O governo federal propôs o fim da isenção de Imposto de Renda (IR) sobre os rendimentos de Letras de Crédito Imobiliário (LCI), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA). A mudança está prevista na Medida Provisória nº 1.303/2024 e deve valer para emissões realizadas a partir de 1º de janeiro de 2026.
A medida visa ampliar a arrecadação federal e ainda depende de aprovação do Congresso Nacional. Se confirmada, os rendimentos desses papéis passarão a ser tributados à alíquota de 5%, abaixo da prevista para outros investimentos de renda fixa, que pode chegar a 17,5%.
O que são LCI, LCA, CRI e CRA
LCIs e LCAs são títulos de renda fixa emitidos por bancos, cuja captação deve ser destinada ao financiamento dos setores imobiliário e agropecuário, respectivamente. Já os CRIs e CRAs são títulos emitidos por securitizadoras, empresas que adquirem dívidas de terceiros e estruturam os papéis com base nesses créditos.
Esses instrumentos se destacam por oferecerem rendimento previsível (prefixado), vinculado a indicadores (pós-fixado) ou híbrido (ex.: IPCA + juros). Por serem considerados mais arriscados que títulos do Tesouro Direto, especialmente no caso de CRIs e CRAs, tendem a remunerar mais para compensar o risco de crédito.
Por que a proposta do governo afeta esses investimentos
Com a tributação dos rendimentos prevista para 2026, as instituições financeiras e securitizadoras têm antecipado ofertas desses títulos ainda dentro da vigência da isenção fiscal. A expectativa é que a remuneração futura tenha que ser ajustada para manter a atratividade, compensando a cobrança do imposto com taxas mais elevadas.
Gestores afirmam que a mudança não deve reduzir a emissão desses papéis, já que a nova alíquota será inferior àquela cobrada sobre outros investimentos. Para os emissores, a tributação de 5% permite manter uma taxa de juros competitiva com rentabilidade líquida atrativa.
Como funcionam as LCIs e LCAs
As LCIs e LCAs são emitidas exclusivamente por bancos e possuem como lastro operações de crédito vinculadas aos setores imobiliário e agrícola. No caso das LCIs, os recursos podem ser utilizados em financiamentos habitacionais com garantia de hipoteca ou alienação fiduciária. Já as LCAs têm como lastro instrumentos como a Cédula de Produto Rural (CPR), Cédula Rural Hipotecária (CRH) e Nota de Crédito à Exportação (NCE).
Esses títulos contam com a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), até o limite de R$ 250 mil por CPF e por instituição financeira, trazendo segurança adicional ao investidor.
CRIs e CRAs: estrutura, risco e rentabilidade
Diferente das LCIs e LCAs, os CRIs e CRAs não são emitidos por bancos, mas por securitizadoras. O risco de crédito recai sobre a empresa devedora dos recebíveis — não sobre a securitizadora. Isso significa que a análise de risco deve considerar a saúde financeira das empresas que originaram os créditos.
Esses títulos podem ter como base financiamentos residenciais, contratos de aluguel, compra de insumos agrícolas, debêntures e outros instrumentos do mercado de capitais. Há diferentes estruturas de CRIs e CRAs, como os pulverizados (com mais de 100 devedores) e os corporativos (com 1 ou poucos devedores, geralmente empresas de grande porte).
Segundo as classificadoras de risco, os certificados mais seguros recebem nota AAA+. Ainda assim, oferecem retorno superior ao Tesouro Direto, o que atrai investidores dispostos a assumir riscos moderados para obter maior rentabilidade.
Impacto da MP no mercado e antecipação de emissões
Segundo Fernanda Mello, co-CEO da Vert Securitizadora, o mercado já está se antecipando às mudanças. “Vemos uma corrida para garantir emissões ainda em 2025”, afirma. A antecipação busca assegurar a manutenção da isenção de IR para emissões feitas antes da nova regra.
Além disso, a tendência é de que os vencimentos desses títulos se tornem mais longos. Um CRA emitido com prazo de 10 anos, por exemplo, até o fim de 2025, ainda estará isento do imposto mesmo que o resgate ocorra em 2035.
Amanda Martins Ribeiro, sócia da Canal Securitizadora, também reforça que a medida de maior impacto recente foi a resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN), que restringiu o uso dos papéis a empresas com ao menos 70% da atividade ligada diretamente aos setores agrícola ou imobiliário.
Condições de remuneração e liquidez
A remuneração desses títulos varia conforme o porte e a saúde financeira da instituição emissora. Bancos menores tendem a oferecer retornos maiores em LCIs e LCAs para compensar o risco de crédito percebido. O mesmo se aplica a CRIs e CRAs com lastros em empresas menos conhecidas ou com ratings mais baixos.
Os investidores podem vender esses títulos no mercado secundário antes do vencimento, mas há riscos de liquidez e prejuízo na revenda, dependendo do cenário macroeconômico e da taxa de juros vigente.
O prazo mínimo para vencimento é de seis meses, mas títulos com vencimentos superiores a um ano são mais comuns, especialmente em estruturas de CRA e CRI.
Títulos devem continuar atrativos mesmo com IR
Apesar da futura incidência de imposto, os gestores acreditam que LCIs, LCAs, CRIs e CRAs permanecerão competitivos no portfólio dos investidores de renda fixa. A alíquota reduzida e a flexibilidade de estruturação são diferenciais em relação a outros produtos, como CDBs e fundos de investimento.
A nova regra poderá impulsionar ainda mais a sofisticação na montagem das carteiras desses instrumentos, com maior atenção à diversificação dos devedores e análise de risco.
O que os profissionais da contabilidade devem observar
A eventual aprovação da MP nº 1.303/2024 trará impacto direto nos relatórios financeiros e na apuração dos rendimentos dos investidores a partir de 2026. Escritórios contábeis devem orientar seus clientes sobre:
- O impacto da tributação nos rendimentos líquidos;
- A diferença entre os papéis emitidos antes e depois da mudança;
- A caracterização dos rendimentos sujeitos à alíquota reduzida de 5%;
- O tratamento fiscal adequado no Imposto de Renda da Pessoa Física e Jurídica.
Contadores que atuam com planejamento tributário e contabilidade consultiva devem monitorar a tramitação da proposta no Congresso e preparar simulações para seus clientes investidores, especialmente aqueles com ativos concentrados nesses produtos.