O governo federal estuda novas medidas para compensar a perda de arrecadação após a derrubada da Medida Provisória (MP) 1303/2025, que tratava do aumento de impostos e ajustes no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A rejeição da proposta pela Câmara dos Deputados, na última semana de vigência do texto, deve resultar em bloqueios de despesas e ajustes de cerca de R$ 35 bilhões no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2026.
Entre as alternativas em análise estão a edição de um novo decreto ampliando o IOF e a apresentação de um novo texto legislativo com trechos retomados da MP. Líderes governistas, entretanto, afirmam que ainda não há decisão formal e que as opções serão discutidas com o Ministério da Fazenda.
Possíveis medidas em avaliação
De acordo com integrantes do governo ouvidos pela Folha de S.Paulo, ainda não existe nenhum ato concreto em elaboração. No entanto, um membro da equipe econômica não descarta um novo aumento do IOF no futuro, caso seja necessário reforçar a arrecadação.
A hipótese de reeditar trechos da MP, segundo técnicos do governo, enfrenta obstáculos jurídicos. O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que é inconstitucional reeditar uma medida provisória na mesma sessão legislativa se ela tiver sido rejeitada ou perdido eficácia por decurso de prazo — situação idêntica à atual.
Ainda assim, líderes do PT argumentam que, como o mérito da MP não chegou a ser votado em plenário, haveria margem para discutir a reapresentação de parte do conteúdo em outro formato, como um projeto de lei com regime de urgência.
Reação do governo e declarações oficiais
O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirmou que há um “arsenal de possibilidades” para compensar a queda na arrecadação, incluindo a retomada da elevação do IOF.
“Pode ser cogitado, como a medida provisória não foi de fato votada e ela vai caducar daqui a pouco, a apresentação de um projeto de lei em regime de urgência. É uma alternativa que eu acho que está sob a mesa”, declarou Randolfe.
Ele acrescentou que o governo precisa garantir previsibilidade fiscal para 2026, e que a rejeição da MP implicará contingenciamento de gastos e emendas parlamentares.
“Temos que fechar uma conta. Nós temos que ter previsão financeira e orçamentária para o ano que vem. Por isso precisamos de medidas nesse sentido. Não tendo as medidas aprovadas pela Câmara, a Câmara tem que dizer, junto com o Congresso, quais são as alternativas”, afirmou o senador.
Randolfe também atribuiu a derrota da MP a movimentos políticos antecipando o debate eleitoral de 2026, citando a participação do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Debate sobre recomposição da arrecadação
Segundo fontes do Executivo, o Ministério da Fazenda deve propor um pacote de ações tributárias para tentar recompor parte das receitas previstas na MP.
Uma das hipóteses ventiladas é a reintrodução da tributação sobre Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e Letras de Crédito Imobiliário (LCI), rendimentos que mantiveram isenção de Imposto de Renda após as negociações no Congresso.
A proposta inicial do governo previa incluir esses títulos na base de cálculo do imposto mínimo para pessoas de alta renda, mas o texto foi alterado durante a tramitação na Câmara.
Essa ideia, no entanto, enfrenta resistência no Senado Federal, onde o projeto de ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda tramita sob relatoria do senador Renan Calheiros (MDB-AL). O relator pretende aprovar o texto sem mudanças para evitar que ele retorne à Câmara dos Deputados, o que atrasaria sua sanção.
Impasse político e riscos fiscais
A derrubada da MP 1303/2025 criou um impasse entre Palácio do Planalto e Congresso Nacional, especialmente porque o governo a considerava uma medida essencial para equilibrar o Orçamento de 2026.
Fontes do Executivo alertam que a frustração de receitas poderá resultar em bloqueio de despesas obrigatórias e limitação de repasses, incluindo emendas parlamentares.
Randolfe Rodrigues reforçou que a prioridade do governo é garantir equilíbrio orçamentário, mas sem medidas drásticas.
“Não é desesperador o resultado que tivemos na Câmara. Agora precisamos trabalhar em soluções responsáveis para recompor o orçamento”, afirmou.
Alternativas legislativas e fiscais
Alguns parlamentares sugerem incluir dispositivos rejeitados da MP em outros projetos em tramitação. Entre as ideias, está a inserção de dispositivos de arrecadação no projeto de lei que trata da isenção de IR para quem recebe até R$ 5.000 mensais.
Essa estratégia, contudo, divide a base governista. Parte dos líderes avalia que mexer em textos já avançados no Senado poderia acirrar tensões entre as Casas e atrasar votações prioritárias.
Avaliações da equipe econômica
O relator da MP, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), afirmou antes da votação que o governo ainda dispõe de instrumentos legais para ajustar alíquotas tributárias, mesmo sem aprovação da medida.
“Tem várias coisas que podem ser feitas por decreto. Há definições de alíquotas de imposto que não precisam de lei, como IPI, IOF e outros. O Supremo reconheceu que o governo tem autonomia para aumentar ou diminuir a alíquota do IOF e não tem que consultar o Congresso”, disse o parlamentar.
Já o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (RJ), afirmou que setores contrários ao aumento da tributação recusaram negociar e poderão enfrentar medidas mais duras.
“O governo tem instrumentos. Se essa turma desses lobbies está achando que vai conseguir se safar, pelo contrário, a situação para eles pode ficar pior. Em vez de um bom acordo, podem estar cavando uma medida unilateral do governo que pode prejudicá-los muito mais”, declarou.
Próximos passos
Embora o governo ainda não tenha definido qual medida adotará, integrantes da base afirmam que o Ministério da Fazenda deve apresentar alternativas até o fim de outubro.
As propostas serão discutidas internamente antes de qualquer publicação oficial, e poderão envolver ajustes por decreto, novas medidas provisórias ou projetos de lei com urgência constitucional.
Enquanto isso, a equipe econômica avalia o impacto da perda de R$ 35 bilhões na previsão de receitas de 2026 e busca soluções para preservar o equilíbrio fiscal sem ampliar o endividamento público.
Com informações de Folha de S. Paulo