A cachaça, assim como todas as outras bebidas alcoólicas, possui uma alta carga tributária no Brasil. Mas, tratando-se de um produto 100% nacional, é curioso constatar que a bebida seja a mais onerada da lista, ocupando o primeiro lugar do ranking mesmo em comparação com alternativas importadas.
Segundo dados do Impostômetro, a cachaça carrega uma tributação expressiva de 81,87%, seguida pela caipirinha, com 76,66%, e pelo uísque, com 67,03%.
“Para entender o motivo pelo qual a bebida ocupa tal lugar, é preciso analisar alguns pontos. Podemos citar, primeiramente, o princípio da essencialidade, que eleva ou diminui a alíquota de itens e serviços, de acordo com o seu caráter essencial. Bebidas alcoólicas, como são consideradas supérfluas e nocivas para a saúde, consequentemente são mais oneradas”, explica o Tax Director da Sovos Brasil, Giuliano Gioia.
“O princípio da seletividade ou essencialidade se aplica no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), e também pode ser aplicado no ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços). Mas, são somente eles que mais impactam no valor do produto para o consumidor final”, explica o executivo.
Rotas ilegais
As bebidas alcoólicas acumulam as alíquotas majoradas de PIS (Programa de Integração Social), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), e IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).
Tamanha incidência de tributos, federais e estaduais, associada ao cenário socioeconômico desafiador desestimulam a legalização do setor, que sofre com o aumento do mercado ilegal.
A informalidade do comércio de bebidas destiladas representa fatia de 36% do total comercializado no país e, segundo o Ibrac (Instituto Brasileiro da Cachaça), são consumidos cerca de 112 milhões de litros de cachaça ilegal por ano.
Além de possíveis danos à saúde do consumidor, o mercado ilegal impacta negativamente a economia como um todo.
Minas Gerais, o maior produtor de cachaça de alambique do país, tem adotado medidas de combate à clandestinidade. A Operação Cachaça Batizada, realizada pela Polícia Civil do estado (PCMG), em apoio ao Ministério da Agricultura e Agropecuária (Mapa) e ao Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), fecha fábricas clandestinas e apreende milhares de litros de cachaça fabricados ilegalmente.
Além disso, o Sindicato das Indústrias de Cerveja e Bebidas em Geral do Estado de Minas Gerais (SindBebidas) lançou o aplicativo Cachaça Ilegal, que possibilita a denúncia anônima da produção e comercialização ilegal da bebida.
Corrida Fiscal
O governo federal segue adotando medidas que impactam diretamente na tributação das bebidas alcóolicas. Em fevereiro deste ano, o governo anunciou corte de 35% nas alíquotas de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), abrangendo, também, o setor de bebidas.
Apesar da boa notícia para o setor, a medida beneficiou, sobretudo, as grandes empresas, não impactando grande parte dos produtores de cachaça, que optam pelo Simples Nacional como regime de tributação. Estima-se, inclusive, que 90% dos produtores sejam registrados nesta categoria.
A PEC 110/19 é uma das propostas em trâmite da Reforma Tributária, e prevê a criação do Imposto sobre Bens e Serviços em substituição à cobrança de cinco tributos diferentes. A proposta prevê, ainda, a criação do Imposto Seletivo, sob o qual a cachaça e as demais bebidas alcoólicas estariam classificadas.
O receio é que a criação do Imposto Seletivo prejudique ainda mais o setor, aumentando a carga fiscal da bebida. Por isso, representantes do setor produtivo lutam pela exclusão da cachaça nesta categoria e para que a alíquota do imposto seja cobrada de acordo com o teor alcoólico dela.
“Há todo um estigma em cima da cachaça, mas é preciso ter uma visão ampla da importância econômica de sua cadeia produtiva, que gera empregos e renda. Além disso, um alambique com investimentos pode produzir uma gama de produtos derivados da cana-de-açúcar, como o melado, rapadura, açúcar mascavo, entre outros. Estes são alguns dos fatores que precisam ser levados em conta na proposta, que deve chegar em um consenso que beneficie a todos, nos contextos social e econômico”, comenta Giuliano.
Fonte: Sovos Brasil