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Autonomia monetária

“Moeda única” para países da América Latina não é viável; especialistas explicam

Criação da moeda única, defendida por Lula e Guedes, reduzindo autonomia monetária de países da América Latina.

17/05/2022 11:30:02

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“Moeda única”  para países da América Latina não é viável

“Moeda única”  para países da América Latina não é viável; especialistas explicam Foto: João Geraldo Borges Júnior/Pixabay

A implementação de uma “moeda única” para os países latino-americanos, é um debate em alta nos últimos dois anos. O tema já foi defendido tanto pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto pelo atual ministro da Economia, Paulo Guedes.

Mas a ideia esbarra em uma realidade ainda distante da ideal para a implementação, segundo especialistas ouvidos pelo CNN Brasil Business.

A proposta, na prática, é que os países abrissem mão do real, peso ou bolívar, e adotassem uma mesma moeda oficial como meio de pagamento para transações comerciais dentro e fora de suas fronteiras.

O economista da Eleven Financial, Thomaz Sarquis, diz que não há sentido em criar uma política monetária única nem para o Mercosul e nem para a América Latina. 

“O grande problema é a falta de autonomia monetária. Quando o Banco Central Europeu sobe os juros, por exemplo, a alta vale para toda a moeda euro. No nosso caso, em uma política como esta, o Brasil estaria dependente da situação fiscal da Argentina para definir o aumento dos juros, visto que o risco seria percebido como sendo do bloco.”

Para ele, a diferença entre as economias é essencial. “Ainda que nossa política fiscal não seja um exemplo para os demais países, temos uma moeda mais estável do que a da Argentina.”

Para o PhD em economia pela Cornell University, Marcelo Kfoury, além da disparidade entre os países da América Latina, o bloco econômico do Mercosul ainda não evoluiu como ocorreu com a União Europeia, que alcançou uma integridade e proximidade econômica entre os participantes do bloco.

O professor de economia da FEA-USP, Simão Silber, diz que existe uma facilidade maior para a Europa por conta da maior integração de seus participantes e da própria condição geográfica.

Além disso, ele também cita que, para chegar à moeda única, seria preciso uma política de livre comércio e um imposto comum em todos os países. Silber ainda reforça que o estabelecimento da moeda comum representa a etapa final de um processo de integração econômica ainda inicial na região, com volume de comércio interno bem menor que o da zona do euro.

O especialista diz também que não acredita na possibilidade de uma moeda única proporcionar a independência em relação ao dólar. 

“A América Latina ainda está em desenvolvimento, tem renda média, é difícil tomar uma posição que hoje é ocupada pelo dólar”.

Procuradas pela CNN, tanto a comunicação de Lula como de Paulo Guedes disseram que não iriam comentar o tema.

Como funcionaria a implementação de uma moeda única

Os especialistas dizem que o principal exemplo ao pensar em moeda única é o euro, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 1999 e hoje serve como moeda oficial dos 19 países da zona do euro, todos eles membros da União Europeia, caso da Alemanha, França, Portugal e Espanha. 

Mas nem todos os membros do bloco aderiram ao euro e abriram mão de suas moedas e políticas monetárias.

Antes de sair da UE, o Reino Unido já havia optado por manter o uso da libra, caso semelhante ao da Dinamarca. Outros países membros, como a Bulgária e a Croácia, não atingiram ainda as condições econômicas demandadas para integrar a zona do euro e, por isso, não podem adotar a moeda.

A emissão do euro é controlada por um banco central comum a todos os integrantes da zona, o Banco Central Europeu (BCE). Por causa disso, ele também é responsável pela política monetária de todos esses países.

Segundo o BCE, a principal vantagem do euro é tornar mais simples “trabalhar, negociar, viajar, estudar e viver no estrangeiro”, aumentando a integração econômica entre os países.

A autarquia afirma que uma moeda única “facilita as trocas comerciais entre empresas de países diferentes, melhora o desempenho econômico e possibilita uma maior escolha e mais oportunidades aos consumidores”.

A adoção de uma moeda única, porém, exige que seus países membros cumpram “objetivos comuns” de estabilidade, crescimento e emprego de modo que os impactos da política monetária geral não sejam muito diferentes para cada membro.

A responsabilidade por atingir esses objetivos é do governo de cada país, mas o não cumprimento pode levar a sanções.

E a criação do euro também não foi um processo simples. As discussões sobre criar uma moeda única para aumentar a integração entre os países europeus começaram no fim da década de 1960, antes mesmo da União Europeia existir.

Mas a proposta oficial de criação de uma “União Econômica e Monetária”, com uma moeda comum, viria apenas em 1988. Foi acordado, então, o estabelecimento da união em três fases, criando um arcabouço jurídico e monetário para a implementação.

Apenas na última, iniciada em 1999, que o euro foi introduzido e foram fixadas taxas de câmbio para as moedas de cada país em relação à nova. Por três anos, o euro serviu apenas para pagamentos eletrônicos e balanços contábeis, até que, em 2002, passou a circular oficialmente e ser usado pela população desses países.

Mesmo sendo a mais famosa, o euro não é a única moeda comum em circulação pelo mundo. Há ainda os casos do dólar do Caribe Oriental, adotado por oito países, o franco CFA da África Ocidental, de oito países, e o franco CFA da África Central, de seis, todos com origens ligadas à substituição de moedas usadas durante a colonização por países europeus.

Segundo Silber, para implementar uma política de moeda única na América Latina, os países precisariam abdicar de seus respectivos bancos centrais.

“Ficaria criado um banco central sul-americano que emitiria a moeda. Então, todos os países perdem soberania, a capacidade de emitir moeda, e perdem também a capacidade de influenciar na taxa de câmbio, já que é esse banco central que influencia”.

Fonte: com informações da CNN

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