O projeto de lei que altera as regras do Imposto de Renda (IR) pode provocar uma redução de aproximadamente R$ 9,5 bilhões nas receitas municipais, sem previsão de compensação suficiente para os cofres das cidades brasileiras. O alerta foi feito nesta terça-feira (17) pela presidente da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf), Michele Roncálio, durante audiência na comissão especial que analisa o Projeto de Lei (PL) 1087/25 na Câmara dos Deputados.
De acordo com Roncálio, que também é secretária da Fazenda de Florianópolis (SC), a perda potencial inclui cerca de R$ 4,6 bilhões no Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e R$ 4,85 bilhões decorrentes da isenção ou redução do IR sobre a folha de pagamento dos servidores municipais. Esses valores impactam diretamente a receita local, uma vez que a Constituição garante aos municípios a retenção do IR sobre todos os rendimentos pagos pelos próprios cofres públicos.
Mudança no IR preocupa municípios
Segundo Michele Roncálio, a proposta do governo federal pode comprometer a autonomia financeira dos municípios e aumentar a dependência das transferências da União.
“Esse projeto compromete a autonomia financeira dos municípios. Os municípios ficam ainda mais dependentes de repasses federais”, afirmou Roncálio na audiência.
Para reduzir os impactos negativos, a Abrasf sugeriu ao relator do projeto, deputado Arthur Lira (PP-AL), a criação de um Fundo de Compensação Federativa que permita revisões periódicas sobre os efeitos fiscais da proposta. A entidade também defende o fim da obrigatoriedade do recolhimento municipal ao Pasep, contribuição de 1% sobre as receitas dos municípios.
Tributarista destaca redistribuição de receitas
Durante o debate, o tributarista Leonardo Aguirra de Andrade avaliou que o projeto traz avanços importantes no sentido de redistribuir as receitas arrecadadas. Ele destacou que a proposta amplia a tributação sobre um grupo pequeno da população para beneficiar uma parcela maior de contribuintes.
“É, efetivamente, uma transferência de recursos arrecadados de um grupo pequeno para desonerar um grupo relativamente grande”, comentou Andrade.
O projeto prevê a criação de uma alíquota mínima efetiva de até 10%, chamada de Imposto sobre a Renda de Pessoas Físicas Mínimo (IRPFM), aplicável a contribuintes com rendimentos superiores a R$ 600 mil por ano. A arrecadação gerada com essa nova tributação será direcionada para compensar a isenção do IR para pessoas que recebem até R$ 5 mil mensais.
Andrade também sugeriu ao relator do PL 1087/25 a revisão das indenizações pagas no serviço público que, atualmente, são isentas de tributação. Segundo ele, é necessário avaliar os chamados “penduricalhos” de altos salários no funcionalismo para corrigir distorções.
Especialista cobra atualização da tabela do IR
A procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, Élida Graziane Pinto, defendeu a revisão urgente da tabela do Imposto de Renda. Ela lembrou que a última atualização significativa ocorreu em 2015, o que, segundo ela, penaliza os contribuintes com a defasagem.
“Quando não se faz a correção da tabela de Imposto de Renda, a gente empurra a perda inflacionária para o contribuinte”, destacou Élida.
Essa defasagem na tabela do IR contribui para o chamado "efeito de arrasto", no qual trabalhadores de baixa renda acabam sendo tributados como se pertencessem a faixas superiores de rendimento.
Discussão sobre o IR é politizada, diz deputado
Durante a audiência, o deputado Ivan Valente (Psol-SP) criticou o que considera uma excessiva politização das discussões sobre o sistema tributário na Câmara dos Deputados. Ele avaliou que o debate sobre o Imposto de Renda está sendo conduzido de forma ideológica, sem base sólida em dados e estudos técnicos.
“É uma crise artificial que, na verdade, vai impedir o verdadeiro debate sobre como superar a concentração da renda no Brasil”, afirmou Valente.
O parlamentar defendeu que a reforma do IR deve focar no combate às desigualdades e na construção de um sistema mais progressivo, que tribute proporcionalmente mais quem tem maior capacidade contributiva.
Comissão entra na reta final dos trabalhos
O presidente da comissão especial, deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), informou que a tramitação do projeto está em fase de conclusão. Ele solicitou aos partidos a indicação de coordenadores de bancada para as negociações finais com o relator, deputado Arthur Lira.
“Ter um colégio de coordenadores seguramente ajudará bastante esse afunilamento dos trabalhos”, afirmou Pereira Júnior.
O parecer final do relator deve ser apresentado até o dia 27 deste mês. O projeto integra o pacote de medidas do governo para reformular a tributação sobre a renda no país, com impacto direto sobre contribuintes, empresas e municípios.
Impactos para a gestão municipal
Caso o projeto seja aprovado no formato atual, os municípios podem enfrentar dificuldades financeiras significativas, especialmente aqueles que dependem fortemente do Fundo de Participação dos Municípios. Segundo levantamento da Abrasf, cerca de 20% das receitas de pequenas cidades vêm do FPM.
A possível redução desses repasses pode afetar o custeio de serviços essenciais, como saúde, educação e infraestrutura. Além disso, a isenção do IR sobre a folha dos servidores pode comprometer o equilíbrio financeiro local, aumentando o risco de déficits orçamentários.
A proposta de criação do Fundo de Compensação Federativa surge como alternativa para minimizar esses efeitos, mas ainda não há consenso sobre sua viabilidade e formato.
Próximos passos da tramitação
O relator do projeto, Arthur Lira, deverá incorporar as sugestões debatidas na comissão e apresentar seu parecer até o fim de junho. Após essa etapa, o texto seguirá para votação na Câmara dos Deputados e, posteriormente, será analisado pelo Senado Federal.
A expectativa é de que a proposta avance rapidamente, pois o governo busca implementar as mudanças no Imposto de Renda ainda no exercício fiscal de 2025.
Com informações adaptadas da Agência Câmara de Notícias
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