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ARTIGO TRABALHISTA

Com a proximidade ao fim da pandemia, estagiários e aprendizes poderão seguir em home office?

Estudo recente da BARE International apontou que, embora reduzidas as restrições de ocupação e outras medidas de prevenção ao contágio da COVID-19, mais de 70% das empresas ainda não têm previsão de total retorno ao escritório.

02/02/2022 13:30

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Com a proximidade ao fim da pandemia, estagiários e aprendizes poderão seguir em home office?

Com a proximidade ao fim da pandemia, estagiários e aprendizes poderão seguir em home office? Pexels

Entre as empresas que já apresentaram um plano de retorno presencial, praticamente metade declarou que o retorno ocorrerá de forma híbrida (presencial/home office) e 8% sequer pretendem retornar ao modelo presencial.

Ainda, segundo pesquisa encomendada pela Salesforce, empresa de desenvolvimento de softwares, com quadro superior a 20 mil colaboradores pelo mundo, cerca de 40% gostariam de seguir trabalhando de casa, mesmo após o fim da pandemia. Entre os empregados brasileiros esse percentual sobe para 57%. 

O ambiente de trabalho costuma ser reflexo da cultura organizacional, especialmente em questões como estrutura (open office ou salas fechadas), vestimenta, forma de comunicação, etc. Com o trabalho remoto, parte disso ficou de lado e muitas empresas têm se preocupado em como manter o sentimento de pertencimento e unidade entre seus colaboradores. No entanto, em muitos setores, especialmente no de tecnologia, o trabalho presencial passou de regra à exceção ou até opção conferida aos empregados.

Certo é que muito mudou nos últimos dois anos que simplesmente voltar ao passado, "tudo como era antes", não nos parece muito provável, mas como reflexo surgem diversas incertezas e questionamentos por parte dos empregadores.

Dentre tantas, as empresas têm questionado se estagiários e aprendizes poderiam ficar em teletrabalho e em nossa interpretação a resposta é positiva.

Primeiramente, é importante destacarmos que a Nota Técnica nº. 19 do Ministério Público do Trabalho (MPT), que faz referência quanto ao tema, não tem força normativa e não vincula as empresas, mas tão somente se presta a orientar os procuradores, mas segui-la pode, é claro, evitar judicialização de Ações Civil Públicas, mas nada mais.

A Lei do Estágio (Lei nº. 11788/2008) não traz qualquer previsão expressa sobre teletrabalho ou home office, no entanto, tem-se entendido que não há incompatibilidade entre tal norma trabalho à distância.

Há, inclusive, decisões do TST validando o trabalho remoto para estagiários, desde que cumpridos os demais requisitos.

Assim, mesmo em regime remoto deve haver supervisão do estágio, com orientações e acompanhamento, pelo supervisor responsável, das tarefas desempenhadas, o que pode se dar por qualquer meio eficaz, seja telefone, e-mail ou videochamadas.

As atividades executadas devem, ainda, ser compatíveis com aquelas que seriam desempenhadas se o trabalho fosse presencial e previstas no compromisso de estágio, firmado entre Unidade Concedente, Estagiário e Instituição de Ensino.

Além disso, é imprescindível que haja respeito à carga horária de 06 (seis) horas prevista na legislação, sob pena de configuração de vínculo de emprego. 

Caso não sejam utilizados sistemas eletrônicos alternativos de controle de ponto, é recomendável a utilização de outros meios para garantir o cumprimento da jornada, como, por exemplo, restrição de acesso a servidores e sistemas da empresa.

Além disso, quanto aos aprendizes, destaca-se que embora regulamentado por lei, o contrato de aprendizagem tem previsão constitucional. O artigo 7º da CF, ao proibir, no inciso XXXIII, o trabalho a menores de 16 anos, excepciona aqueles contratados como aprendizes, a partir dos 14 anos.

O contrato de aprendizagem é modalidade especial de contrato de trabalho que deve ser pactuado por escrito e por prazo determinado com registro e anotação na CTPS. Para sua validade devem ser cumpridos os requisitos todos, concomitantemente, do art. 428,  da CLT, abaixo reproduzido:

Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.

§ 1º. A validade do contrato de aprendizagem pressupõe anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, matrícula e freqüência do aprendiz na escola, caso não haja concluído o ensino médio, e inscrição em programa de aprendizagem desenvolvido sob orientação de entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica. 

§ 2º - Ao menor aprendiz, salvo condição mais favorável, será garantido o salário-mínimo hora.

§ 3º. O contrato de aprendizagem não poderá ser estipulado por mais de 2 (dois) anos, exceto quando se tratar de aprendiz portador de deficiência.

