Apesar de mantido na reforma tributária, o regime do Simples Nacional pode deixar de ser vantajoso para micro e pequenas empresas (MPEs) que atuam no fornecimento de bens e serviços para outras empresas (B2B). A avaliação é de tributaristas que analisam o impacto da nova sistemática de créditos da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que não poderão mais ser aproveitados por clientes que compram de empresas optantes pelo regime simplificado.
A reforma criou um modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, com a CBS em âmbito federal (substituindo PIS, Cofins e IPI) e o IBS em âmbito estadual e municipal (no lugar de ICMS e ISS). A transição ocorrerá entre 2026 e 2033, mas já impõe reflexões estratégicas para as MPEs.
Novos tributos e o Simples Nacional Híbrido
A reforma manteve a possibilidade de adesão ao Simples Nacional, que unifica diversos tributos em uma guia única. No entanto, foi criada uma nova alternativa: o “Simples Nacional Híbrido”. Nessa opção, a empresa pode continuar no regime para tributos como IRPJ e CSLL, mas recolherá a CBS e o IBS pelo regime regular — com alíquotas mais elevadas, porém com direito ao crédito fiscal sobre insumos adquiridos e possibilidade de repasse desses créditos aos clientes.
Especialistas alertam que, para empresas que vendem para outras empresas (modelo B2B), essa mudança pode ser determinante. Isso porque seus clientes tendem a priorizar fornecedores que permitem a apropriação de créditos de CBS e IBS. Caso permaneçam integralmente no Simples Nacional, essas empresas não gerarão créditos aos compradores e podem perder espaço no mercado ou ter que oferecer descontos.
Empresas B2C tendem a manter atratividade do regime
Por outro lado, para empresas que vendem diretamente ao consumidor final (modelo B2C), o impacto tende a ser neutro. Segundo o tributarista Victor Tavolaro Barbieri, do escritório Polycarpo Advogados, essas empresas não geram créditos para os clientes, portanto a sistemática do Simples Nacional segue viável.
“Nesse caso, as faixas de faturamento e as alíquotas serão mantidas. A principal mudança estará na substituição dos tributos antigos pelos novos dentro da guia de recolhimento do Simples”, explica Barbieri.
Avaliação tributária deve ser feita caso a caso
A definição sobre manter-se no Simples Nacional ou migrar para o sistema híbrido deve considerar diversos fatores. O tributarista Raphael Okano Oliveira, do CTM Advogados, destaca a importância de cálculos precisos para avaliar o impacto da mudança sobre a precificação e a competitividade.
“A tendência é que os clientes optem por fornecedores que possibilitem o aproveitamento de créditos de IBS e CBS. Por isso, o Simples Nacional pode deixar de ser atrativo em determinadas operações”, afirma.
Faturamento próximo ao teto reduz vantagens do regime
Empresas com faturamento próximo ao limite de R$ 4,8 milhões por ano devem redobrar a atenção. De acordo com Leonardo Aguirra, sócio do Andrade Maia Advogados, nessas faixas mais altas, a alíquota global do Simples Nacional pode chegar a 19%, considerando todos os tributos (IRPJ, CSLL, PIS/Cofins, ICMS e CPP). Fora do Simples, dependendo do volume de créditos de IBS e CBS e da folha de salários, a carga tributária pode ser inferior a essa.
“Empresas com receita entre R$ 3,6 milhões e R$ 4,8 milhões devem simular diferentes cenários. A decisão não pode ser baseada apenas nos tributos sobre o consumo, mas também na tributação da renda e na estrutura de custos da empresa”, reforça Aguirra.
Novo modelo pode gerar mais complexidade para MPEs
Um dos objetivos da reforma tributária é simplificar o sistema. No entanto, segundo especialistas, a possibilidade do regime híbrido pode resultar em maior complexidade para micro e pequenas empresas que optarem por ele.
“A empresa que aderir ao Simples Nacional Híbrido precisará estruturar uma operação contábil semelhante à do Lucro Presumido, perdendo a simplicidade original do regime unificado”, afirma Barbieri. Isso pode representar um desafio adicional para negócios com menos estrutura administrativa.
Reforma amplia o desafio estratégico para pequenos negócios
A criação de um sistema de crédito ampliado para o novo modelo de CBS e IBS visa reduzir a cumulatividade e estimular a transparência na cadeia de produção. No entanto, para empresas do Simples Nacional, essa mesma regra pode funcionar como fator de pressão competitiva.
Segundo os especialistas, o cenário exige uma mudança de mentalidade dos gestores de pequenas empresas, que devem acompanhar de perto a implementação do novo sistema tributário e reavaliar sua posição de mercado.
Profissionais da contabilidade devem orientar seus clientes optantes pelo Simples Nacional a:
- Simular diferentes cenários de carga tributária considerando o sistema híbrido;
- Analisar o perfil de clientes (B2B ou B2C) e se eles exigem créditos de IBS e CBS;
- Considerar a estrutura de custos, folha de pagamento e margem de lucro;
- Avaliar a possibilidade de aumento da complexidade contábil e operacional;
- Acompanhar regulamentações complementares que detalharão o funcionamento do novo regime.
Embora o Simples Nacional tenha sido preservado na reforma tributária, seu modelo tradicional pode perder força para empresas que vendem para outras empresas e não geram créditos de CBS e IBS. A opção pelo sistema híbrido traz vantagens competitivas, mas impõe maior complexidade e exige planejamento tributário criterioso.
Empresas e contadores devem iniciar desde já a análise sobre qual regime tributário será mais vantajoso com a entrada em vigor da reforma. O planejamento antecipado poderá evitar perdas de mercado e garantir sustentabilidade fiscal no novo cenário.
Com informações do Poder360