anos da criação do sistema tributário no Brasil poucas mudanças foram efetuadas. De acordo com informações do Tesouro Nacional, baseadas em monografia premiada pelo órgão, na proposta de reforma tributária do governo de Collor, por exemplo, paralisada pelo impeachment que o presidente sofreu em 1992, destaca-se a tentativa de extinção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto sobre Serviços (ISS), que vigoram desde a Constituição de 1966, que seriam incorporados ao ICMS, e se tornariam um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) estadual. Além disso, o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) seria extinto, bem como a Contribuição Social sobre o Faturamento (Cofins) e a Contribuição ao Programa de Integração Social do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep). Essas contribuições existem desde a década de 1990, e o IOF, desde 1966.



Fonte: DCI

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