O monitoramento de cliques de funcionários passou a ganhar destaque com o avanço do trabalho digital e remoto. A prática, adotada por empresas para acompanhar interações em sistemas corporativos, gera discussões sobre produtividade, privacidade e limites legais no ambiente de trabalho.
O tema voltou ao centro do debate após demissões em massa no Itaú em setembro de 2025, quando métricas digitais foram utilizadas como critério de avaliação. A questão envolve o que pode ser monitorado, como os dados são utilizados e quais cuidados devem ser observados para evitar excessos ou violações à legislação brasileira.
Crescimento do uso de monitoramento digital nas empresas
Com a digitalização dos processos internos, empresas passaram a utilizar ferramentas para acompanhar interações de funcionários em sistemas corporativos. O monitoramento de cliques consiste no registro de atividades como uso do mouse e teclado, navegação em softwares, participação em reuniões virtuais e acessos a sistemas internos.
A finalidade declarada pelas organizações é entender padrões de produtividade, identificar gargalos operacionais e analisar o funcionamento dos processos de trabalho.
No ambiente corporativo digital, esse acompanhamento passou de mecanismos voltados ao comportamento do consumidor para ferramentas aplicadas diretamente à gestão de equipes. Com tarefas cada vez mais executadas em plataformas online, gestores passaram a buscar métricas objetivas sobre desempenho.
Caso Itaú reacende debate sobre critérios de produtividade
O monitoramento ganhou repercussão após demissões no Itaú em setembro de 2025. Segundo o banco, métricas como cliques, uso de softwares licenciados, participação em reuniões, envio de mensagens e realização de cursos online foram utilizadas como base para avaliação de produtividade no modelo home office. Conforme informado pela instituição, o monitoramento não envolve captura de telas, áudios ou vídeos, mas sim indicadores de atividades digitais relacionadas ao trabalho.
A repercussão do caso levantou questionamentos sobre transparência, saúde mental e impactos no clima organizacional. O Sindicato dos Bancários de São Paulo criticou a forma como as demissões foram conduzidas e alertou para possíveis consequências sobre a relação entre gestores e equipes.
O que diz a legislação sobre monitoramento de cliques
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece que o empregador pode fiscalizar a prestação de serviços e avaliar produtividade, desde que respeite limites de boa-fé e transparência. Os artigos 2º e 442 garantem ao empregador o poder de direção, incluindo mecanismos de acompanhamento das atividades profissionais.
Além disso, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei nº 13.709/2018) determina regras sobre coleta, tratamento, finalidade e armazenamento de dados pessoais. A norma exige que empresas informem de maneira clara quais dados são monitorados, por qual motivo, de que forma serão utilizados e por quanto tempo serão armazenados.
Na prática, isso significa que o monitoramento de cliques é permitido, desde que:
- Tenha finalidade legítima relacionada à atividade profissional;
- Seja informado previamente aos trabalhadores;
- Respeite limites de proporcionalidade;
- Não invada aspectos da vida pessoal do colaborador;
- Esteja previsto em políticas internas e contratos.
O tratamento de dados deve ser restrito ao necessário para avaliar desempenho e garantir o funcionamento das atividades.
Quando o monitoramento pode ser considerado excessivo
O monitoramento pode ser caracterizado como excessivo quando ultrapassa limites razoáveis e compromete direitos dos trabalhadores. Situações como coleta de dados pessoais sem justificativa, monitoramento fora do horário de trabalho, acompanhamento de telas, áudios ou câmeras pessoais e uso de métricas punitivas sem transparência podem configurar abuso.
Entre os principais riscos estão:
- Coleta de dados sem consentimento ou finalidade legítima;
- Uso de métricas constantes que geram vigilância contínua;
- Monitoramento que afeta privacidade ou dignidade do trabalhador;
- Ausência de informações claras sobre os critérios adotados;
- Aplicação de indicadores sem comunicação prévia.
Esses fatores podem resultar em questionamentos legais e trabalhistas, além de comprometer o ambiente organizacional.
Impactos do monitoramento excessivo para trabalhadores e empresas
O acompanhamento intensivo pode gerar efeitos tanto para colaboradores quanto para as organizações. Para funcionários, a sensação de vigilância constante pode aumentar estresse, ansiedade e queda de motivação.
Pesquisas como a divulgada pela Oracle indicam que 70% dos trabalhadores não confiam plenamente em seus líderes, o que evidencia efeitos negativos da falta de transparência nas relações profissionais.
Para empresas, os riscos incluem:
- Queda de produtividade real;
- Desgaste no clima organizacional;
- Aumento de rotatividade;
- Danos à reputação;
- Possibilidade de violações à LGPD;
- Aumento de litígios trabalhistas.
Esses elementos podem comprometer resultados e impactar operações de médio e longo prazo.
Como as empresas têm adotado o monitoramento de cliques
A prática vem sendo associada a setores que dependem de métricas precisas, como atendimento ao cliente. Nesses casos, o monitoramento registra acessos a telas, tempo de uso de mouse ou teclado e participação em reuniões virtuais. Os dados são utilizados para identificar falhas ou necessidades de aprimoramento nos processos internos.
Políticas internas e treinamentos são mecanismos adotados pelas organizações para reforçar transparência e orientar colaboradores sobre as ferramentas utilizadas.
Boas práticas de monitoramento no ambiente de trabalho
Algumas medidas podem ser aplicadas pelas empresas para estruturar o monitoramento de maneira proporcional e transparente. As práticas observadas incluem:
- Comunicação prévia sobre regras e ferramentas;
- Priorização de métricas de resultado em vez de apenas indicadores de atividade;
- Combinação entre tecnologia e feedbacks constantes;
- Registro adequado das políticas internas;
- Respeito aos limites de privacidade e proteção de dados;
- Definição clara de finalidades e de como os dados serão utilizados.
Conforme destaca a DPO Débora Castro, da 4Business, “quando se fala de RH e DP, é importante lembrar que dentro de uma empresa existem outras questões legais que já são cumpridas e nem sequer são questionadas. Entretanto, no que diz respeito à privacidade e proteção de dados, ainda falta um nível de conscientização que seja disseminado na sociedade”.
Uso combinado de tecnologia e diálogo institucional
O monitoramento de cliques pode ser uma ferramenta de gestão, desde que inserido em um contexto de comunicação clara e diálogo contínuo. Feedbacks periódicos e indicadores relacionados à entrega de resultados ajudam a evitar interpretações de vigilância excessiva e ampliam o entendimento sobre o propósito da prática.
Pesquisas citadas pela Society for Human Resource Management (SHRM) indicam que feedbacks constantes contribuem para engajamento e motivação, fortalecendo relações de confiança entre equipes e lideranças.
O monitoramento de cliques tem se tornado mais comum com a expansão do trabalho digital. A prática é permitida pela legislação brasileira, desde que respeite transparência, proporcionalidade e proteção de dados.
O caso do Itaú ampliou o debate sobre limites legais e impactos no ambiente de trabalho. A adoção de políticas internas claras, somada à comunicação constante e ao foco em métricas de resultado, pode reduzir riscos e contribuir para maior eficiência operacional sem comprometer a confiança entre gestores e colaboradores.












