A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quinta-feira (4), o projeto de lei que proíbe descontos automáticos de mensalidades de sindicatos, associações e entidades de classe diretamente nos benefícios do INSS. A medida vale mesmo que o aposentado ou pensionista tenha autorizado expressamente o desconto. O texto segue agora para análise do Senado Federal.
A proposta aprovada é um substitutivo do deputado Danilo Forte (União-CE) ao Projeto de Lei 1546/2024, apresentado pelo deputado Murilo Galdino (Republicanos-PB). Além da vedação aos descontos, o texto trata de mudanças nas regras de crédito consignado, restituição de valores cobrados indevidamente e penalidades para instituições financeiras envolvidas em irregularidades.
O que muda com a proibição de descontos no INSS
Até hoje, aposentados e pensionistas podiam autorizar o desconto de mensalidades associativas diretamente na folha de pagamento do INSS. A nova proposta considera essa prática um desvio de finalidade da estrutura previdenciária.
Segundo o relator afirmou durante a audiência, “a autorização para descontos associativos criou um ambiente propício para fraudes sistêmicas, comprometendo a segurança dos beneficiários, principalmente os mais vulneráveis, e a própria credibilidade da Previdência Social”.
Com a aprovação, nenhum sindicato, associação ou entidade poderá receber valores diretamente descontados no benefício, sendo necessário cobrar seus filiados por outros meios.
Ressarcimento em casos de desconto indevido
O texto prevê que o INSS deverá realizar busca ativa para identificar beneficiários lesados por descontos não autorizados. Isso inclui auditorias internas, denúncias, ações judiciais e reclamações.
A prioridade será dada a grupos vulneráveis e moradores de regiões de difícil acesso.
As instituições financeiras responsáveis por descontos irregulares terão até 30 dias, a partir da notificação do INSS, para restituir integralmente os valores corrigidos ao beneficiário. Se não o fizerem, o próprio INSS assumirá o ressarcimento, utilizando recursos do Orçamento da União — e não da Seguridade Social.
Caso o INSS não consiga recuperar o valor da instituição financeira, poderá acionar o Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que cobre operações do sistema financeiro.
Regras mais rígidas para crédito consignado
A proposta também altera as condições para contratação de empréstimos consignados por aposentados e pensionistas.
A partir da futura lei, os contratos só poderão ser autorizados com:
- Biometria (reconhecimento facial ou digital);
- Assinatura eletrônica qualificada;
- Autenticação de múltiplos fatores.
Além disso, não será mais possível contratar ou desbloquear crédito consignado por procuração ou ligação telefônica.
Após cada contratação, o benefício será automaticamente bloqueado para novas operações, exigindo novo processo de desbloqueio.
Segundo o deputado Eli Borges (PL-TO), a medida corrige falhas graves: “As pessoas diziam que não assinavam e, de repente, estavam com descontos em extratos, o que trouxe muito prejuízo para brasileiros pobres”.
Papel do Conselho Monetário Nacional (CMN)
Outro ponto polêmico foi a mudança de competência para definir o limite dos juros do crédito consignado. Atualmente, essa função é do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS). Com o projeto, passará a ser do Conselho Monetário Nacional (CMN), que deverá fixar os limites conforme critérios de proteção ao consumidor e viabilidade das operações.
A mudança gerou críticas de parte dos parlamentares, que temem maior influência do setor financeiro na definição das taxas.
Sequestro de bens em casos de fraude
O texto altera ainda o Decreto-Lei nº 3.240/1941, permitindo o sequestro de bens obtidos licitamente quando houver indícios de participação em crimes contra a Fazenda Pública, fé pública ou descontos indevidos em benefícios do INSS.
Com a atualização, o sequestro pode ocorrer ainda na fase de investigação, mediante decisão judicial a partir de representação da autoridade policial. Atualmente, essa medida depende de solicitação do Ministério Público.
O objetivo é agilizar a recuperação de valores desviados em casos de fraudes contra aposentados e pensionistas.
Impactos para os aposentados e pensionistas
Para os beneficiários do INSS, a nova lei traz mais segurança contra fraudes e descontos indevidos. Segundo dados do próprio órgão, em abril de 2025 havia mais de 2,5 milhões de requerimentos pendentes de análise, em parte devido ao acúmulo de tarefas administrativas, como fiscalização de descontos.
Ao eliminar a possibilidade de descontos associativos, o projeto busca liberar recursos humanos e tecnológicos do INSS para focar na concessão e manutenção dos benefícios.
Críticas de parlamentares
Apesar de avanços, parlamentares da oposição apontaram que o texto beneficia os bancos ao liberar a antecipação de benefícios previdenciários.
O deputado Renildo Calheiros (PCdoB-PE), que também participou da votação na Câmara, afirmou: “É uma lei muito favorável aos bancos, feita para turbinar o interesse das instituições financeiras na relação com os aposentados”.
Já a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) destacou que “é preciso separar o joio do trigo: proteger o beneficiário, mas não abrir brechas para novos lucros excessivos do setor financeiro”.
Por outro lado, o deputado Rogério Correia (PT-MG) defendeu que os bancos também devem ser responsabilizados em caso de fraude: “Se houver prejuízo aos aposentados, que as instituições financeiras arquem com os custos, e não o INSS”.
Experiência anterior e contexto
A discussão ganhou força após aumento de denúncias de descontos não autorizados em benefícios previdenciários nos últimos anos. Diversas operações da Polícia Federal e auditorias do TCU identificaram irregularidades que afetaram milhares de aposentados.
Em 2024, por exemplo, o INSS identificou mais de 10 mil casos de descontos indevidos ligados a entidades associativas. O valor do ressarcimento superou R$ 50 milhões, segundo dados da autarquia.
Próximos passos
Com a aprovação na Câmara, o projeto segue para análise do Senado. Caso seja aprovado sem alterações, será enviado para sanção presidencial.
Especialistas em direito previdenciário avaliam que a medida tende a reduzir litígios judiciais e aumentar a proteção de aposentados e pensionistas, mas alertam para o acompanhamento das regras sobre crédito consignado e o impacto das novas taxas de juros a serem definidas pelo CMN.
A aprovação do projeto que proíbe descontos de sindicatos e associações em benefícios do INSS representa um marco de proteção para aposentados e pensionistas. A medida endurece as regras de crédito consignado, amplia mecanismos de ressarcimento e fortalece a fiscalização contra fraudes.
Para os contadores, advogados e gestores previdenciários, o texto exige atenção redobrada às novas exigências de autenticação eletrônica, limites de juros e procedimentos de desbloqueio do consignado, que terão impacto direto no planejamento financeiro dos clientes.
Recomenda-se que profissionais da contabilidade orientem aposentados e pensionistas sobre seus direitos e acompanhem a tramitação do projeto no Senado, garantindo informação correta e atualização constante.