O Senado Federal aprovou nesta terça-feira (2), em dois turnos e por unanimidade, o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 125/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte. A proposta estabelece novas regras para reforçar a proteção dos direitos dos contribuintes e endurecer as penalidades contra os chamados devedores contumazes — empresas que deixam de pagar tributos de forma reiterada e intencional. O texto agora segue para a Câmara dos Deputados.
O que muda com o novo Código de Defesa do Contribuinte
O projeto, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi elaborado com base em propostas de uma comissão de juristas formada em 2022. O objetivo é modernizar o processo administrativo e tributário brasileiro, criando um marco legal que equilibre direitos, deveres e garantias nas relações entre Fisco e contribuintes.
Segundo o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, a votação representa "um grande passo para o futuro do Brasil". Já o relator da proposta, senador Efraim Filho (União-PB), destacou que o texto busca coibir práticas fraudulentas, como as descobertas na operação Carbono Oculto, da Polícia Federal, que investigou esquemas de lavagem de dinheiro via fundos de investimento.
Regras mais duras para devedores contumazes
A principal mudança do texto aprovado trata da definição e penalização dos devedores contumazes. Pela nova regra, em âmbito federal, será considerado contumaz o contribuinte com dívida injustificada superior a R$ 15 milhões e correspondente a mais de 100% do patrimônio conhecido.
Nos âmbitos estadual e municipal, será enquadrado como contumaz quem acumular dívidas de forma reiterada por ao menos quatro períodos consecutivos ou seis alternados em 12 meses, também sem justificativa.
Entre as punições previstas estão:
- Exclusão de benefícios fiscais;
- Impedimento de participar de licitações e firmar contratos públicos;
- Proibição de propor recuperação judicial;
- Possibilidade de ser considerado inapto no cadastro de contribuintes.
Além disso, os devedores contumazes terão seus processos administrativos julgados em rito simplificado, acelerando a análise e reduzindo os impactos sobre a concorrência leal.
Exceções e direito de defesa
O texto aprovado prevê situações em que o contribuinte não será considerado contumaz, como nos casos de:
- Calamidade pública reconhecida oficialmente;
- Resultados financeiros negativos comprovados nos dois últimos exercícios;
- Ausência de fraude em execuções fiscais.
Os contribuintes também terão prazo de 30 dias para regularizar sua situação ou apresentar defesa, com efeito suspensivo do processo. Contudo, essa suspensão não se aplicará em casos de fraude, uso de laranjas ou indícios de sonegação.
Medidas adicionais: ANP e fintechs na mira
O substitutivo aprovado incluiu ainda regras específicas para setores estratégicos. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) terá competência para exigir comprovação da origem dos recursos e definir valores mínimos de capital social para distribuidoras de combustíveis, como forma de combater o uso de empresas por organizações criminosas.
Outra novidade é a exigência de que instituições de pagamento e fintechs cumpram as mesmas obrigações acessórias estabelecidas pelo Poder Executivo, ampliando a fiscalização sobre movimentações financeiras e prevenindo a lavagem de dinheiro.
Benefícios para os bons pagadores
Além de combater os inadimplentes habituais, o projeto cria incentivos para contribuintes que mantêm suas obrigações em dia. Os bons pagadores poderão ter:
- Acesso facilitado a canais de atendimento;
- Regras mais flexíveis para garantias;
- Prioridade na análise de processos administrativos;
- Bônus de adimplência fiscal, com desconto de até 3% no pagamento à vista da CSLL, limitado a R$ 1 milhão no terceiro ano do benefício.
Esses incentivos fazem parte de programas de conformidade tributária que serão implementados pela Receita Federal, como o Confia, o Sintonia e o Programa OEA.
Direitos e deveres dos contribuintes
O Código de Defesa do Contribuinte também lista direitos básicos, como:
- Tratamento respeitoso e acesso a informações claras;
- Direito de defesa e recurso em processos administrativos;
- Sigilo de dados;
- Reparação em casos de cobranças excessivas.
Entre os deveres, destacam-se:
- Cumprimento integral das obrigações tributárias;
- Apresentação correta de documentos e informações;
- Guarda de documentos fiscais pelo prazo legal.
Do lado dos órgãos fiscais, o projeto impõe a obrigação de reduzir litígios, consolidar normas periodicamente e priorizar soluções cooperativas para conflitos tributários.
Impacto esperado e próximos passos
De acordo com estudo da Receita Federal citado pelo relator, cerca de 1.200 empresas concentram R$ 200 bilhões em dívidas consideradas irrecuperáveis. A expectativa é que as novas regras inibam esse tipo de prática, reforçando a concorrência leal e a arrecadação.
O texto agora será analisado pela Câmara dos Deputados. Caso seja aprovado sem alterações, seguirá para sanção presidencial.
O novo Código de Defesa do Contribuinte traz regras mais rígidas contra devedores contumazes e cria incentivos para bons pagadores. O projeto, já aprovado pelo Senado, representa um marco na relação entre Fisco e contribuintes e pode redefinir o equilíbrio entre combate à sonegação e estímulo à conformidade fiscal.