Temos acompanhado diversas publicações, especialmente em vídeos e redes sociais, com alguns exageros com relação ao que traz a reforma tributária do consumo, que começa a valer, em seu período de transição, a partir de 2026. Muito do que se lê ou se vê na internet tem por objetivo apenas caçar cliques e audiência. Mas uma revolução significativa em termos tecnológicos está chegando.
Por isso, resolvi abordar o tema para trazer algumas informações sobre o quão significativas serão as mudanças de paradigma e o suporte tecnológico que vão garantir sua implantação.
Para situar melhor, volto menos de 20 anos no tempo para entendermos como tudo começou.
O primeiro passo na direção da automação das informações fiscais vem da criação da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), que surgiu em 2006, com as primeiras emissões válidas tendo sido feitas em 15 de setembro daquele ano, no Rio Grande do Sul e Goiás.
A NF-e foi criada para substituir o modelo tradicional em papel, com o objetivo de simplificar os processos fiscais e reduzir o custo para as empresas, além de combater fraudes e sonegação.
Também com a NF-e, a implantação foi gradual, a partir de 2007, para alguns setores específicos. A obrigatoriedade para os demais contribuintes do ICMS veio a partir de 2010.
A criação da Nota Fiscal Eletrônica foi o principal componente para instituição, em janeiro de 2007, do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), que surge com o propósito de modernizar a relação entre o fisco e os contribuintes, informatizando obrigações fiscais e contábeis que antes eram feitas em papel.
Pela sua complexidade, também o SPED teve implantação gradual, tendo a NF-e como módulo inicial, e foi grandemente impulsionado pela Certificação Digital, que viabilizou a criação de documentos eletrônicos com validade jurídica, conforme estabelecido pela Medida Provisória 2.200-2, mantida em vigor com força de Lei Complementar por outras legislações, como a Lei 14.063, de 23 de setembro de 2020.
Esse mergulho no passado foi para situar o começo da evolução tecnológica, que permitiu que chegássemos à Reforma Tributária do Consumo com a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).
A reforma tributária brasileira não é apenas uma mudança legislativa, é uma revolução tecnológica. Com a criação dos tributos IBS e CBS, nasce também uma nova arquitetura digital, que será responsável por processar bilhões de operações em tempo real. Essa transformação exige uma infraestrutura robusta, inteligente e interoperável, capaz de lidar com a complexidade fiscal do país. E é aí que a tecnologia entra como protagonista.
Para se ter uma ideia do tamanho do que estamos falando, a estrutura tecnológica envolvida será 156 vezes maior do que a que roda e dá sustentação ao sistema PIX, e irá processar cerca de 70 bilhões de documentos por ano.
Conforme disse à imprensa o secretário especial da Reforma Tributária, Bernard Appy, “teremos informações para calcular o PIB diário do Brasil, o [da economia] formal, pelo menos”.
Desenvolvido pelo Serpro, o Ecossistema RTC (Reforma Tributária do Consumo) é a base tecnológica da reforma. Ele representa uma mudança de paradigma na forma como o Brasil gerencia seus tributos sobre o consumo.
Com tecnologia de ponta que vai permitir a comunicação em tempo real entre sistemas públicos e privados, com realização dos cálculos automáticos dos tributos com regras parametrizáveis, essa estrutura permitirá que o sistema tributário opere com mais transparência, rastreabilidade e eficiência.
Algumas automações importantes requerem a atenção dos contribuintes, dentre elas a inteligência artificial, que será usada para interpretar documentos fiscais, detectar inconsistências e sugerir correções em tempo real. Modelos de linguagem (LLMs) poderão auxiliar na análise de grandes volumes de dados fiscais, identificando padrões de comportamento e oportunidades de melhoria.
Dentre as automações, a que terá maior relevância - porque irá afetar o fluxo de caixa das empresas - é o Split Payment, que vai separar o imposto gerado no ato da transação e impedir a postergação do recolhimento dos tributos.
A implantação da reforma exigirá que empresas operem sob dois regimes simultâneos (o atual e o novo), o que demanda atualização de sistemas e processos.
Dentre os principais desafios, podemos citar: adequação de ERPs e sistemas fiscais, reengenharia de processos internos, capacitação de equipes de TI, contabilidade e jurídico e significativo risco de paralisação operacional para empresas que não se adequarem.
Empresas que não se prepararem podem enfrentar dificuldades na emissão de documentos fiscais válidos, impactando diretamente o faturamento.
É claro que toda essa estrutura permitirá aos fiscos, nos três níveis, um inédito monitoramento, praticamente em tempo real do que acontece em termos de compra e venda de produtos e serviços, e com isso identificar desvios ou tentativas de fraudes.
Por outro lado, a reforma pode ser o gatilho para a modernização de sistemas e adoção de práticas mais eficientes. As empresas que se anteciparem poderão ter redução de custos operacionais, maior conformidade fiscal, agilidade na tomada de decisão e vantagem competitiva no novo ambiente tributário.