§ 4º A formação técnico-profissional a que se refere o caput deste artigo caracteriza-se por atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho. 

§ 5º A idade máxima prevista no caput deste artigo não se aplica a aprendizes portadores de deficiência. 

§ 6º Para os fins do contrato de aprendizagem, a comprovação da escolaridade de aprendiz portador de deficiência mental deve considerar, sobretudo, as habilidades e competências relacionadas com a profissionalização.

§ 7º. Nas localidades onde não houver oferta de ensino médio para o cumprimento do disposto no § 1º deste artigo, a contratação do aprendiz poderá ocorrer sem a frequência à escola, desde que ele já tenha concluído o ensino fundamental.

Lembra-se que é possível, segundo a própria lei, a realização das atividades presenciais integralmente em entidade de formação profissional, inexistindo espaço físico adequado aos aprendizes.

Se comprovado que os empregados da companhia atuam em regime de teletrabalho, especialmente os monitores dos aprendizes, restando inviável as atividades presenciais para que se possa dar cumprimento ao programa de aprendizes, é plausível que em eventual discussão se entenda possível a adoção de regime remoto. No entanto, essa estratégia deve ser pensada com cautela, pois este posicionamento não é unânime.

Sabemos que instituições concedentes de cursos de aprendizagem não têm apresentado oposição ao regime remoto para aprendizes, mas algumas destas podem vir a não aceitar o teletrabalho após o fim da pandemia.

Por fim, é válida a apresentação de um panorama geral da legislação, segue abaixo histórico recente dos instrumentos normativos que trataram, temporariamente, do assunto:

  • Em 22 de março de 2020 o Governo Federal editou a Medida Provisória nº. 927, a qual dispunha sobre medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (COVID-19), e dava outras providências.
  • Referido instrumento, cuja validade durou apenas até 20 de julho de 2020, previa em seu artigo 5º a permissão para adoção do regime de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância para estagiários e aprendizes.
  • Já em 09 de dezembro de 2020 a Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia publicou a Portaria 24.471/2020*, cujo artigo primeiro assim estabelece:

“Art. 1º Fica autorizada, de forma excepcional, a execução das atividades teóricas e práticas dos programas de aprendizagem profissional, conforme disposto no art. 428 do Decreto-lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943, na modalidade à distância, até 30 de junho de 2021”.

  • Em 28 de abril de 2021 foi reeditada a MP citada, agora sob o nº. 1046, cuja validade se encerrou em 25 de agosto, reestabelecendo, durante sua vigência, autorização para realização das atividades de estágio e aprendizagem por meios telepresenciais.

Ainda, o caput do Decreto 9.579/18 indica que “As aulas práticas poderão ocorrer na própria entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica ou no estabelecimento contratante ou concedente da experiência prática do aprendiz”.

Já o art. 66, do mesmo Decreto, estabelece que “O estabelecimento contratante cujas peculiaridades da atividade ou dos locais de trabalho constituam embaraço à realização das aulas práticas, além de poder ministrá-las exclusivamente nas entidades qualificadas em formação técnico profissional, poderá requerer junto à unidade descentralizada do Ministério do Trabalho a assinatura de termo de compromisso para o cumprimento da cota em entidade concedente da experiência prática do aprendiz”.

Assim, a legislação permite que a empresa requeira a adoção de modelo alternativo de execução das atividades práticas do programa de aprendizagem, desde que demonstre a existência de embaraço à realização das aulas práticas em meio presencial, através de formalização do pedido ao Setor de Inspeção do Trabalho da unidade descentralizada do Ministério do Trabalho e Previdência, através de Termo de Compromisso com justificativa da impossibilidade de contratação do modelo tradicional.

Feitas tais considerações, podemos afirmar que não há, atualmente, legislação ou qualquer outro instrumento normativo que autorize, expressamente, o trabalho à distância de aprendizes.

Por outro lado, igualmente inexiste norma que proíba o tal regime

O art. 405, da CLT, apenas indica que ao menor não será permitido o trabalho:

           I - nos locais e serviços perigosos ou insalubres, constantes de quadro para esse fim aprovado pelo Diretor Geral do Departamento de Segurança e Higiene do Trabalho;

              II - em locais ou serviços prejudiciais à sua moralidade.”

Aos aprendizes menores também são vedadas as atividades indicadas na lista das piores formas de trabalho infantil (“Lista – TIP”), disponível no Decreto nº 6.481/2008**, que regulamenta os artigos 3o, alínea “d”, e 4o da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho.

Coautoria: Gabriel Ávila 

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