O Supremo Tribunal Federal (STF) pode mudar pontos centrais da reforma da Previdência aprovada em 2019, com impactos diretos sobre aposentadorias, pensões e o equilíbrio das contas públicas. As discussões envolvem tanto os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) quanto os servidores públicos ativos, aposentados e pensionistas.
Publicada em novembro de 2019, a Emenda Constitucional nº 103 instituiu idade mínima para aposentadoria, modificou o cálculo dos benefícios e das médias salariais, alterou alíquotas de contribuição e criou regras de transição para quem já estava no mercado de trabalho. Agora, parte dessas normas é questionada em 13 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) analisadas pela Corte, além de outros processos específicos sobre o tema.
O julgamento, relatado pelo ministro Luís Roberto Barroso, já conta com votos divergentes — Barroso se manifestou favoravelmente à reforma, enquanto o atual presidente do STF, Edson Fachin, apresentou posição contrária. A análise foi interrompida por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes e está prevista para ser retomada em 3 de dezembro.
Pontos da reforma em análise
Entre os principais temas sob avaliação estão:
- Contribuição de servidores ativos e inativos;
- Idade mínima para aposentadoria de mulheres servidoras;
- Limites para aposentadoria especial;
- Proibição da conversão de tempo especial em comum;
- Cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente;
- Tempo mínimo de contribuição para mulheres no serviço público.
Há maioria de votos para derrubar dois pontos: a alíquota de contribuição de servidores e o tempo mínimo de contribuição exigido das mulheres no funcionalismo público. Atualmente, trabalhadoras do INSS precisam de 15 anos de contribuição para solicitar aposentadoria, enquanto no serviço público o tempo exigido é de 20 anos. O Supremo entende que o requisito deve ser o mesmo para ambas as categorias.
Outro item que pode ser revisto é a cobrança de contribuição previdenciária de aposentados e pensionistas do setor público que recebem acima do salário mínimo — dispositivo que também permitiu alíquotas progressivas conforme a remuneração. Caso o trecho seja considerado inconstitucional, haverá impacto direto nas receitas de estados e municípios, que podem perder bilhões de reais anuais em arrecadação.
Impactos para a contabilidade pública e privada
As possíveis mudanças na reforma da Previdência exigem atenção redobrada de profissionais contábeis, especialmente aqueles que atuam com folha de pagamento, regimes próprios de previdência (RPPS) e planejamento atuarial. Uma eventual revisão nas alíquotas de contribuição ou nas regras de cálculo de benefícios pode obrigar empresas e entes públicos a readequar projeções financeiras e ajustes orçamentários.
No setor privado, escritórios contábeis e departamentos de pessoal devem estar preparados para orientar empresas e segurados sobre os reflexos imediatos nas contribuições ao INSS e nos cálculos de aposentadoria. Já no serviço público, a redefinição de critérios poderá impactar balanços previdenciários, fundos de pensão e relatórios de gestão fiscal, afetando diretamente o planejamento de longo prazo das administrações locais.
Além disso, o tema reforça a importância da contabilidade atuarial como ferramenta estratégica. A eventual derrubada de dispositivos que hoje garantem arrecadação contínua pode elevar o déficit dos regimes previdenciários — atualmente estimado em mais de R$ 1,1 trilhão nos municípios.
Ações que podem ter decisão em dezembro
Além das ADIs principais, duas ações estão na pauta do Supremo para 3 de dezembro. A primeira, relacionada ao Tema 1.300, trata do cálculo das aposentadorias por invalidez, hoje fixadas em 60% da média salarial, acrescidas de 2% a cada ano adicional de contribuição. A decisão terá repercussão geral, ou seja, valerá para todos os processos semelhantes em andamento no país.
A segunda ação discute a idade mínima na aposentadoria especial e a proibição da conversão de tempo especial em comum, regra que impacta diretamente trabalhadores expostos a agentes insalubres ou perigosos. A reforma de 2019 fixou idades mínimas de 55, 58 e 60 anos, de acordo com o nível de risco da atividade, e vetou o aproveitamento parcial do tempo de exposição para quem não atingir o período completo exigido.
Possíveis efeitos sobre o sistema previdenciário
As decisões do STF poderão redefinir parte das regras da Previdência, tanto para o regime geral (INSS) quanto para os regimes próprios de servidores. A eventual derrubada de contribuições ou mudanças nos critérios de cálculo pode gerar forte impacto nas contas públicas e obrigar governos locais a reverem suas reformas complementares.
Levantamento técnico da Câmara dos Deputados indica que 755 municípios já realizaram suas próprias reformas previdenciárias, mas ainda enfrentam déficit atuarial conjunto de R$ 1,1 trilhão. A reversão de dispositivos da Emenda Constitucional nº 103 tende a ampliar esse desequilíbrio e a exigir novas medidas de compensação fiscal.
Enquanto o julgamento não é concluído, estados, municípios e contribuintes seguem em alerta, diante da possibilidade de o STF redefinir parte das bases da Previdência Social brasileira — um sistema que, desde 2019, busca equilibrar sustentabilidade financeira e proteção aos segurados.












