Em decisão inédita, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) aceitou analisar um recurso apresentado por uma cooperativa contra decisão contrária a uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF). Não há previsão em lei para admitir recursos sob esse critério, o que faz com que advogados considerem a decisão um importante precedente. "É uma ousadia processual importante para dar segurança jurídica, que é o objetivo das súmulas vinculantes", diz o advogado Daniel Chiode, do Fleury Malheiros, Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima Advogados.
O relator do caso na 3ª Turma, ministro Horácio de Senna Pires, entendeu que, mesmo sem previsão, a hipótese de contrariedade à súmula vinculante deve ser considerada para conhecimento de recursos. Isso porque, a partir da sua publicação, a súmula passaria a integrar a jurisprudência de todo o Judiciário.
O caso envolve a Cooperativa Tritícola Erechim e uma ex-funcionária da empresa que discute a base de cálculo do adicional de insalubridade. Pela súmula vinculante nº 4 do STF, "o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial". A advogada da empresa, Dadiane Pacheco Ferreira, defende ainda que a legislação proíbe o uso do salário mínimo para correção de vencimentos. "Mas nada foi dito em relação à base de cálculo do adicional da insalubridade", diz.
A empresa entrou com recurso no TST com o argumento de que o Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul havia contrariado a parte final da súmula. Os desembargadores determinaram que o adicional de insalubridade fosse calculado "sobre o salário básico contratual da reclamante", o que elevaria o valor a ser pago em adicional de insalubridade.
Na análise do caso, o ministro disse estar claro que a Constituição veda a vinculação ao salário mínimo. Porém, o artigo 192 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê que o adicional seja calculado sobre o salário mínimo regional. O ministro considerou que, apesar de o STF já ter declarado o dispositivo inconstitucional, não o anulou. "Daí a conclusão de que o artigo 192 da CLT continuará autorizando a adoção do salário mínimo para cálculo do adicional de insalubridade até que nova base seja definida pelo legislador e pelos atores sociais", afirma na decisão. Com isso, determinou que a cooperativa pague o adicional com base na legislação trabalhista.
Fonte: Valor Econômico