A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 5700/2023, que autoriza pessoas físicas a destinarem parte de suas doações dedutíveis no Imposto de Renda (IR) a instituições de longa permanência que atendem pessoas com deficiência com mais de 18 anos. A proposta foi apresentada pela deputada Any Ortiz (Cidadania-RS) e recebeu parecer favorável do relator, deputado Duarte Jr. (PSB-MA).
Se aprovada, a medida altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que atualmente disciplina a aplicação dos recursos dos fundos dos direitos da criança e do adolescente exclusivamente em projetos voltados a este público.
“O projeto de lei é fundamentado em um problema social real: as instituições de acolhimento que atendem pessoas com deficiência, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade e abandono, enfrentam grandes dificuldades financeiras”, justificou Duarte Jr.
Ampliação do alcance dos fundos da criança e do adolescente
Os fundos dos direitos da criança e do adolescente foram instituídos pelo ECA com a finalidade de financiar ações voltadas à promoção, proteção e defesa dos direitos de crianças e adolescentes em situação de risco social. A aplicação dos recursos é monitorada pelos conselhos de direitos em nível nacional, estadual, distrital e municipal.
Atualmente, contribuintes pessoas físicas podem deduzir até 6% do Imposto de Renda devido com doações a esses fundos, respeitados os limites estabelecidos na legislação tributária. Com a alteração proposta, parte desses recursos poderá ser destinada, adicionalmente, a instituições de longa permanência voltadas ao atendimento de pessoas com deficiência maiores de idade.
A medida busca dar amparo legal a uma demanda social que já mobiliza doadores e entidades assistenciais, mas que hoje encontra restrições normativas para acesso aos recursos incentivados.
Justificativa foca na vulnerabilidade e abandono
De acordo com o relator, a proposta atende a uma realidade enfrentada por milhares de instituições que acolhem pessoas com deficiência em condição de vulnerabilidade, especialmente adultos que já não se enquadram nas faixas etárias de atendimento exclusivo da política da infância.
“Essas entidades são frequentemente sustentadas por doações privadas e ações voluntárias, sem uma política fiscal robusta que incentive a solidariedade e a garantia de continuidade desses serviços”, acrescentou Duarte Jr.
A ausência de um mecanismo fiscal específico para essas entidades gera instabilidade financeira e limita a expansão de vagas em centros de acolhimento, muitos dos quais funcionam com capacidade reduzida diante da alta demanda.
Tramitação segue para outras comissões
O projeto ainda precisa passar por outras três comissões da Câmara dos Deputados antes de seguir ao plenário e eventual análise pelo Senado Federal. As próximas etapas incluem a apreciação pelas comissões de:
- Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família;
- Finanças e Tributação;
- Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ).
A tramitação ocorre em caráter conclusivo, o que significa que, se aprovado em todas as comissões, poderá seguir diretamente para o Senado, sem necessidade de votação em plenário, a menos que haja recurso.
Impacto fiscal ainda precisa ser analisado
Embora o projeto amplie o alcance de uma política já existente, a mudança pode trazer impactos fiscais indiretos, já que amplia o rol de beneficiários que podem receber recursos incentivados. A Comissão de Finanças e Tributação será responsável por analisar a adequação orçamentária da proposta.
Hoje, o incentivo à doação permite ao contribuinte pessoa física deduzir até 6% do IR devido, somados todos os incentivos, incluindo os fundos da criança e do adolescente, fundos do idoso, projetos culturais e esportivos.
Segundo especialistas em planejamento tributário, a possibilidade de ampliação da destinação de recursos pode gerar maior mobilização da sociedade civil, sem, necessariamente, provocar aumento relevante de renúncia fiscal, já que apenas redistribui as opções de destinação dentro do mesmo limite de dedução.
Repercussão entre profissionais contábeis
Para contadores, a aprovação da proposta exigirá atenção adicional na orientação aos contribuintes durante a elaboração da declaração do Imposto de Renda. A eventual nova regra ampliará as possibilidades de planejamento tributário dentro dos incentivos fiscais permitidos.
Atualmente, muitos contribuintes desconhecem as possibilidades de destinação de parte do IR devido a fundos sociais. Com a inclusão das instituições de longa permanência para pessoas com deficiência maiores de idade, o leque de opções será ampliado.
“Essa ampliação exigirá maior divulgação e capacitação dos profissionais da contabilidade, de modo a orientar clientes sobre as novas possibilidades de exercício da cidadania fiscal com o uso de doações dedutíveis”, avaliam especialistas.
Contexto social amplia pressão por novas fontes de financiamento
O envelhecimento da população com deficiência e a ausência de políticas públicas suficientes para o atendimento integral dessa parcela da sociedade têm elevado a pressão sobre instituições privadas e filantrópicas. Muitas dessas entidades, além de lidarem com custos elevados de manutenção, enfrentam dificuldades na captação de recursos diante da competição com outras demandas sociais.
Segundo dados do IBGE, o Brasil conta com aproximadamente 18,6 milhões de pessoas com deficiência, sendo que parcela expressiva já ultrapassou os 18 anos e carece de atendimento continuado em instituições especializadas.
Medida não altera limites de dedução
Importante destacar que o projeto não propõe alteração no limite global de dedução de 6% já existente para as doações incentivadas no Imposto de Renda. A proposta apenas acrescenta um novo tipo de entidade destinatária dentro do mesmo universo de fundos sociais já reconhecidos pela legislação.
Assim, a mudança não amplia a renúncia fiscal do governo federal, mas redistribui as possibilidades de alocação de recursos dentro de um instrumento já consolidado e operado com supervisão dos respectivos conselhos de políticas públicas.
Próximos passos podem definir calendário de entrada em vigor
Caso o projeto de lei avance nas comissões restantes ainda em 2025, há possibilidade de que a nova regra já possa ser aplicada nas declarações de Imposto de Renda Pessoa Física referentes ao exercício de 2026, ano-base 2025, desde que aprovada e sancionada a tempo.
O acompanhamento da tramitação legislativa será essencial para contadores, entidades sociais e contribuintes que desejarem organizar doações dedutíveis dentro dos novos parâmetros legais.
O avanço do Projeto de Lei 5700/2023 representa um passo importante na tentativa de fortalecer o financiamento de instituições de acolhimento a pessoas com deficiência adultas. Para profissionais contábeis, a eventual aprovação exigirá atualização permanente diante das mudanças no uso dos incentivos fiscais no Imposto de Renda.