No começo deste mês, viralizou no X (ex-Twitter) a postagem de uma usuária que afirmou ter descoberto sua demissão por meio de uma notificação do aplicativo da CTPS Digital (Carteira de Trabalho Digital). A mensagem informava o registro de um "Desligamento/Rescisão". Segundo ela, nenhuma conversa prévia havia sido feita com a empresa.
Em outubro, outro usuário contou ter recebido o mesmo tipo de alerta a caminho do trabalho, também sem aviso prévio dos empregadores. A publicação ultrapassou 6 milhões de visualizações e teve mais de 80 mil curtidas.
Casos do tipo se repetem com frequência e usuários passaram a dizer que sentem medo toda vez que recebem uma nova notificação do aplicativo, como se fossem os próximos a descobrir a demissão por meio dele.
A advogada trabalhista Malu Vieira Xavier, sócia do escritório A.C. Burlamaqui Advocacia, diz que é possível recorrer à Justiça em situações como essa, desde que o trabalhador comprove os danos morais causados pela conduta da empresa. "O dano moral não decorre apenas da ausência de aviso, mas do modo desrespeitoso e abrupto como a comunicação se dá, ferindo a dignidade do trabalhador", afirma.
Exemplos práticos, de acordo com a especialista, incluem situações em que o empregado descobre o desligamento ao tentar acessar o sistema da empresa ou o aplicativo da carteira digital, é impedido de acessar o local de trabalho sem ter recebido qualquer aviso ou em que é informado por terceiros (como colegas ou clientes) de que foi dispensado.
"Essas circunstâncias configuram constrangimento e humilhação, aptos a justificar pedido de indenização por dano moral, desde que o trabalhador consiga demonstrar o ocorrido com, por exemplo, prints do sistema, conversas com a empresa ou testemunhos de colegas", diz a especialista.
O que o MTE diz sobre os casos
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), afirma que o aplicativo da CTPS apenas reflete as informações que as empresas registram no eSocial, sistema que unifica o envio de dados trabalhistas ao governo e busca simplificar o cumprimento de obrigações pelos empregadores.
Entre essas obrigações estão o registro das informações do contrato — como admissões e desligamentos — na Carteira de Trabalho Digital. O MTE afirma, porém, que as notificações do aplicativo apenas formalizam eventos que já ocorreram nas relações de trabalho.
O órgão diz que permanece o dever do empregador de comunicar diretamente ao trabalhador sobre o encerramento do vínculo, informando o cumprimento ou não do aviso prévio e as condições do desligamento.
A demissão de um empregado, de acordo com a advogada Malu Xavier, é um ato formal e possui regramento próprio previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A comunicação deve ser feita, assim, de forma inequívoca, clara e respeitosa. Segundo a especialista, é recomendado evitar o uso de tecnologias para esse fim. Além disso, ela diz que o simples registro na CTPS não é suficiente. "O ato de demissão é pessoal e envolve comunicação direta. A empresa não deve registrar a demissão antes da comunicação formal ao empregado, salvo em situações excepcionais, como nos casos de abandono de emprego, quando não há mais possibilidade de contato com o trabalhador."
E a demissão sem aviso prévio?
A demissão sem aviso prévio é prevista na legislação, mas, neste caso, a empresa deve pagar a indenização correspondente ao aviso não concedido.
A advogada diz que, se a empresa registrar a baixa na CTPS antes de comunicar formalmente o empregado, pode haver vício no ato de desligamento, caracterizando falta de transparência. Dessa forma, uma ação judicial é possível, desde que o trabalhador comprove os danos morais efetivamente causados por essa conduta.
Entre as situações que, segundo a advogada, podem caracterizar dano moral, estão aquelas em que o trabalhador só toma conhecimento da demissão por vias indiretas, como ao perceber o bloqueio de acesso aos sistemas da empresa, ao receber a notificação de desligamento na carteira digital ou ao ser avisado por terceiros, como colegas ou clientes, antes de qualquer comunicação oficial.
Com informações Folha de S. Paulo












