A partir de 1º de julho de 2025, supermercados, farmácias, concessionárias e outros estabelecimentos comerciais só poderão funcionar em feriados mediante acordo coletivo firmado entre empregadores e sindicatos dos trabalhadores. A determinação consta em portaria do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que revoga norma anterior da gestão federal passada.
A medida afeta diretamente 12 atividades do setor comercial e tem gerado forte reação de empresários, parlamentares da oposição e entidades patronais, que buscam adiar a vigência da nova regra ou apresentar uma proposta alternativa ao governo federal.
A decisão do governo Lula (PT) altera a Portaria nº 671/2021, editada na gestão de Jair Bolsonaro (PL), que permitia a abertura do comércio em feriados sem a necessidade de convenção coletiva. Com a nova portaria, publicada em 2023, a exigência volta a valer para algumas categorias específicas do comércio.
Setores afetados e exceções previstas na nova regra
A portaria do MTE restabelece a obrigatoriedade de convenção coletiva para 12 atividades comerciais, entre elas supermercados, farmácias, açougues, hortifrutis, revendas de veículos e o comércio varejista em geral. As demais 110 atividades listadas na norma anterior — como indústrias, hotéis, transporte, call centers, construção civil e educação — permanecem autorizadas a operar sem convenção em feriados.
A exigência do acordo coletivo tem como objetivo garantir contrapartidas aos trabalhadores escalados para trabalhar nos feriados, como folgas compensatórias, pagamento adicional e vale-alimentação, segundo o Ministério do Trabalho.
Caso a portaria entre em vigor conforme previsto e seja descumprida, os empregadores estarão sujeitos a sanções administrativas, incluindo multas. A fiscalização caberá aos auditores fiscais do trabalho.
Pressão do setor produtivo pode adiar entrada em vigor
Entidades patronais e bancadas parlamentares ligadas ao setor produtivo intensificaram a pressão para que o governo prorrogue a entrada em vigor da portaria. Até o momento, a vigência da regra foi adiada quatro vezes.
No início de maio, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, reuniu-se com representantes da Frente Parlamentar de Comércio e Serviços (FCS) e da União Nacional de Entidades de Comércio e Serviços (Unecs). Na ocasião, os representantes se comprometeram a apresentar, até 3 de junho, uma contraproposta à medida.
De acordo com o deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), presidente da Frente Parlamentar de Empreendedorismo (FPE), o ministro demonstrou abertura para considerar uma nova prorrogação. A proposta alternativa está sendo articulada também pelo deputado Luiz Gastão (PSD-CE), presidente da Federação do Comércio do Ceará (Fecomércio-CE), embora os detalhes ainda não tenham sido divulgados.
Implicações jurídicas e insegurança para empregadores
A nova portaria é sustentada pela Lei Federal nº 10.101/2000, que prevê que o trabalho em feriados no comércio depende de convenção coletiva. A portaria de 2021, editada no governo anterior, contrariava essa norma ao dispensar a exigência de acordo, conforme argumenta o MTE.
“Uma portaria não pode se sobrepor a uma lei”, explica a advogada e membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/PR, Natalia Guazelli. Segundo ela, a coexistência das duas normas criou insegurança jurídica tanto para empregadores quanto para fiscais do trabalho.
“Os empregadores alegam respaldo na norma de 2021, enquanto os auditores têm dificuldade para aplicar sanções com base na legislação anterior à portaria do governo Bolsonaro”, afirma Guazelli.
Impacto financeiro para empresários e necessidade de planejamento
Para empresários, a exigência de convenção coletiva representa aumento de custos operacionais, especialmente para pequenos negócios em regiões onde não há sindicatos atuantes ou estrutura para negociar.
“O setor empresarial vê a medida com preocupação porque aumenta os custos e torna inviável manter as operações em algumas localidades, como cidades pequenas sem representação sindical ativa”, pontua Guazelli.
A necessidade de planejamento também é destacada por especialistas, já que, com a nova regra, as empresas precisarão antecipar negociações com sindicatos para garantir o funcionamento regular nos feriados.
Perspectiva dos trabalhadores e retomada da negociação coletiva
Do ponto de vista dos trabalhadores, a retomada da exigência de convenção coletiva é vista como uma medida de proteção aos direitos trabalhistas. O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da CUT (Contracs/CUT), Julimar Roberto de Oliveira, defende que o acordo entre as partes é essencial para evitar abusos.
“A negociação coletiva garante que o trabalhador receba contrapartidas justas, e a portaria atual apenas reforça o que a lei já estabelece”, argumenta Oliveira.
Reforma trabalhista e queda nas contribuições sindicais
Desde a reforma trabalhista de 2017, as contribuições sindicais deixaram de ser obrigatórias. Segundo dados do MTE, a arrecadação dos sindicatos caiu de R$ 3 bilhões em 2017 para R$ 57,6 milhões em 2024, uma redução de 98,1%.
A perda de receita enfraqueceu a capacidade de negociação de muitos sindicatos, o que também é apontado como um fator que dificulta o cumprimento da nova exigência.
O deputado Joaquim Passarinho informou que o projeto em discussão poderá incluir um novo modelo de financiamento sindical, tanto para entidades patronais quanto laborais, para viabilizar as convenções e garantir o equilíbrio nas negociações.
Previsão legal para o trabalho aos domingos
Vale destacar que, apesar da restrição para feriados, o trabalho aos domingos continua permitido sem necessidade de convenção coletiva, conforme a própria Lei nº 10.101/2000. A norma estabelece que, a cada três semanas, os trabalhadores devem ter um domingo de descanso garantido.
O professor de direito Jorge Luiz Souto Maior ressalta que a Constituição garante o direito ao descanso comum, especialmente aos domingos e feriados, como forma de preservar o convívio social e comunitário.
“Em países como a Alemanha, por exemplo, o comércio é proibido de funcionar nesses dias por essa razão”, afirma.
Quais atividades precisarão de convenção coletiva para abrir em feriados
Veja a seguir as atividades comerciais que precisarão de convenção coletiva para funcionar em feriados, de acordo com a nova portaria do Ministério do Trabalho:
- Comércio varejista de peixes e frutos do mar;
- Açougues e comércio de carnes frescas;
- Hortifrutigranjeiros;
- Farmácias e drogarias, incluindo de manipulação;
- Supermercados e hipermercados com venda de alimentos;
- Comércio de artigos regionais em estâncias hidrominerais;
- Comércio em portos, aeroportos e rodoviárias;
- Comércio em hotéis;
- Atacadistas e distribuidores de produtos industrializados;
- Revendas de veículos automotores e similares;
- Comércio varejista em geral.
O que esperar nos próximos meses
Com a apresentação da proposta alternativa prevista para junho e a possibilidade de nova prorrogação da vigência da portaria, o cenário ainda está em aberto. Empresários, sindicatos e o governo continuam em diálogo, enquanto empregadores aguardam uma definição para ajustar suas operações nos feriados do segundo semestre de 2025.
O Portal Contábeis seguirá acompanhando o desdobramento da medida e orienta os profissionais da contabilidade a ficarem atentos às atualizações legais e às convenções firmadas localmente, que impactam diretamente o planejamento tributário, trabalhista e operacional das empresas.
Com informações do g1 Trabalho e Carreira