Muitas vezes, em época de crise, as empresas focam suas energias no negócio e se esquecem da relevância da administração tributária, afirma Sérgio Agricio Kubiak, sócio da divisão de consultoria tributária da Terco Grant Thorton. "Agora, como na época da megadesvalorização do real, nos anos 90, a principal preocupação das empresas mais experientes são os reflexos fiscais da variação cambial", afirma. Ele lembra, no entanto, que naquela crise o governo autorizou empresas que tiveram perdas cambiais a diferirem as despesas financeiras, com dedutibilidade fiscal garantida. "Assim, as empresas sem problemas no balanço contábil tinham o patrimônio líquido majorado, o que maximizava o pagamento de juros sobre o capital próprio", diz. Sem medidas dessa espécie até agora, o consultor afirma que as empresas vêm buscando planejamentos tributários que resultem, ao menos, no diferimento do recolhimento de tributos como a alteração do regime de tributação de competência para o de caixa.
O aumento da demanda por planejamentos tributários também vem sendo sentido pela KPMG do Brasil. Marienne Munhoz e Diogo Ruiz, da área tributária da empresa de consultoria e auditoria, afirmam que enquanto algumas áreas da KPMG brasileira foram afetadas com o adiamento de serviços prestados, outras são atingidas de forma positiva - como a de planejamento tributário. "Aumentou o interesse pelo aproveitamento de incentivos fiscais, por exemplo", diz Marienne. Já Ruiz, afirma que algumas empresas estão fazendo uma revisão nos cálculos dos preços de transferência para, talvez, adotar outros métodos ao considerar os reflexos tributários. "Na medida que o câmbio sobe muito, aumenta o custo das importações, o que comprime a margem de lucro das empresas", explica.
Com a falta de crédito, as empresas buscam economizar o máximo possível e questionam se os controles internos adotados em relação aos tributos que recolhem são adequados ou se é possível fazer algum planejamento tributário. "Qualquer crédito que não seja apropriado influi na formação do custo e, conseqüentemente, é repassado ao preço do produto, em caso de tributos indiretos", explica o advogado Camilo Gribl, do escritório Marques e Gribl Advogados. "Principalmente em relação ao PIS e à Cofins ainda há dúvidas quanto à adequada apropriação de créditos", diz. No momento, o escritório faz essa revisão para três empresas dos setores de metalurgia e químico.
Com a redução ou a suspensão de novos negócios, a preocupação dos clientes do escritório TozziniFreire agora é com os procedimentos que as empresas adotam para, por exemplo, distribuir mercadorias. "As empresas estão repensando se vale a pena, por exemplo, usar armazém geral ou ter filial para vender em outro Estado, o que pode implicar em consequências quanto ao recolhimento do ICMS", afirma a advogada coordenadora da área tributária da banca, Ana Cláudia Utumi. Ela diz ainda que várias empresas estrangeiras discutem como fazer para repatriar recursos que estão no Brasil. "Verificam onde pode ter caixa para realocar para a empresa que mais necessita, com base em tratados para evitar a bitributação", diz.
Além disso, estão voltando com força os questionamentos judiciais tributários. A tributarista do TozziniFreire afirma que entre as grandes empresas com perdas cambiais, algumas que estavam esperando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir definitivamente sobre disputas tributárias em curso estão preferindo ajuizar ações com pedidos de liminares já, por exemplo, em relação ao Imposto Sobre Serviços (ISS) na base de cálculo da Cofins.
O volume de consultas de empresas que buscam redução na carga tributária é hoje até maior do que nos anos em que os novos negócios eram a principal atividade dos grandes escritórios de advocacia, segundo o coordenador de tributário da banca Pinheiro Neto, José Roberto Pisani. "Estamos examinando a estrutura de um grupo brasileiro, que tem filial na China e nos Estados Unidos, para ver se uma mudança na logística do grupo pode beneficiá-lo em relação à carga tributária", adianta. Pisani também percebe entre as exportadoras um aumento na demanda do contencioso tributário como uma tentativa de compensar as perdas com câmbio. "Estamos sendo procurados por empresas que querem discutir a CSLL sobre as exportações, por exemplo", diz.
O aumento do interesse das empresas em questionar a incidência da CSLL sobre as receitas de exportação também é sentido pelo advogado Périsson Lopes de Andrade, da New Trust Consultoria Empresarial. Andrade explica que o fato de já haver duas liminares do Supremo favoráveis à Embraer e à Bunge fez com que empresas dos setores de agronegócios, máquinas industriais e autopeças, que esperavam a decisão definitiva do pleno da corte, retomassem o assunto. "Essas empresas esperam que uma ordem judicial desonere de imediato suas receitas de exportação", diz o advogado. Segundo Périsson, nessas discussões o que se pede é a desoneração, sem que seja dada qualquer garantia, para que a empresa seja capitalizada. "Mas se a liminar não for confirmada em mérito pelo Supremo, a empresa deverá pagar o valor devido da contribuição, atualizado, em 30 dias, a contar da cassação da liminar", alerta. "Depois, começa a correr multa de 0,33% ao dia, limitada a 20% do devido."
O aumento de demanda no contencioso também é visto no escritório Mattos Filho Veiga Filho Marrey Jr. e Quiroga Advogados. "Por conta de autos de infração, as empresas vão a em juízo para não pagar determinado tributo, já que sentem a escassez de crédito atual", afirma o sócio Roberto Quiroga. "No geral, são discussões baseadas em teses sobre as quais a empresa esperava o Supremo se posicionar em definitivo", diz.
O adiamento de prazos para pagamento de alguns tributos federais, anunciado ontem pelo governo, poderá evitar o custo do planejamento tributário para algumas empresas. Segundo Gilberto Luiz do Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a medida também é muito adotada nessa época porque as vendas se multiplicam no Natal, embora a maioria seja a prazo. "Com isso, e sem o adiamento de prazos, há maior pressão no fluxo de caixa das empresas, o que as obriga a buscar novos planejamentos tributários", diz Amaral.
Fonte: Valor Econômico
Enviado por: Wilson Fortunato