A reforma tributária sobre o consumo manterá as regras atuais para o microempreendedor individual (MEI) e para as empresas que vendem exclusivamente ao consumidor final. No entanto, as empresas do Simples Nacional que realizam operações com outras pessoas jurídicas terão de escolher entre permanecer no modelo atual ou migrar para o sistema híbrido, que permite o abatimento de créditos tributários.
Atualmente, a maior parte das vendas no Simples não gera créditos para as empresas compradoras. Com a reforma, esse cenário será alterado, exigindo atenção redobrada de milhões de empreendedores em todo o país.
Desafios para pequenos negócios
Especialistas apontam que o novo modelo trará exigências adicionais, como:
- Maior detalhamento contábil nas notas fiscais;
- Acompanhamento da cadeia de fornecimento, já que créditos só serão reconhecidos se os impostos forem efetivamente pagos nas etapas anteriores;
- Restrições quanto ao atraso no recolhimento dos tributos, devido ao novo sistema eletrônico da Receita Federal, que está em fase de testes.
Regime híbrido e impacto no mercado
Segundo o advogado tributarista Thiago Santana Lira, do Barroso Advogados Associados, no regime híbrido as empresas continuam recolhendo o Documento de Arrecadação do Simples Nacional (DAS), mas passam a apurar separadamente o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).
Essa mudança permite que empresas compradoras de maior porte aproveitem créditos tributários nas aquisições. Para os negócios que não aderirem, existe o risco de perder clientes no mercado corporativo.
Posição do governo federal
O secretário especial do Ministério da Fazenda para a reforma tributária, Bernard Appy, afirmou que o novo sistema vai exigir das empresas a separação, no momento da venda, dos valores devidos à União, estados e municípios.
Segundo ele, a medida reduzirá significativamente a sonegação e as fraudes, incluindo o uso de “notas frias”. Appy reforçou que a maioria das empresas do Simples não será afetada, já que cerca de 60% são MEIs ou atuam no varejo, sem repasse de créditos tributários.
“Para o MEI, não muda absolutamente nada. Permanece exatamente como é hoje”, afirmou.
Appy destacou ainda que a opção pelo sistema híbrido tende a aumentar a competitividade dos pequenos negócios que vendem para outras empresas, sem alterar a forma de tributação do lucro e da folha de salários.
Efeitos sobre fluxo de caixa
O diretor do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), Carlos Pinto, avaliou que a adesão ao regime híbrido será uma exigência mercadológica, uma vez que empresas compradoras priorizarão fornecedores que possibilitem o aproveitamento de créditos.
Ele alertou, porém, que a antecipação do pagamento dos tributos poderá gerar dificuldades no fluxo de caixa das pequenas empresas, já que os valores precisarão ser destacados no momento da venda.
Outro ponto de atenção é a necessidade de verificar se os fornecedores recolheram corretamente seus tributos, condição essencial para validar os créditos tributários na etapa seguinte.
Estimativas do Ministério da Fazenda
De acordo com cálculos da equipe econômica, aproximadamente 6,5% das vendas do Simples Nacional destinadas a empresas do lucro real poderão enfrentar alguma perda de competitividade, o que representa cerca de 1,3% do total das operações.
Appy avaliou que a perda será limitada e necessária para corrigir distorções do sistema atual: “Empresas que representam 1,3% [das vendas do Simples] vão ter uma perda pequena. Estamos falando de 1,1% do valor do faturamento.”
O governo ressalta que empresas que atuam no meio da cadeia produtiva terão duplo benefício: insumos mais baratos e redução no custo de venda.
Limites de enquadramento no Simples Nacional
Pelas regras atuais, podem aderir ao Simples Nacional:
- MEI: faturamento anual de até R$ 81 mil;
- Transportador autônomo de cargas: até R$ 251,6 mil;
- Microempresas (ME): até R$ 360 mil;
- Empresas de pequeno porte (EPP): até R$ 4,8 milhões.
A reforma tributária, em fase de regulamentação, criou ainda a categoria dos nanoempreendedores, com receita bruta anual inferior a R$ 40,5 mil, que serão isentos dos novos tributos.
Prazos de implementação da reforma
O sistema da Receita Federal para operacionalizar o pagamento antecipado e o abatimento de tributos entrará em fase de testes em 2026, com alíquota simbólica de 1%, passível de abatimento em outros tributos.
Em 2027, com a extinção do PIS/Cofins, terá início a aplicação do split payment para a CBS, em operações entre empresas. O varejo não será abrangido nesta fase.
Entre 2029 e 2032, ocorrerá a transição do ICMS e do ISS para o IBS, com redução gradual das alíquotas atuais e aumento progressivo da alíquota do novo tributo.
A reforma tributária representa uma mudança significativa para parte das empresas do Simples Nacional, especialmente aquelas que vendem para outras pessoas jurídicas.
Embora a maioria das empresas não seja afetada, os empreendedores que atuam no meio da cadeia produtiva terão que decidir entre o regime atual e o híbrido, avaliando os impactos sobre competitividade, fluxo de caixa e relacionamento com clientes e fornecedores.
Com informações do portal g1